Apoios de políticos e partidos realmente rendem votos no segundo turno?
O Jornal do Commercio entrevista cientista político sobre qual é o real peso dos apoios de outros partidos e candidatos, seja na disputa pela Presidência da República como para o Governo de Pernambuco
Antes mesmo do fim da apuração das urnas, completada somente nas primeiras horas da madrugada do dia três de outubro, iniciaram-se as especulações sobre possíveis apoios de candidatos derrotados. Esse movimento acontece tanto com Lula (PT) e Bolsonaro (PL) no segundo turno da eleição para a Presidência da República como para Marília Arraes (SD) e Raquel Lyra (PSDB), que disputam o Governo de Pernambuco.
As conversas nos bastidores da política nacional e estadual, desde então, concentram-se no anúncio e na articulação de apoios de partidos e candidatos que ficaram de fora do segundo turno. Na disputa pela Presidência, a grande questão para Lula foi o apoio do PDT de Ciro Gomes, confirmado na última terça, e de Simone Tebet, do MDB, anunciado na quarta.
Já Bolsonaro se apressou em garantir o apoio de uma ala do PSDB, liderada pelo atual governador de São Paulo, Rodrigo Garcia. Além do tucano, Romeu Zema (Novo), governador reeleito de Minas Gerais, declarou apoio ao incumbente, assim como fez o Cláudio Castro (PL), governador reeleito do Rio de Janeiro. Isso garantiu a Bolsonaro palanque nos três maiores colégios eleitorais do país.
Enquanto isso, Cá em Pernambuco, Raquel Lyra já conta com o apoio expresso de Miguel Coelho (UB) e deve, ainda, receber o apoio de Anderson Ferreira e Gilson Machado, do PL. Eles são apoiadores de Bolsonaro no segundo turno e, no caso do ex-prefeito de Jaboatão, aguarda-se sinalização do presidente para confirmar o posicionamento.
Marília, que até o momento encontrava-se "isolada", conseguiu o apoio do PDT de Wolney Queiroz, do Republicanos de Silvio Costa e, também, do PCdoB, representado por Renildo Calheiros. Aguarda-se, também, posicionamento do PT e do PSB, fechando um palanque amplo de apoio à candidatura de Lula em Pernambuco.
O Jornal do Commercio conversou com José Mário Wanderley, cientista político e professor da Universidade Católica de Pernambuco sobre o peso eleitoral dos apoios políticos nestas eleições.
JC: No caso de Pernambuco, o quanto esses apoios podem impactar eleitoralmente?
O quanto impacta ainda depende de realização de pesquisas empíricas com dados, após a eleição. Então, nenhum apoio pode cravar o quanto impacta. O que a gente pode é saber quais são os mecanismos envolvidos em relação à busca de apoios.
A diferença entre as duas candidatas ficou muito pequena. É quase um empate técnico. Então, ambas precisarão buscar e costurar apoios, o que já estão fazendo desde hoje [quinta], para tentar uma uma nova configuração no segundo turno. Marília busca aumentar a distância em relação a Raquel, que tenta chegar em Marília
JC: O apoio expresso de Lula e Bolsonaro, o primeiro a Marília e o segundo ainda no campo da especulação a Raquel Lyra, podem desequilibrar a balança em Pernambuco?
No caso de Marília, o apoio oficial ajuda a consolidar seus votos e a receber parte dos votos de Danilo. Já Raquel, corre riscos com o apoio expresso de Bolsonaro, pois pode perder votos dos eleitores de Lula e de Tebet que votaram nela.
JC: Raquel já conseguiu o apoio de Miguel Coelho... Ela precisa do apoio de Anderson para receber o eleitorado bolsonarista?
O apoio expresso pode fazer pouca diferença. O eleitor bolsonarista, que que já vota em Raquel, não vai consolidar esse apoio pelo fato dele ter vindo de Anderson. O raciocínio que ele faz é outro: ele associa Marília com a esquerda, com o Lula por causa do apoio vertical, e isso faz com que ele ele aposte em Raquel mesmo não não considerando o próprio perfil dela. Ele vota em Raquel porque ele jamais votaria em Marília.
JC: Esses apoios são mais relevantes quando trata-se do chamado "voto de estrutura"?
A princípio, não. Pode fazer alguma diferença nesta eleição porque as candidatas estão muito próximas. Então, qualquer pouquinho de voto que você consiga faz uma grande diferença. Mas de modo geral, não.
JC: No contexto nacional, isso muda com relação à disputa de Lula e Bolsonaro?
Até agora, os apoios não foram surpreendentes, mas bem naturais. Então, por exemplo, o eleitor de Ciro já volta no Ciro porque não se vê representado por Lula. Então, dificilmente, haveria migração cirista para apoiar o Lula.
Já o eleitor de Simone Tebet, que herdou a camada da social democracia que antes era associada aos tucanos, não se vê identificado com Bolsonaro, então tende a migrar para Lula e principalmente a partir da presença do Geraldo Alckmin [ex-tucano e hoje filiado ao PSB] e do apoio expresso do Fernando Henrique [Cardoso]. Existe um eleitorado de centro-esquerda que não se vê representado pelo PT e que é aquele eleitorado fixo, difícil. Então, esse eleitorado jamais vai migrar para o PT.
Nessa aproximação que, quando o Ciro percebeu que não tinha como crescer, ele começou a atacar o Lula. Ele começou. direta ou indiretamente, a beneficiar a campanha do Bolsonaro.
JC: o apoio de Ciro Gomes a Lula tende ao voto em branco ou não impede a migração para Bolsonaro?
O processo tem que ser entendido dentro da maneira como ocorreu. O apoio começou, primeiro, no apoio institucional do PDT. Foi algo costurado pelo presidente Carlos Lupi para só depois chegar na pessoa do Ciro. Então são duas coisas diferentes.
Quem vota em Ciro não vota porque Ciro é do PDT, só vota nele como alternativa Lula. Avalio que esse apoio vai gerar uma uma situação fragmentaria. O apoio de Ciro pode dividir seus eleitores, parte migrando pra Lula e parte rejeitando esse apoio, migrando pro Bolsonaro.
JC: Bolsonaro obteve o Rodrigo Garcia em São Paulo, que é do PSDB. Isso pode fazer com que ele tenha menos resistência no eleitorado de centro-direita?
Na verdade, faz com que ele busque, também com apoio de Zema em Minas Gerais, diminuir a diferença pro Lula justamente dos dois maiores colégios eleitorais. Tem mais relação com o tamanho do eleitorado e com os benefícios que eles possam trazer para a campanha do que qualquer identificação política.
JC: Trazendo pra Pernambuco, um apoio do PSB e sua capilaridade na RMR pode dar um peso maior à campanha de Marília?
Um eventual apoio do PSB para para Marília pode levar a aquele efeito fragmentado que citado no nível nacional. Parte do eleitorado de Marília vota como rejeição a Paulo Câmara. Então é um xadrez complicado você querer você buscar os votos que originalmente foram pro PSB, pois são votos de identidade em relação aos Campos, a Câmara e continuidade do governo.
Tanto a campanha de Marília como a campanha de Raquel foi em cima de ser contra o poder estabelecido. Então essa aliança teria que ser costurada de uma forma a atrair os votos do PSB, mas não deixar ela tão clara, de forma que agora Marília apoie o Governo Paulo Câmara. Isso poderia dar, até, um benefício para Raquel.
JC: Um apoio velado ainda é importante, correto? Esse cálculo também pode ser feito por Raquel Lyra sobre o bolsonarismo e Anderson Ferreira?
Sim, e isso deve estar sendo levado em conta pelos estrategistas de campanha. [Um apoio velado ainda é relevante], com certeza. Somente você ter a máquina pública trabalhando em seu favor... O PSB, nesse momento vai mudar a sua forma de raciocinar, pois viu que não será mais governo. Ele tem poucos meses como governo. Então, sim, já deve estar se aproximando pra tentar encontrar vantagens num próximo governo que vai se estabelecer.
Há uma oportunidade maior [com Marília] principalmente pelo fato de que hoje Lula oficializou o apoio a Marília, de haver alguma negociação via Alckmin, via os Campos, para que o PSB local apoie Marília por uma negociação num futuro governo. Mas isso passa por por curar a antigas feridas e por encontrar uma forma de administrar a alta rejeição a Paulo Câmara.
JC: a campanha de Marília vem mirando a de Raquel pelo apoio dos Coelhos e o possível apoio de Anderson. Isso pode "pegar" no eleitorado?
Avalio que impacta. A composição dos votos de Raquel é a composição mais plural de todas elas. Ela tem voto bolsonarista, votos dos lulistas ao mesmo tempo, além dos eleitores de Tebet. Pode ser que a preocupação seja administrar estes apoios: uma coisa é o apoio operacional, outra coisa é o apoio simbólico oficial, pra que o apoio pra dar votos não tenha, por consequência, perda de votos.
JC: Há uma máxima na política de que apoio não se recusa. Isso continua válido num segundo turno como esse?
O que deve acontecer é: um apoio de Anderson Ferreira, não necessariamente, se traduz em guia eleitoral. Não vai falar que está sendo apoiada por Anderson. Ela agradece o apoio e você vai ver muita muita frase do tipo: 'não sou e não serei a governadora dos bolsonaristas ou dos lulistas, serei a governadora dos pernambucanos';
Então você vê muito isso nas palavras tanto de de Raquel como de Priscila Krause, e também do Daniel Coelho, que está assumindo junto com Priscila esse protagonismo de costurar as alianças. Há discursos que tentam despersonalizar os apoios e no final dizer que na verdade estão construindo um apoio pra Pernambuco.
Você aceita o apoio mas você não precisa divulgar que está sendo apoiado.