Nas últimas semanas, tragédias dentro dos muros das escolas, fizeram com que a insegurança no ambiente escolar se transformasse em um dos principais debates públicos do País. Enquanto o Brasil enfrenta o problema desde 2002 e começou a se intensificar em uma década, os Estados Unidos convivem com a dor na porta do colégio desde 1999.
Levantamento feito pelo jornal The Washington Post; que rastreia os casos por conta própria, graças a falta de dados oficiais sobre o assunto; mostra que desde 1999 foram 377 ataques nas escolas.
Ao longo de mais de duas décadas o número foi crescendo, mesmo com o investimento bilionário em segurança. Em 2022, o número foi recorde, alcançando 47 casos e superando o recorde do ano anterior, que tinha sido de 42 ocorrências.
Parece contraditório que os ataques continuem acontecendo (e crescendo) diante dos constantes investimentos. Em 2021, as unidades educacionais americanas fizeram um investimento recorde de US$ 3,1 bilhões (cerca de R$ 15,6 bilhões) em equipamentos e serviço de vigilância e proteção. No ano passado, o Congresso americano aprovou um pacote de US$ 300 milhões (R$ 1,5 bilhão) para ajudar as instituições a se equiparem contra violência armada.
Autora do estudo "Ataques de violência extrema em escolas do Brasil", a advogada e mestranda em educação da Unicamp, Cleo Garcia, acredita que o amento da segurança não deve ser descartado, mas alerta sobre a necessidade de envolver muitas áreas da sociedade e do Poder Público para implementar uma solução mais sustentada.
"Eu entendo que nesse momento as medidas de segurança estão sendo tomadas de maneira pontual e com o intuito de minimizar a preocupação e o sofrimento de pais, docentes e alunos. A presença da segurança nas portas e no entorno da escola é bem-vinda, mas não defendo policiais armados dentro da escola", pontua Cleo.
Na avaliação da pesquisadora, no caso dos Estados Unidos (país que concentra o maior número de tragédias em escolas do mundo), o policiamento ostensivo nas escolas não tem conseguido impedir os ataques.
Ao longo dos anos, as escolas americanas foram se equipando. Hoje 90% são monitoradas por câmeras, 43% possuem o chamado "botão de pânico", um alarme acionado silenciosamente de algum ponto da escola que se conecta com a polícia em caso de emergência, 78% das escolas têm salas equipadas com fechaduras capazes de permitir trancamento interno e 65% delas têm funcionários exclusivamente dedicados à segurança.
Levantamento apresentado durante a transição do governo federal, em dezembro de 2022, mostra que 35 estudantes e professores foram mortos em ataques a escolas no Brasil desde o início dos anos 2000. Pelo relatório, os ataques foram realizados por estudantes e ex-alunos, geralmente ligados a bullying e a exposição prolongada a situações violentas, incluindo negligência parental e conteúdo compartilhado em redes sociais.
A situação nas redes sociais se agravou quando Elon Musk comprou o Twitter, em outubro de 2022, e afroxou o controle sobre as postagens, permitindo a livre disseminação de conteúdos de ódio, extremismo e violência. A pandemia da covid-19 também contribuiu para o adoecimento de jovens e adolescentes, que deixaram de frequentar a escola presencialmente e ficaram mais tempo no mundo virtual.
Um jovem que sofre violência, tem sentimento de ódio e deixa transparecer esses pensamentos nas suas conversas em chats extremistas acaba sendo cooptados por comunidades de radicais.
ALÉM DE SEGURANÇA, ACOLHIMENTO
Especialista em Psicopedagogia e Coordenadora do curso de Serviço Social do Ceub (Centro de Ensino Unificado de Brasília), Ana Paula Barbosa, comenta a importância de combater atos violentos nas escolas, a partir de uma perspectiva conjunta e multidisciplinar.
"Garantir um ambiente seguro, acolher os estudantes, se aproximar das famílias e qualificar os profissionais da educação são ações necessárias para enfrentar o problema da violência no ambiente escolar são medidas que precisam andar juntas", defende.
Para a especialista, o ambiente escolar tem um papel importante nas emoções dos alunos. Ela frisa que a escola é um dos principais locais onde as crianças vão se desenvolver, socializar e construir seu senso moral e ético – como parte da formação humana dos estudantes, tornando-os pessoas conscientes e que respeitam a diversidade humana.
“Vejo a oportunidade de as escolas implementarem programas de saúde mental para alunos, professores e comunidade. Investir em atendimento psicopedagógico, psicológico e neuro psicopedagógico. Sem investimento, não vamos avançar na construção de ações profundas", enfatiza.
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