EQUIDADE RACIAL

Pressão para Lula indicar primeira ministra negra para o STF amplia debate sobre pouca diversidade na Justiça brasileira

Essa seria a primeira vez que uma jurista negra ocuparia o cargo de ministra no Supremo Tribunal Federa (STF)

Mirella Araújo
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Mirella Araújo
Publicado em 14/07/2023 às 18:56 | Atualizado em 14/07/2023 às 20:41
Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Segundo a pesquisa "Negros e Negras no Poder Judiciário" de 2021, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apenas 5% das magistradas são mulheres negras - FOTO: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, em outubro, a pressão para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indique uma mulher negra para ocupar o cargo no Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a ser intensificada.

Mas, esse debate não se concentra apenas à indicação da primeira mulher a integrar a Corte Suprema, ele também passa pela discussão sobre a composição do sistema judiciário brasileiro, cuja a equidade racial está muito aquém da representatividade que se almeja nos espaços de poder.

Uma das co-fundadoras da Abayomi Juristas Negras, a procuradora federal Chiara Ramos, destaca que apesar de ser uma ministra mulher que está se aposentando no STF, os nomes que estão surgindo para a substituírem são de homens brancos. Ela, que é presidenta da Comissão da Verdade sobre a Escravidão, e única pernambucana membro da Comissão de Juristas instituída pela Câmara dos Deputados, rebate os argumentos meritocráticos que cercam esse tema.

“Esse argumento meritocrático é um argumento racista e sexista, porque parece que só tem mérito um grupo de homens brancos e isso se evidencia muito quando você vê os nomes que estão sendo sugeridos para ocupar essa vaga. Como se não existisse a possibilidade de nomear uma mulher negra para essas opções”, afirmou Chiara Ramos, em entrevista ao JC.

“É algo que sempre temos que ter em conta, porque a competência das mulheres é sempre questionada, sobretudo das mulheres negras. Nós temos como requisito para ocupar estes cargos, o notório saber jurídico e a reputação ilibada. E nós temos muitas mulheres negras com doutorado, diversos livros publicados e uma atuação jurídica de impacto, temos vários nomes”, completou.

Em março deste ano, um grupo liderado por juristas negras, encaminhou ao presidente Lula, um documento chamado “Manifesto por juristas negras no Supremo Tribunal Federal”. De acordo com Chiara Ramos, essa campanha já conta com 2.500 assinaturas e o apoio de mais de 80 organizações.

Dos 11 ministros que atuam na Corte, duas são mulheres (Rosa Weber e Cármen Lúcia) e nenhuma delas é negra. A última pessoa negra a integrar o STF, foi o ex-ministro Joaquim Barbosa, em 2003, por indicação do presidente Lula em seu primeiro mandato.

É importante destacar, segundo a procuradora federal, que essa representatividade em questão, não se reduz somente a um movimento de reparação histórica com a população negra - que corresponde a 56% da população brasileira que se autodeclara negra, segundo o Censo 2022.

“Quando lutamos pela ocupação destes espaços é muito mais porque a efetivação da justiça precisa de pluralidade. Precisamos de uma ampliação de visão de mundo e de justiça para julgar casos complexos da sociedade”, apontou Chiara Ramos.

A Abayomi Juristas Negras é uma associação de combate ao racismo institucional e estrutural, com foco na inclusão das mulheres negras em espaços de poder. Eles oferecem capacitação, aperfeiçoamento, empoderamento e treinamento para mulheres da área do Direito. 

 

Divulgação

A procuradora federal Chiara Ramos, afirma é urgente uma discussão ampla sobre essa representatividade no Judiciário, pois a base da população brasileira é formada por mulheres - Divulgação


Pacto Nacional

A coordenadora do Grupo de Trabalho Equidade Racial e Combate ao Racismo e suas interseccionalidades do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), a juíza Luciana Maranhão, considera que mesmo diante do déficit de representatividade negra no Poder Judiciário, dar visibilidade a esse tema é considerado um dos grandes avanços dos últimos anos.

Na pesquisa "Negros e Negras no Poder Judiciário", do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), realizada em 2021, verificou-se que apenas 5% da magistratura é composta por mulheres negras.

“Há 20 anos, falar sobre isso sequer era ventilado. Essa circunstância do racismo e de toda essa realidade, isso estende para o Poder Público, para as entidades privadas, porque ela é sistêmica e institucionalizada. No momento em que estamos debatendo, é porque há uma demanda natural da sociedade dessa situação de desvantagem permanente dos povos racionalizados de forma geral (negros e originários)”, afirmou a juíza Luciana Maranhão, em entrevista ao JC.

O CNJ instituiu o Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial, sob quatro eixos de atuação: Promoção da equidade racial no Poder Judiciário; Desarticulação do racismo institucional; Sistematização dos dados raciais do Poder Judiciário; e Articulação interinstitucional e social para a garantia de cultura antirracista na atuação do Poder Judiciário.

O TJPE aderiu a esse pacto e apresentou o trabalho desenvolvido através destes eixos temáticos. “Essa é uma busca de articulação permanente e institucional para garantir uma atuação antirracista desse judiciário. Se você analisar esses eixos e considerar esse pacto nacional, essa política de ação ela pode sim ser um ponto de efetividade e eficácia no enfrentamento desse problema”, afirmou a magistrada.

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