Voluntários constroem moradia resiliente no Recife para combater precariedade habitacional

Em Fazendinha, embaixo de um viaduto e perto de canais e manguezais, mais de 175 famílias sofrem com a invisibilidade e perdas durante alagamentos

Publicado em 16/12/2024 às 13:48
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O medo de perder os bens com as inundações não é mais uma realidade para a família de Ayram Corleone, de 25 anos. Após anos sofrendo com a precariedade habitacional na comunidade de Fazendinha, na Zona Sul do Recife, eles receberam uma moradia resiliente às mudanças climáticas, uma esperança de não vivenciar mais o medo.

Estrutura elevada para evitar as enchentes e reduzir a entrada de insetos e roedores, painéis plastificados para a entrada de luz natural, telhas recicláveis que aumentam o conforto térmico e acústico e reduzem os impactos ambientais. Essas são algumas das características da nova casa de Ayram, de sua esposa, Letícia, e do pequeno Nicolas, de pouco mais de um ano.

Com o objetivo de enfrentar as mudanças climáticas e a falta de políticas habitacionais no país, a TETO Brasil e a TECHO desenvolveram o projeto Moradias Resilientes, em parceria com moradores de favelas.

A organização reúne voluntários para atuar no combate à falta de alternativas dignas de moradia para a população vulnerabilizada e envolve toda a comunidade, estimulando o sentimento de pertencimento.

“Eu fui conhecendo o que era uma casa resiliente no processo”, destacou Ayram. “Foram dois fins de semana para fazer a casa e o processo da construção foi como um mutirão: todo mundo se juntou para ajudar”, relatou Ayram.

Divulgação/TETO
Voluntários participaram da construção da moradia resiliente em Fazendinha - Divulgação/TETO

Invisibilidade e precariedade

Em Fazendinha, embaixo de um viaduto e perto de canais e manguezais, mais de 175 famílias sofrem com a invisibilidade e múltiplas perdas durante os alagamentos nos períodos chuvosos.

Assim como em diferentes favelas do Brasil, a comunidade convive com a exposição a riscos e com a precariedade da infraestrutura - em contraste com os prédios modernos da Zona Sul da cidade.

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Em Fazendinha, mais de 175 famílias sofrem com perdas durante os alagamentos - Divulgação/TETO

“Antes da TETO fazer a casa, a gente morava na casa da minha mãe. É muito próximo ao canal, então quando chovia, alagava tudo. Problemas como alagamentos, que as pessoas enfrentam aqui, eu já sei que não vou enfrentar”, contou Ayram.

Problemas como alagamentos, que as pessoas enfrentam aqui, eu já sei que não vou enfrentar
Ayram Corleone, 25 anos

Ele explicou que na comunidade as bases de todas as casas têm que ser altas para evitar as inundações. Essas observações fizeram parte do estudo preliminar da organização para construir a casa resiliente. Mais de um metro separa a nova residência de Ayram do chão para que as fortes chuvas não exponham a família a novos riscos.

Além da segurança, a arquitetura da casa prioriza o conforto térmico para os moradores, com ventilação natural para maior controle da umidade e diminuição da propagação de doenças. “A casa da TETO é mais ventilada, acho que por causa das janelas grandes, que ajudam a arejar”, explicou Corleone.

Como funciona o projeto

A escolha da comunidade de Fazendinha não foi avulsa. O território, que fica localizado entre os bairros de Boa Viagem e Imbiribeira, sofre anualmente com enchentes, além da falta de saneamento básico e acesso à energia.

A casa entregue à família foi projetada para resistir a estes problemas. “A moradia construída em Fazendinha possui proteção contra alagamentos, com toras de eucalipto para suspender a estrutura”, explicou em entrevista ao JC, Laís Duanne, gestora das sedes Pernambuco e Bahia da TETO Brasil.

A moradia construída em Fazendinha possui proteção contra alagamentos, com toras de eucalipto para suspender a estrutura
Laís Duanne, gestora das sedes Pernambuco e Bahia da TETO Brasil

Segundo a gestora, tanto o projeto, como a construção da casa foram realizados em parceria com a comunidade. Além disso, a escolha da família beneficiada também passa pelo diálogo com os moradores.

“Enquetes são aplicadas com as famílias interessadas para fazer um grande perfil socioeconômico, com renda, acesso a trabalho, saúde e educação”, destacou Duanne.

Um sistema, sem interferência humana, faz o rankeamento de vulnerabilidade e a lista é discutida com as lideranças locais.

No caso de Fazendinha, por haver uma dificuldade no território para construções, foram sorteadas três famílias que além das questões de vulnerabilidade, atendiam aos critérios possíveis de terreno.

A estrutura da moradia resiliente conta com:

  • Proteção contra alagamentos;
  • Conforto térmico em climas quentes;
  • Redução da pegada de carbono por conta dos materiais recicláveis usados;
  • Painéis plastificados que garantem conforto térmico e acústico;
  • É adaptável aos diversos climas;
  • Iluminação natural;
  • Ventilação cruzada;
  • É modular, ou seja, de fácil replicação

Crise habitacional no país

Longe de ser resolvida, a crise habitacional atinge milhões de pessoas. De acordo com a Fundação João Pinheiro, com base na Pnad Contínua de 2022, o déficit habitacional atinge mais de seis milhões de pessoas no Brasil.

O déficit habitacional leva em conta o ônus excessivo com o aluguel, a coabitação e as moradias precárias. Só no Recife, o levantamento da Fundação João Pinheiro indica 54 mil moradias nessa situação.

Já a inadequação habitacional diz respeito, dentre outros fatores, à carência na infraestrutura urbana, como distribuição de água e energia e tratamento de esgoto e lixo. Mais de 26 milhões de brasileiros vivem em domicílios inadequados - sem abastecimento de água, coleta de lixo, energia elétrica ou cobertura adequada, por exemplo.

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Problemas como alagamentos, que as pessoas enfrentam aqui, eu já sei que não vou enfrentar

Ayram Corleone, 25 anos
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A moradia construída em Fazendinha possui proteção contra alagamentos, com toras de eucalipto para suspender a estrutura

Laís Duanne, gestora das sedes Pernambuco e Bahia da TETO Brasil

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