O Senado aprovou o nome de Cristiano Zanin Martins, de 47 anos, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Contestada sob o argumento de ferir critérios constitucionais e republicanos, a escolha de Lula não enfrentou dificuldades para superar a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.
Zanin foi beneficiado por uma oposição conformada, quando não alinhada aos governistas, o que evitou um escrutínio mais aprofundado do ex-advogado pessoal do presidente. Ele recebeu 58 votos favoráveis e 18 contrários no plenário. O advogado vai ocupar a cadeira deixada pelo ministro aposentado Ricardo Lewandowski.
Foi a primeira indicação de Lula ao Supremo no seu terceiro mandato como presidente. Também a mais polêmica desde quando o petista assumiu o Palácio do Planalto pela primeira vez, há 20 anos. Representantes dos Estados em cargos majoritários, os senadores que compõem a CCJ são obrigados a analisar se o nome indicado pelo chefe do Executivo federal é apto para ocupar o cargo na Corte máxima do País. O mais substancial questionamento em relação à indicação de Zanin era se ela corrompia o princípio da impessoalidade, determinado pela Constituição.
Zanin ganhou notoriedade nacional por ter sido advogado do presidente nos processos da Operação Lava Jato, que levaram Lula à prisão por 580 dias. O advogado se tornou pessoa de confiança do petista. Zanin não negou sua relação com Lula durante a sessão da CCJ, mas fez o possível para tentar minimizar a importância da defesa do petista em sua carreira profissional - focou as falas na sua trajetória no direito empresarial.
LAVA JATO
Como uma mostra do aspecto morno da sabatina, o esperado embate entre o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), ex-juiz da Lava Jato, e Zanin - que reviveria a disputa travada durante processos da operação anticorrupção - ocorreu em tom formal. Moro já havia avisado que não era "barraqueiro" e destacou na sabatina que não havia pegadinhas nas questões feitas ao advogado.
O senador quis arrancar de Zanin o compromisso de que não atuará no STF em nenhum processo ligado à operação. O advogado rejeitou a sugestão de Moro. Disse que não reconhece o rótulo da Lava Jato como referência prevista em lei e afirmou que vai examinar caso a caso.
"Não acredito que o simples fato de colocar o nome Lava Jato no processo é critério para ser utilizado no ponto de vista jurídico para aquilatar o impedimento", disse. "Quase tudo que funcionava em varas criminais muitas vezes recebia a etiqueta de Lava Jato. Uma vez identificada uma hipótese de impedimento ou suspeição, não terei o menor problema de declarar."
Dos bolsonaristas na CCJ, os senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Jorge Seif (PL-SC) trataram Zanin como ministro antes mesmo da votação terminar. Eles pouparam o indicado de ataques frontais. "Se o presidente da República hoje fosse Jair Bolsonaro, ele não ia indicar um inimigo", disse Seif. "E eu não posso jogar pedra porque o presidente Bolsonaro indicou André Mendonça, que ele confiava e tinha uma amizade próxima. Quantas vezes comemos peixe, fizemos eventos. Era próximo da primeira-dama (Michelle Bolsonaro)."
Já Flávio antecipou que Zanin deveria ter uma votação "expressiva" tanto na CCJ (na comissão foram 21 votos a favor do indicado, e 5 contra) como no plenário do Senado. "Quero pedir a Deus que o senhor leve o bom senso, a seriedade, a segurança jurídica e o exemplo de respeito à Constituição na sua atuação no STF", afirmou o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) - que quis saber se Zanin aprova o chamado fishing expedition, uma expressão em inglês usada para definir ações judiciais deflagradas para buscar provas contra um investigado de maneira genérica.
O senador não citou seu pai nominalmente, mas a referência tem relação às críticas que Bolsonaro faz às operações de busca e apreensão determinadas pelo ministro do STF Alexandre de Moraes e que tiveram como alvo auxiliares do ex-presidente. Zanin respondeu de maneira abrangente, sem citar um caso específico e declarou que o fishing expedition é prática condenável.
DROGAS
Durante quase oito horas de sabatina, Zanin fez uma defesa do exercício do jornalismo, disse que ainda terá de analisar a questão da Lei das Estatais, em julgamento no Supremo, afirmou que a droga "é um mal a ser combatido", mas que "não pode haver vale-tudo", e que o poder do Estado precisa ter limites em apreensões. Não quis opinar sobre o foro privilegiado.
Também disse que quer atuar como "agente pacificador" entre os Poderes, para evitar "interferências desnecessárias". Em breves acenos a parlamentares de direita e esquerda, falou que o direito à vida e à propriedade é garantido pelo estado democrático de direito e defendeu a erradicação da pobreza, fome zero, igualdade de gênero e uma agricultura sustentável como metas "mais caras" ao Brasil.
Ele ainda evitou indicar de que lado está em questões sensíveis entre os senadores como o marco temporal para demarcação de terras indígenas.