Novembro Negro: conheça lugares de memória e história para pessoas negras em Pernambuco
No estado, diversos locais têm grande importância para a memória e a história da população negra; conheça alguns desses lugares, a seguir
O Novembro Negro, é um mês dedicado à luta da comunidade negra por direitos e reconhecimento. Em 2024, pela primeira vez, o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra foi celebrado como um feriado nacional.
Neste contexto, o JC reuniu uma lista de locais de grande importância para a história e a memória das pessoas negras em Pernambuco.
Lugares de importância histórica para pessoas negras no estado
Sede do Afoxé Alafin Oyó
O imóvel de número 294, localizado na Rua do Sol, no bairro do Carmo, em Olinda, é a sede do Afoxé Alafin Oyó, também chamado de "Candomblé de rua", desde 2019.
Fundado em 2 de março de 1986, o grupo é um símbolo de militância e resistência negra em Pernambuco.
Reconhecido como Patrimônio Vivo de Pernambuco, é o primeiro afoxé do estado a receber essa honraria. O nome "Alafin" significa "senhor ou rei do palácio" em iorubá, enquanto "Oyó" homenageia a capital do antigo reino iorubano, na atual Nigéria, e faz referência ao orixá Xangô, patrono do grupo.
As cores vermelho e branco, associadas a Xangô, são marca registrada do Alafin Oyó nos desfiles carnavalescos, encantando o público.
O grupo nasceu inspirado no Afoxé Ilê de África e incentivado por integrantes ligados ao Movimento Negro Unificado, com o objetivo de promover a luta contra o racismo e contra a intolerância religiosa.
Sua atuação vai além do Carnaval, integrando religiosidade, educação e militância política. Em 1995, foi criada a Ala Alafin Mimi, voltada à transmissão dos saberes culturais e históricos do povo iorubá-nagô para as novas gerações, garantindo a preservação de suas tradições.
Largo do Bonsucesso
O Largo do Bonsucesso, em Olinda, um dos mais significativos conjuntos arquitetônicos do Brasil, foi construído por negros escravizados.
No local, destaca-se a Igreja do Rosário dos Homens Pretos, um marco de resistência e memória da população negra, que simboliza a integração entre as tradições afro e o cristianismo.
Além de seu valor arquitetônico e histórico, o Largo é palco de importantes manifestações culturais, entre elas, a tradicional saída da agremiação do Homem da Meia-Noite, um ícone do Carnaval de Olinda, e as celebrações da Noite dos Tambores Silenciosos, evento que reverencia a ancestralidade africana em um ritual de grande simbolismo para as comunidades de terreiro e a cultura afro-brasileira.
Terreiro das Tias do Pátio do Terço
No Recife, foi tombada por sua importância cultural. A história do terreiro das Tias do Pátio do Terço está profundamente ligada à criação da Noite dos Tambores Silenciosos, um marco cultural em Pernambuco.
Reconhecida como uma das mais antigas manifestações do xangô no estado, essa casa exerceu papel central na reafricanização e na intelectualização das tradições afro-brasileiras.
Figura de destaque nesse processo foi Maria de Lourdes da Silva, conhecida como Badia, que, ao lado do sociólogo e jornalista Paulo Viana, organizou na década de 1960 o encontro das nações de maracatu no Pátio do Terço, consolidando a cerimônia como símbolo da cultura afropernambucana.
Terreiro de candomblé Obá Ogunté-Sítio Pai Adão
O terreiro de candomblé Obá Ogunté-Sítio Pai Adão, localizado no bairro de Água Fria, no Recife, é o mais antigo em atividade no estado, fundado em 1875 pela nigeriana Ifatinuké, conhecida no Brasil como Tia Inês.
Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 2018, o bem cultural foi inscrito em dois Livros do Tombo: o Histórico e o Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.
Consagrado à orixá Iemanjá, chamada de Obá na tradição Nagô/Yorubá, o terreiro consolidou a cultura afro-brasileira em Pernambuco, especialmente sob o comando de Felipe Sabino da Costa, o famoso Pai Adão, que trouxe ainda mais força à tradição Nagô após uma viagem à Nigéria.
O espaço preserva práticas ritualísticas, como o uso da língua Yorubá nos ritos, e é um marco cultural, abrigando grupos de Afoxé e Maracatu Nação, reconhecidos como Patrimônio Cultural pelo Iphan. Além de seu papel religioso, o terreiro inclui uma capela-museu e uma área com o centenário Iroko, simbolizando a ligação entre tradição e memória.
Ruínas da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos - Igarassu
Localizadas em Igarassu, as Ruínas da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, destacam-se como um importante símbolo da cultura negra na Região Metropolitana do Recife.
Construída para abrigar a Irmandade dos Homens Pretos, ativa desde o século XVIII, a igreja é marcada pela ausência de registros detalhados sobre sua origem e declínio, refletindo a invisibilidade histórica das comunidades negras em estado.
Pouco mencionada na historiografia pernambucana, essa igreja foi palco de práticas culturais significativas, como a coroação de reis do Congo, mencionada por Pereira da Costa no compromisso da irmandade de 1706, organizado nos moldes de Olinda e aprovado em 1770.
Embora atualmente em ruínas, o local preserva um vínculo simbólico com as tradições afro-brasileiras, reforçado pela proximidade com o Maracatu-nação Estrela Brilhante de Igarassu.
Na década de 1990, a coroação da rainha Dona Mariu foi um marco no resgate dessa tradição e reafirmou a relevância das ruínas como lugar de memória e resistência da cultura negra.
As igrejas dedicadas à Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos também ocupam outras cidades da RMR, como Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes.
Antigo Engenho Pitanga
O Kipupa Malunguinho, realizado anualmente desde 2006, é um evento cultural e religioso organizado pelo Quilombo Cultural Malunguinho, em Abreu e Lima, na RMR.
O encontro ocorre nas matas do antigo Engenho Pitanga, onde teria existido o Quilombo do Catucá, liderado por Malunguinho.
Celebrado em setembro, o evento reúne praticantes da jurema sagrada para realizar rituais e homenagens na mata, enquanto ocorre uma programação cultural com apresentações de coco e outras expressões artísticas.
O Kipupa Malunguinho é considerado um dos principais eventos das religiões de matriz africana na região, atraindo milhares de participantes e reforçando a conexão espiritual e cultural com a ancestralidade e a natureza.
Mercado de São José
O Mercado de São José, inaugurado em 7 de setembro de 1875, possui uma história profundamente vinculada à vida e à cultura das pessoas negras no Recife.
Antes mesmo de sua construção, o local já era frequentado por negros escravizados, forros e libertos, sendo um espaço de trabalho e sociabilidade.
No mercado e em seus arredores, reuniam-se quituteiras, trabalhadores portuários, capoeiras e fiéis de práticas religiosas como o catimbó, o xangô pernambucano e a jurema, que encontravam ali os artigos necessários para seus rituais e sustento.
Mesmo com as proibições impostas desde sua criação, como a restrição de entrada de prostitutas, mendigos e escravizados, o mercado se consolidou como um ponto estratégico para a economia e a vivência da população negra.
Sua relação com a religiosidade afro-brasileira permanece viva até hoje, já que é um dos principais locais para adquirir materiais essenciais para rituais, como ervas, velas e animais.
Palácio de Iemanjá - Terreiro de Pai Edu
O Palácio de Iemanjá, também conhecido como Terreiro de Pai Edu, localizado no Alto da Sé, em Olinda, destaca-se como um importante símbolo da cultura afro-brasileira e da religiosidade de matriz africana em Pernambuco.
O espaço foi fundado por Edwim Barbosa da Silva, o Pai Edu, em 1951, e se tornou referência no candomblé pernambucano, ganhando notoriedade pelos trabalhos espirituais e pela homenagem ao orixá Iemanjá, guia de seu fundador. O terreiro também reflete o sincretismo religioso e abriga imagens de santos católicos ao lado de representações dos orixás.
A trajetória de Pai Edu foi marcada por conquistas, incluindo sua atuação junto a times de futebol como Sport e Náutico.
Pai Edu alcançou o título de Rei do Candomblé, consolidando-se como uma figura central da religião no estado.
O terreiro está intimamente ligado ao reconhecimento de Olinda como Patrimônio Natural e Cultural da Humanidade, em 1982, reforçando sua importância no cenário cultural e histórico da cidade. Mesmo após sua morte, em 2011, Pai Edu e o Palácio de Iemanjá continuam sendo lembrados como pilares da preservação e promoção da cultura afro-brasileira.
Em 2016, o Palácio de Iemanjá foi tombado e reconhecido como Patrimônio Cultural de Olinda.