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'Violência verbal muito pesada', diz padre hostilizado por bolsonaristas

Fala do padre sobre os 500 mil mortos na pandemia irritou apoiadores do presidente

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Do jornal Correio para a Rede Nordeste

Publicado em 21/07/2021 às 12:41
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O padre Lino Allegri falou dos ataques que sofreu na Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Fortaleza, por bolsonaristas irritados com comentários do religioso sobre a pandemia. "Eu não temo pela minha integridade física. Eu pretendo ainda celebrar (a missa na igreja). Eu não celebrei no domingo, dia 18, que era o dia que eu deveria ter celebrado, por conselhos superiores — digamos assim — não celebrei, mas pretendo ainda. Não sei até quando, depende de muita coisa”, disse ele em entrevista ao G1 Ceará. A matéria é do jornal Correio para a Rede Nordeste.

 

O primeiro caso de hostilização foi no último dia 4 de julho, quando o padre citou as 500 mil mortes por covid-19 no Brasil, em meio ao que chamou de "descaso com a vacina e a pandemia". Em três finais de semana seguidos, clérigos da igreja no Bairro Aldeota foram verbalmente atacados, em meio a um clima de tensão.

Mesmo em meio a ataques, o padre diz que tem recebido também apoio. “Tem muita gente da Paróquia da Paz, de classe média alta, como é comum lá, me apoiando. Isto, em certo sentido, até me comove e me dá força para pensar 'foi um fato lamentável mas, com isto, não vou mudar a minha vida'. Eu tive muito mais apoio do que contestação”, garante.

 

Sequência de ataques

O padre Lino relembra quando começou a receber críticas e ser intimidado pela sua fala. “Quando no final da missa entraram na sacristia, ou melhor, invadiram a sacristia, umas oito pessoas se queixando pela homilia que eu tinha feito. Porque, ao dizer deles, eu tinha desrespeitado o presidente, porque na pregação eu assinei o fato dos 500 mil mortos e o descaso do presidente em relação tanto à vacina, quanto à pandemia”.

 

Segundo ele, o grupo disse que ele deveria "voltar para a Itália" - ele nasceu no país europeu. Outros membros da igreja conseguiram pacificar a situação, mas a situação começou a piorar nos dias seguintes.

 

No fim de semana seguinte, padre Lino não estava celebrando missa no loca, mas outro padre foi interrompido ao citar o nome dele e ler uma mensagem da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em que cobra "apuração, irrestrita e imparcial" de pessoas denunciadas por "corrupção" e "prevaricação" no contexto da pandemia.

 

"Esse padre transformou o altar em palanque político, impondo ideologia. Vá fazer política lá fora, aqui virou um reduto da esquerda", gritou o homem. Os fiéis presentes reagiram com gritos de "respeito" e "fora, Bolsonaro". O homem foi retirado da igreja. Ele afirmou que o padre Lino havia transformado a igreja em um "reduto da esquerda".

 

No último final de semana, vários bolsonaristas foram à missa. “No dia 18 a celebração estava mais carregada de tensão. Eu não estava, mas foram pessoas organizadas com a camisa com nome do presidente, com número 17 e uma presença ostensiva e intimidatória", diz ele, que também reza missas em outras igrejas.

 

Veja a nota da CNBB lida na igreja:

Nota da CNBB diante do atual momento brasileiro

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB levanta sua voz neste momento, mais uma vez, para defender vidas ameaçadas, direitos desrespeitados e para apoiar a restauração da justiça, fazendo valer a verdade. A sociedade democrática brasileira está atravessando um dos períodos mais desafiadores da sua história. A gravidade deste momento exige de todos coragem, sensatez e pronta correção de rumos.

A trágica perda de mais de meio milhão de vidas está agravada pelas denúncias de prevaricação e corrupção no enfrentamento da pandemia da COVID-19. “Ao abdicarem da ética e da busca do bem comum, muitos agentes públicos e privados tornaram-se protagonistas de um cenário desolador, no qual a corrupção ganha destaque.” Apoiamos e conclamamos às instituições da República para que, sob o olhar da sociedade civil, sem se esquivar, efetivem procedimentos em favor da apuração, irrestrita e imparcial, de todas as denúncias, com consequências para quem quer que seja, em vista de imediata correção política e social dos descompassos.

D. Walmor Oliveira de Azevedo, Arcebispo de Belo Horizonte, MG, Presidente
D. Jaime Spengler Arcebispo de Porto Alegre, RS, 1º Vice-Presidente
D. Mário Antônio da Silva, Bispo de Roraima, RR, 2º Vice-Presidente
D. Joel Portella Amado, Bispo auxiliar do Rio de Janeiro, RJ, Secretário-Geral

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