Eleições 2022: sem atualização cadastral completa, comunidade LGBTQIA+ teme alta da abstenção
Em razão da pandemia, o TSE suspendeu o cadastro biométrico em 2020, que consiste na coleta das digitais, fotografia e assinatura digitalizada de eleitores e eleitoras
Os eleitores e eleitoras têm até o dia 4 de maio para regularizar o cadastro na Justiça Eleitoral, e assim, poder votar nas eleições gerais deste ano. No entanto, algumas pessoas transgêneros e travestis podem ter dificuldades em atualizar suas fotos, de acordo com o gênero que se identificam. É o caso da vice coordenadora da Nova Associação de Travestis e Transexuais de Pernambuco (Natra-PE), Caia Maria.
Ela conseguiu alterar seus dados, passando a adotar o seu nome social no título de eleitor, mas não conseguiu mudar a fotografia do cadastro. Ela fez uma solicitação ao Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE) pedindo para que a imagem seja atualizada de acordo com sua atual representação de gênero.
Em resposta, foi explicado que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) suspendeu a captura de dados para a coleta de dados biométricos, o que também inclui a foto no registro, por causa da pandemia da covid-19. Caia fez novamente uma solicitação, por meio do canal virtual, pedindo a mudança da foto, incluindo a que consta no livro do mesário.
Por telefone, ela foi informada da abertura de um processo no TSE, para a retirada da foto e não para uma atualização, conforme havia demandado. “A gente tá falando de um possível impulsionamento da abstenção eleitoral no interior de comunidades trans e travestis pernambucanas. E isso pode ser evitado a partir de medidas que sejam tomadas pela Justiça Eleitoral, de modo a conciliar as medidas sanitárias necessárias a esse período pandêmico, com os direitos da população trans e travestis eleitoras”, declarou Caia, em entrevista ao JC.
A reportagem entrou em contato com o TRE-PE, que por nota, reforçou que quanto à modificação da fotografia no caderno de votação, há uma impossibilidade técnica momentânea para atualizar a foto, já que o cadastramento biométrico está suspenso em todo o país” - o que também inclui os novos eleitores.
Nestes casos semelhantes ao de Caia Maria, a única autorização permitida é pela exclusão da fotografia antiga do caderno de votação, já que não corresponde mais à identidade e ao gênero da eleitora. Uma nova atualização só será possível quando a coleta biométrica for retomada após as eleições de 2022.
“Esta decisão continua vigente, conforme determina a Resolução TSE nº 23.667/2021. Daí porque temos a impossibilidade técnica momentânea de atualizar a foto”, explica o TRE. “A Justiça Eleitoral é sensível ao tema e sua atuação é balizada pelo respeito à identidade de gênero. Tanto que, neste caso concreto, atendeu ao pleito da eleitora quanto à modificação do nome e que atenderá ao pedido de atualização da foto tão logo o cadastro biométrico seja reaberto”, reforça o Tribunal.
Informação
Para Caia Maria esse retorno é insuficiente diante da falta de uma orientação clara desde o início do processo. Por meio da Natra-PE, ela relata que tem recebido as mesmas queixas de pessoas transgêneros, que temem passar por algum tipo de constrangimento na hora da votação, e acabam não procurando saber que tipo de alternativa está disponibilizada para estas situações específicas.
“Esse é um percurso que tem sido feito desde as últimas eleições e houve morosidade na solução dessa situação e de vontade política também de estabelecer a comunicação desse leitor trans, que corre o risco de sofrer constrangimento”, declarou.
“Nós temos conquistas importantes na Justiça Eleitoral, como o uso do nome social, mas elas não podem se encerrar nisso. A gente precisa entender os direitos do eleitor como direitos complexos que devem considerar a diversidade como questão prioritária”, concluiu a vice-presidente da Natra.
A presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Keila Simpson, afirmou que as dificuldades burocráticas em alguns processos não são apenas na Justiça Eleitoral, mas em demais autarquias quando se trata da documentação de pessoas trans e travestis. “Provavelmente o que pode estar se desenhando aí é que muitas pessoas podem acabar se abstendo, mas ainda não recebemos muitas demandas sobre essa questão”, disse.
Ainda assim, Keila Simpson estimula que pessoas trans e travestis exerçam seu direito ao voto. “A partir dessa decisão, você acaba escolhendo quem você quer que esteja nos estados de poder, legislando sobre a gente”, pontuou.
Passo a Passo
De acordo com o site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a opção pela auto identificação no cadastro eleitoral pode ser manifestada pelo sistema Título Net. Neste caso é necessário acessar o sistema e clicar em iniciar seu atendimento a distância.
Após esse passo, a pessoa insere sua unidade federativa para o atendimento e depois insira toda documentação solicitada na página seguinte. Na opção Título de Eleitor, deverá ser selecionado “Tenho e sei o número”, se este for o caso. Com as informações sobre o título já cadastrado, será exibida uma tela com a opção “Requerimento - Dados Pessoais”. A partir disso é só marcar a opção “Deseja incluir nome social? e prosseguir com o cadastramento dos dados solicitados.
“Desde 2018, a Justiça Eleitoral reconhece o direito de pessoas transgêneros e travestis ao uso do nome social no título de eleitor, se identificando da forma como se reconhecem e são reconhecidas ou reconhecidos na sociedade”, afirmou o TRE-PE. Nas últimas eleições, em 2020, aproximadamente 10 mil pessoas passaram a utilizar o nome social no título, segundo dados do TSE.