Pesquisadores do iLika desenvolvem em Pernambuco o que acontece de melhor na ciência no mundo

Divulgação dos Prêmios Nobel de Medicina, Física e Química animou pesquisadores do Ilika, que estão desenvolvendo pesquisas sobre os mesmos temas

Publicado em 11/10/2024 às 20:54

O diretor do Instituto Keizo Asami (iLIKA), da UFPE, José Luiz de Lima Filho, passeava com sua cachorra na segunda-feira (7) quando soube que o Prêmio Nobel de Medicina foi para um estudo sobre o RNA mensageiro. A conquista dos cientistas americanos Victor Ambros e Gary Ruvkun fez José Luiz lembrar o trabalho que o instituto pernambucano, comandado por ele, faz com pequenos organismos, usando tecnologias similares às dos Nobel. Mal teve tempo de se envaidecer quando, nos dias seguintes, saíram os resultados dos Nobel de Física e Química. Mais uma vez, os temas reconhecidos pelo prêmio de maior prestígio na ciência, coincidiram com os pesquisados pelo iLika e o orgulho se renovou.

"Estou muito feliz por ver que estamos trabalhando em linha com grandes cientistas no mundo. Temos muitas cabeças inteligentes trabalhando em nossa equipe, o que é incrível! Atuamos em um espaço reduzido (o instituto), mas estamos sempre dentro da fronteira do conhecimento. A gente pode ser pequeno, mas pensa grande. Estamos sempre buscando o que há de mais avançado", destaca José Luiz. 

JAILTON JR./JC IMAGEM
Lika UFPE - JAILTON JR./JC IMAGEM

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Todo mês de outubro, os cientistas aguardam ansiosamente o anúncio dos Prêmios Nobel de Física, Medicina e Química. Os vencedores deste ano pesquisam temas que usam a tecnologia como aliadas da ciência. O Prêmio Nobel de Física 2024 foi concedido a John Hopfield (EUA) e Geoffrey Hinton (Reino Unido) por suas descobertas no campo da inteligência artificial (IA), mais especificamente em redes neurais artificiais. Hopfield desenvolveu um modelo que imita o funcionamento do cérebro humano, permitindo a "memória associativa".

Já o Nobel de Química foi para o trio de pesquisadores amaricanos David Baker e John M. Jumper e o britânico Demis Hassabis. Eles levam o prêmio deste ano por decifrarem os segredos das proteínas (moléculas fundamentais para as nossas células e, para a vida) por meio da inteligência artificial (IA) e da computação.

TENDÊNCIA MUNDIAL DA CIÊNCIA

José Luiz conta que o laboratório de neurociência do iLika foi criado pelo professor João Ricardo, depois que ele retornou dos Estados Unidos. Ele é um dos maiores especialistas do tema no mundo. A partir daí, foram se juntando outros profissionais, como a professora Priscila Gubert, que já trabalhava com C.elegans, um verme que ajudou a explicar o desenvolvimento do corpo humano. "Esse 'bichinho' permite simular reações em um organismo maior, feito a gente, mas nesse serzinho", observa José Luiz. 

O Prêmio Nobel de Medicina de 2024 foi concedido aos cientistas americanos Victor Ambros e Gary Ruvkun pelas pesquisas que eles fizeram sobre microRNA. O trabalho dos dois ajudou a explicar como nossos genes funcionam dentro do corpo humano. O mergulho da dupla vencedora do Nobel de Medicina sobre o funcionamento de células começou com o estudo um pequeno verme chamado Caenorhabditis elegans (C. elegans).

Apesar de medir apenas um milímetro de comprimento, o estranho animal conta com um grande número de células especializadas, o que o tornou um importante objeto de estudo na busca da compreensão sobre como as células se desenvolvem e funcionam. No iLika, o C.elegans também sem sendo utilizado em diversas pesquisas. 

JAILTON JR./JC IMAGEM
Lika UFPE - JAILTON JR./JC IMAGEM

Vermes para Estudar Doenças Humanas

"Nosso laboratório também trabalha com um verme chamado C. elegans. Ele é muito útil para estudar doenças humanas, porque seu material genético é parecido com o nosso. Esse verme é pequeno e simples, com menos neurônios que nós, o que facilita o estudo. Além disso, ele se desenvolve muito rápido, ficando adulto em apenas 72 horas e vivendo cerca de 21 dias. Isso permite que façamos experimentos com mais rapidez", explica Priscila Gubert.

A professora diz que os cientistas descobriram que dentro das nossas células existem os microRNAs, que controlam a produção de proteínas. Essas proteínas são essenciais para a vida, e quando algo dá errado nesse processo, pode resultar em doenças como o câncer. Por exemplo, em um tumor, as células crescem descontroladamente. Mas, se conseguirmos usar o microRNA para interromper esse processo, podemos impedir o crescimento do tumor. Com o C. elegans, podemos estudar esses mecanismos de forma mais simples, alimentando-o com bactérias modificadas que contêm microRNA, e observando como ele reage.

Pesquisas sobre MicroRNA e Covid-19

"Recentemente, também foi descoberto que o microRNA pode ter um papel na forma como as pessoas respondem à COVID-19. Algumas pessoas têm sintomas graves, outras leves, e uma das razões para isso pode estar na variação de microRNAs entre elas. Isso abre portas para novas pesquisas e tratamentos, tanto para COVID quanto para outras doenças", detalha Priscila.

"No nosso laboratório, estamos desenvolvendo maneiras de usar microRNA para reduzir a produção de proteínas em doenças como o câncer. Um dos nossos alunos, Gabriel, está trabalhando nisso, utilizando o C. elegans como modelo experimental. Esse método é muito eficiente e barato, tornando a pesquisa acessível e mais rápida", adianta. 

Outra vantagem do C.elegans é o fato de ser transparente e permitir ver as movimentações dentro dele. "A transparência do verme realmente torna os experimentos muito mais práticos, permitindo que vocês vejam as proteínas fluorescentes em ação sem precisar sacrificar o organismo. Além disso, o fato de ele ser hermafrodita e produzir 300 filhotes (clones) durante a vida, facilitando o estudo em larga escala e padronizado", complementa.

JAILTON JR./JC IMAGEM
Lika UFPE - JAILTON JR./JC IMAGEM

DIAGNÓSTICO DE DOENÇAS MENTAIS

Na área de Inteligência Artificial, o iLIKA temos vários projetos. O mais recentemente é a startup ZophIA, comandada pelos pesquisadores Jones Albuquerque, João Ricardo e Silvana Bocanegra e formada por um grupo multidisciplinar de 11 pessoas. A ZophIA busca auxiliar o diagnóstico da Esquizofrenia e de outras doenças mentais como Autismo, Burnout, entre outras, por meio de ferramentas de análise do discurso e dos gestos dos pacientes, usando do conhecimento prévio descoberto por Prêmios Nobel do passado. A ideia é entregar à sociedade uma tecnologia diferente, inovadora e assertiva. 

No Brasil, existem outras ferramentas semelhantes, mas o diferencial da ZophIA é usar a matémática junto com a IA. "A nossa startup usa Inteligência Artificial e matemática para ajudar médicos a diagnosticar transtornos mentais, como esquizofrenia, de forma mais rápida e precisa. Durante uma consulta, o médico grava a conversa com o paciente, e a máquina processa essa fala para sugerir qual transtorno o paciente pode ter e a gravidade do problema. Isso é muito importante, pois muitos pacientes esperam muito tempo para conseguir um diagnóstico correto. Com essa ferramenta, o médico generalista, que cuida de várias áreas da saúde, pode decidir se precisa encaminhar o paciente para um psiquiatra", pontua o estudante de medicina do 7° período e integrante da equipe, Lucas Soares. 

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Lika UFPE - JAILTON JR./JC IMAGEM
 

Pesquisadora do iLika e uma das coordenadoras da pesquisa, Silvana Bocanegra, diz que já foram realizadas cerda de 140 escutas de pacientes nos hospitais das Clínicas e no Ulisses Pernambucano. Ela adianta que a ideia é vender a ferramenta a empresas que já atual nos hospitais, aprimorando o instrumento com o uso da matemática. A startup já foi premiada pela Universidade de São Paulo e de Harvard. 

O também estudante de medicina, Arthur Leitão, diz que o desafio agora é atrair investidor para aprimorar a ferramenta. Uma difuculdade da ciência no Brasil: o estímulo financeiro para que descobertas ajudem a transformar a vida das pessoas.  

 


 

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