Praias urbanas: belezas naturais de Olinda são apagadas por insegurança e lixo
Prefeitura de Olinda anunciou em 2024 o início das obras de requalificação da orla da cidade, com primeira fase orçada em mais de R$ 3 milhões
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Do Alto da Sé, é possível ver que as belezas de Olinda vão além do sítio histórico. O mar, que foi fundamental para o desenvolvimento da cidade durante o sistema colonial português, é parte de um cenário onde lazer, cultura e trabalho se entrelaçam e fazem parte da rotina das pessoas.
Nos finais de semana, as praias do Carmo, Casa Caiada e dos Milagres abrigam banhistas e uma diversidade de empreendedores que encontram na faixa litorânea uma fonte de renda.
Mas, para quem busca apreciar a paisagem, a orla tem deixado a desejar. Assim como outras praias urbanas do Grande Recife, a falta de infraestrutura dificulta o trabalho de comerciantes e o uso do espaço público pelos visitantes.

Insegurança e lixo
As praias de Olinda pedem socorro para oferecer aos seus frequentadores mais do que belezas naturais: dignidade e conforto.
O administrador do Samburá Hotel e Restaurante, Moacir Sales, afirma que a orla do município tem um potencial pouco explorado, principalmente no período noturno. “À noite os quiosques estão fechados e não tem atrativo nenhum. O visitante vem para o Alto da Sé e vai embora porque não tem outra coisa para se ver em Olinda em termos de turismo de lazer”, pontua.

A insegurança também é um dos problemas apontados na região. O advogado Wagner da Silva, conta que evita frequentar o trecho à noite com medo da violência. “É uma orla muito bonita e encantadora, mas eu acho muito escuro e perigoso à noite e não é atrativo. A escuridão dá a sensação de insegurança”, relata.
O frentista João Batista reforça: “A precariedade de segurança é muito grande porque a gente fica meio inseguro. Não dá para vir à noite, mas eu sinto falta”.
Em nota, a Prefeitura de Olinda informou que tem atuado em constante diálogo, contribuindo para o bem-estar de de toda a população, e com iniciativas como a entrega do Posto Integrado de Segurança Pública, na orla de Bairro Novo. A gestão também esclareceu que a segurança pública é da responsabilidade do Poder Estadual. Confira texto na íntegra:
"A Prefeitura de Olinda esclarece que a segurança pública, como em todos os demais municípios, é da responsabilidade do Poder Estadual. Contudo, a gestão da cidade tem atuado em constante diálogo, contribuindo para o bem-estar de de toda a população. Recentemente, a Prefeitura entregou o Posto Integrado de Segurança Pública, instalado na orla de Bairro Novo. O equipamento atua como ponto de monitoramento para todas as secretarias que têm atuação na praia, como Guarda Municipal, Controle Urbano, Trânsito e Vigilância Sanitária, além do apoio à Polícia Militar de Pernambuco. O local possui um equipamento integrado com nove câmeras espalhadas pela orla, ligadas também ao Centro Integrado de Operações de Defesa Social (CIODS). O quiosque funciona 24 horas, sendo das 5h às 23h com uma equipe presencial e, após esse horário, remotamente, por videomonitoramento. A entrega faz parte do pacote de segurança que a Prefeitura de Olinda lança mão para auxiliar as Forças de Segurança oficiais, que também inclui iluminação em LED."
Além da insegurança, a poluição também afasta frequentadores da orla de Olinda. Quem caminha pela faixa de areia ainda se depara com muito lixo descartado e mau cheiro.

O problema prejudica, ainda, quem tira a renda do mar. “Essa orla significa tudo. A gente praticamente vive da pesca”, inicia o pescador Joaquim José de Souza. “Não aparece mais peixe por causa dessa podridão aqui. Até para os barqueiros chegarem é ruim e a maior parte do lixo vem pela água”, reclama.
Não aparece mais peixe por causa dessa podridão aquiJoaquim José de Souza, pescador
Requalificação

Em setembro de 2024, a Prefeitura de Olinda anunciou o início das obras de requalificação da orla da cidade. A primeira fase do serviço, orçada em mais de R$ 3 milhões, vai contar com serviços de urbanismo e paisagismo, como:
- Requalificação da ciclofaixa
- Substituição do calçadão
- Troca de bancos
- Implementação de lixeiras e mesas de piquenique
- Nova sinalização
- Pisos táteis, rampas acessíveis, placas de sinalização em Braille, brinquedos e equipamentos adaptados para acessibilidade
- Projeto paisagístico
- Colocação de pedras para evitar o avanço do mar
A Secretária de Obras de Olinda, Cláudia Peregrino, esclarece que “o dinheiro da primeira etapa já está assegurado e a conclusão está prevista até março de 2025”.
De acordo com ela, além dos serviços de urbanismo, estão sendo requalificados dois banheiros, os 15 quiosques da orla e a Praça Duque de Caxias.
Todas as etapas do serviço estão orçadas em R$ 10 milhões.
A respeito da colocação de pedras para evitar o avanço do mar - o enrocamento -, o oceanógrafo Antônio Ferreira explica que é importante investir em iniciativas baseadas na natureza.
“A gente precisa deixar a faixa de praia preservada e não ocupar ou colocar estruturas rígidas, como calçadões ou barracas, porque o mar precisa de espaço. A faixa de praia precisa de uma área extensa porque ora ela vai ocupar, ora ela vai desocupar”, destaca.
Confira o projeto de requalificação da orla de Olinda:
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Ocupação da orla de Olinda
Terra originária dos povos caetés, Olinda entrou para o circuito global do sistema colonial português por ter uma posição estratégica, com morros e proximidade do porto natural no Recife.
De acordo com a historiadora da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) Rita de Cássia, o mar foi “fundamental para a construção desse sistema colonial que estava em voga no mundo, fazendo a ligação com as trocas atlânticas, entre o chamado novo mundo, nas Américas, com a Europa e com a África, quando inicia o circuito do escravagismo”.
Ela explica que, na época, o mar era considerado meio de comunicação e lugar de trabalho, por causa da pesca.

Apenas na segunda metade do século XIX, as cidades do litoral brasileiro, como Olinda, começaram a adotar os banhos de mar - na época, recomendados para a cura de doenças.
“A partir daí, se tem uma grande transformação do uso e significado das praias: elas deixam de ser um lugar só de trabalho, comunicação e segurança e vão entrar no modo de vida da população urbana”, conta a historiadora.
Com o crescimento do interesse nas praias, a orla ganhou novos usos e a dinâmica urbana também mudou. Além disso, a partir dos anos 1930 aconteceram as grandes ressacas do mar, que destruíram parte das ruas construídas no Carmo e São Francisco e impactando ainda mais o urbanismo da cidade.
Não aparece mais peixe por causa dessa podridão aqui<br>
Joaquim José de Souza, pescador