Legislativo

Crescimento populacional altera equilíbrio de bancadas na Câmara

A alteração do número de deputados, no entanto, não é automática e depende de aprovação do próprio Poder Legislativo

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Estadão Conteúdo

Publicado em 20/08/2023 às 22:01
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Os dados populacionais do Censo de 2022, divulgados neste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que o número de habitantes de alguns Estados cresce mais do que o de outros. Essa variação pode ter um impacto direto na quantidade de cadeiras a que cada unidade federativa tem direito de ocupar na Câmara dos Deputados. A alteração do número de deputados, no entanto, não é automática e depende de aprovação do próprio Poder Legislativo.

Um exemplo dessa discrepância está na comparação entre o Paraná e o Rio Grande do Sul. Apesar de os paranaenses terem ultrapassado os gaúchos em total de habitantes, elegem 30 representantes. Os gaúchos, 31. Também no Sul, Santa Catarina se tornou a 10ª unidade da federação mais populosa do Brasil e pode eleger 16 deputados federais.

Já o Maranhão, 12ª com mais habitantes, tem 18 vagas na Câmara. O mesmo ocorre com o Amazonas, que, apesar de já ter passado a população do Espírito Santo e do Piauí - os dois Estados com dez assentos -, segue tendo direito a oito cadeiras, o mínimo garantido pela Constituição.

Os assentos da Câmara são divididos de maneira proporcional entre os Estados e o Distrito Federal, de modo que nenhum deles tenha direito a mais de 70 nem menos de oito deputados federais. Ou seja, os eleitores dos Estados mais populosos elegem mais deputados do que os eleitores de Estados com menos habitantes.

São Paulo, Estado mais populoso do Brasil, tem 70 deputados federais. Na sequência, estão Minas Gerais, Rio e Bahia, com 53, 46 e 39 cadeiras, respectivamente. A proporção entre a divisão das vagas e a população segue até chegar a Roraima, o Estado com menos habitantes do País, com oito deputados.

FÓRMULA PARA DEFINIR O NÚMERO DE DEPUTADOS DE CADA ESTADO

Para chegar ao número de cadeiras de cada Estado na Câmara, é preciso saber o Quociente Populacional Nacional (QPN), obtido pela divisão da população do País (203.035.512, de acordo com o Censo de 2022) pelo número de cadeiras na Câmara, 513, estabelecido por lei complementar de 1993. Depois, é preciso dividir a população de cada unidade federativa pelo QPN, obtendo-se o Quociente Populacional Estadual (QPE). O número aproximado do QPE resultará no número provisório da bancada de cada Estado.

Entretanto, há cadeiras que ficam sobrando após a distribuição pelo QPE. Elas são divididas posteriormente entre as unidades da Federação, excluindo São Paulo, que já tem o máximo de 70, e os Estados com QPE menor do que oito. Para fazer essa segunda partilha, é preciso dividir a população de cada um desses Estados pelo número de cadeiras que obtiveram na primeira repartição mais 1, resultando em um número chamado de Maior Média (MM). Elas são distribuídas entre os Estados com maior MM até não sobrar nenhuma.

A distribuição dos parlamentares na Casa foi feita pela última vez em 1993, com dados do Censo de 1991. Desde então, apesar de o número de habitantes de cada Estado no Brasil ter mudado, a divisão de vagas não foi refeita.

Em 2013, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) usou o Censo de 2010 para tentar alterar o número de vagas na Câmara. O Supremo Tribunal Federal (STF), porém, entendeu que a resolução era inconstitucional e anulou a decisão.

SÓ O CONGRESSO PODE MUDAR A DISTRIBUIÇÃO DO NÚMERO DE DEPUTADS

Roger Stiefelmann Leal, professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, afirmou que, embora "o aumento populacional em certas unidades federativas e a redução em outras criem pressão natural para que a representação no âmbito da Câmara dos Deputados sofra alterações", a Constituição prevê que elas sejam feitas "pelo Poder Legislativo por meio de lei complementar".

Isso quer dizer que cabe ao Congresso substituir a lei em vigor desde 1993 e refazer a distribuição de cadeiras, sem que seja alterado, porém, o número total de assentos. Apesar disso, Cláudio Couto, cientista político e professor adjunto do Departamento de Gestão Pública da FGV, avaliou que "é muito pouco provável que haja condições políticas de esse acerto ser feito".

"Os Estados que ganham habitantes querem a mudança e os que perdem não querem deixar que ela aconteça. É um impasse que acaba produzindo uma não decisão, uns ganham e outros perdem a despeito das mudanças populacionais", disse o professor.

"Se a gente considerar que o peso da população do Centro-Oeste cresceu no total e que essa região tende a se aliar mais a pautas conservadoras - ela, inclusive, votou em massa no ex-presidente Jair Bolsonaro na última eleição -, isso tende a gerar ganhos para esse setor. O mesmo vale para Paraná e Santa Catarina, justamente os dois Estados mais conservadores da Região Sul e que tiveram um aumento grande de população", afirmou.

Couto ponderou que é preciso saber quem são as pessoas que provocaram um aumento no número de habitantes nessas unidades da Federação. "Se uma população que tende a votar mais no PT em nível nacional migra para esses Estados, é possível que haja até uma mudança na composição das preferências eleitorais nesses locais. A gente imagina que o voto conservador cresça, mas não dá para ter certeza de qual vai ser o resultado."

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