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Os muitos debates por trás do projeto contra as fake news

Discussão se estende a áreas mais ideológicas, como o limite da intervenção do Estado sobre a liberdade de expressão e o poderio econômico das grandes empresas de tecnologia

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Publicado em 27/05/2023 às 10:44
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Nas últimas duas semanas, o Projeto de Lei 2 630/2020, batizado de PL das Fake News, foi apressado por um pedido de urgência, depois adiado e teve parte de seu conteúdo transferido para outra proposição - FOTO: Divulgação

Nas últimas duas semanas, o Projeto de Lei 2 630/2020, batizado de PL das Fake News, foi apressado por um pedido de urgência, depois adiado e teve parte de seu conteúdo transferido para outra proposição. Tanta atividade é sinal da relevância do tema - um dos mais importantes em análise no Congresso brasileiro e foco de discussão também em outros países

O objetivo do projeto é responsabilizar plataformas como Facebook, Google, Telegram, TikTok e Twitter pela disseminação de conteúdo criminoso, que estimule rompimento da ordem democrática ou violência contra mulheres e crianças. Porém, a discussão se estende por outras áreas, mais ideológicas, como o limite da intervenção do Estado sobre a liberdade de expressão e o poderio econômico das grandes empresas de tecnologia.

Para eliminar empecilhos à votação, a remuneração de artistas e dos meios de comunicação cujo conteúdo for replicado nas plataformas foi retirado da proposta e acomodada em um outro projeto, o 2.370/2019, que trata de mudanças na Lei dos Direitos Autorais e foi apresentado inicialmente pela deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Por duas vezes, articulações na Câmara para dar regime de urgência à proposição acabaram frustradas - a tentativa mais recente foi na quarta-feira passada.

A nova versão, costurada pelo relator Elmar Nascimento (União Brasil-BA), inclui modificações feitas com o objetivo de agradar a bancada evangélica. A nova redação considera "artistas intérpretes ou executantes" os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel em obras religiosas.

Em outro trecho, Nascimento incluiu pregações religiosas como "obras intelectuais protegidas". Como o projeto também prevê a remuneração por direito autoral em plataformas digitais, uma pregação religiosa disseminada na redes sociais obrigaria as big techs a remunerarem o pastor que a proferiu. Vídeos de pregações, completas ou em trechos, são frequentemente compartilhadas nas redes.

Regulação

Apresentado originalmente em maio de 2020 pelo senador Alessandro Vieira (PSDB -SE), o PL 2.630 trouxe à tona debates que dividem os observadores. Discutem-se, entre outros pontos, a regulação dos provedores, a criação de uma entidade fiscalizadora, a imunidade parlamentar nas redes sociais, o pagamento de direitos autorais e a remuneração a empresas jornalísticas e artistas por big techs.

O governo, principal patrocinador da proposta, cita a tentativa de golpe de 8 de janeiro e os ataques a crianças e professores em escolas como justificativa para a aprovação. Os defensores da medida dizem que ela é essencial para evitar a proliferação de informação falsa nos ambientes virtuais e os efeitos sociais e políticos da desinformação. Os opositores afirmam que o texto dará poderes ao governo para censurar conteúdos que lhe sejam desagradáveis.

Necessidade

Para juristas especializados na questão e para os meios de comunicação, é uma regulamentação necessária, cujo debate em profundidade não pode ser adiado. "O PL cria um regime regulatório por boas razões, algo que se tornou premente e necessário hoje", diz o professor Diogo Coutinho, titular da cadeira de Direito Econômico da Faculdade de Direito da USP.

De acordo com a coalizão do setor de comunicação, pelo menos 55 países já aplicam controles no uso da internet, o que demonstra a necessidade de avançar na busca de um modelo de regulação.

As big techs, companhias multinacionais que detêm os direitos sobre as plataformas online, afirmam entender e apoiar os objetivos do projeto, mas são contrárias ao texto atual. Alegam, de modo geral, que o modelo de vigilância de conteúdo contido na proposta não é viável.

Com isso, querem adiar a votação para que o tema seja mais debatido. "O PL 2.630 pode tornar nossas plataformas menos seguras ao obrigar a divulgação de informações estratégicas que poderiam ser usadas por pessoas mal-intencionadas", escreveu no mês passado o presidente do Google Brasil, Fábio Coelho, em postagem no blog da empresa.

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