O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta sexta-feira, 31, que a abertura do inquérito das fake news foi um 'acerto histórico'.
"Se não tivesse esse inquérito, as agressões teriam aumentado de forma exponencial até uma ruptura", defendeu.
A investigação foi instaurada por ordem do então presidente do tribunal, Dias Toffoli, e se tornou uma das primeiras ofensivas do STF contra a base de apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Moraes foi escolhido relator do inquérito, o que o colocou na mira da militância bolsonarista. "Não achem que eu pedi para ser o relator, foi goela abaixo", afirmou.
Ele contou que a investigação foi aberta por iniciativa do próprio tribunal, em meio a uma escalada de ameaças aos ministros, porque a Polícia Federal (PF) não teria respondido aos apelos de Toffoli.
"Você não tem resposta da PF, o risco pessoal e profissional aumenta, nós vamos, enquanto Brasil e enquanto instituição, esperar pra ver o que ocorre? Foi um acerto histórico do ministro Dias Toffoli como presidente do STF", avalia.
Na época, a decisão gerou uma onda de críticas ao STF, porque na prática o tribunal abriu a apuração e passou a equilibrar os papéis de 'vítima' e 'juiz' do caso.
"A forma de utilização tradicional dos mecanismos era insuficiente. Toffoli já havia enviado mais de 30 ofícios à Polícia Federal. Estavam todos parados", contou. "Ou você interpreta finalísticamente ou você entrega a chave do Supremo Tribunal Federal."
Diante de uma pequena e seleta plateia, na Fundação FHC, em São Paulo, o ministro fez uma espécie de balanço da atuação do Supremo em defesa da democracia ao longo do governo Bolsonaro. Moraes defende que o STF funcionou como uma espécie de trincheira contra os arroubos autoritários do ex-presidente e de sua base aliada.
"A queda do STF seria a queda do Estado Democrático de Direito", disse. "Vimos deputados gravando vídeo e ameaçando de morte ministros do Supremo Tribunal Federal como fosse uma coisa normal."
O ministro relembrou, por exemplo, o ataque ao STF, em junho de 2020, quando extremistas do autodenominado grupo 300 do Brasil soltaram fogos contra o prédio do tribunal: "Hoje é rojão, amanhã é tiro e depois de amanhã é bazuca", projeta. "Era ridículo, mas incendiou as redes."
Moraes também se defendeu das críticas à decisão que mandou fazer buscas em endereços ligados a grandes empresários bolsonaristas investigados sob suspeita de financiarem atos antidemocráticos. A operação aberta em agosto do ano passado atingiu nomes como Luciano Hang, da rede de lojas Havan, Afrânio Barreira Filho, do Grupo Coco Bambu, e Joseph Meyer Nigri, fundador da Tecnisa.
"Por que não são pobres, eles não podem ter busca e apreensão? Porque no Brasil só pobre e preto pode ter busca e apreensão? Só que isso evitou 7 de Setembro financiado", defendeu.
O ministro assumiu a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às vésperas da eleição e precisou lidar com tentativas de colocar sob suspeita a segurança das urnas eletrônicas, de descredibilizar os institutos de pesquisa e de anular o resultado do processo eleitoral.
Foi ele quem vetou as investigações abertas pela PF e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre os institutos de pesquisa eleitoral. "Claramente era uma forma de tentar influenciar nas eleições", afirmou.
A campanha de Bolsonaro também chegou a pedir o adiamento do segundo turno. A equipe jurídica do então presidente alegou que ele teria sido prejudicado porque parte de suas inserções de rádio não teria ido ao ar. "A ideia era colocar o segundo turno em risco", avalia Moraes.
Com a derrota de Bolsonaro nas urnas, o PL passou a tentar anular parte dos votos. A ação rendeu ao partido uma multa de R$ 22,9 milhões, imposta por Moraes, e investigações na esfera criminal. O ministro classificou a estratégia como uma 'grande e patética manobra'.
"Negócio patético se não fosse agressivo à democracia", disparou o ministro. "O absurdo de um partido político que, no primeiro turno elegeu 99 deputados, quase 20% da Câmara, 6 a 8 senadores, governadores, pedir a impugnação da eleição."
Na avaliação do ministro, o discurso infundado sobre fraude das urnas foi uma 'lavagem cerebral'. Ele também avalia que foi um 'erro' ter deixado os bolsonaristas acampados em frente ao Quartel General do Exército em Brasília. "Eu diria mais que um erro, foi uma omissão que está sendo investigada. Obviamente eu não poderia determinar de ofício a retirada", explicou.
Moraes ainda ironizou os acampamentos, que segundo ele lotavam no final do dia, com 'churrasco' e 'chope de graça': "Esses são os verdadeiros revolucionários."
A PF e o Ministério Público Federal (MPF) já sinalizaram que o acampamento serviu de base para os atos golpistas do dia 8 de janeiro na Praça dos Três Poderes. As sedes do STF, do Congresso e do Planalto foram invadidas e depredadas por bolsonaristas radiciais inconformados com a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Essas pessoas precisam ser responsabilizadas para perceber que não é fácil atentar contra a democracia", defende Moraes. "É um negócio assustar o que essa lavagem cerebral das milícias digitais está fazendo com as pessoas. E nós não podemos subestimar de novo."
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