Por Ennio Benning*, autor de “Jarbas Vasconcelos – Uma Biografia”
Pernambuco vê sair de cena um dos seus maiores personagens políticos, que começou a trajetória no século 20 e a encerra de forma digna na segunda década do século 21, se aposentando da vida parlamentar e eleitoral. Jarbas de Andrade Vasconcelos conquistou todas as posições que almejou – posições que, com certeza, nunca passaram por sua cabeça quando atuou como porteiro da Assembleia Legislativa de Pernambuco e soldado da Polícia do Exército, no início da década de 1960.
Jarbas é o democrata que enfrentou o autoritarismo com coragem – política e física –, defendeu os Direitos Humanos, Eleições Diretas e a convocação de uma Assembleia Constituinte quando isso era considerado coisa “de comunista”, de “radical inconsequente”.
Jarbas nunca fugiu dos embates eleitorais, mesmo quando as condições eram extremamente desfavoráveis e a derrota era uma hipótese real. Soube se reinventar sempre que isso ocorreu, sem nunca perder o protagonismo conquistado. Coerente e incisivo, nunca abriu mão de suas convicções, mesmo quando não contavam com a simpatia da maioria. Mas sabe admitir quando erra, como quando não foi ao Colégio Eleitoral votar em Tancredo Neves, em 1985: “Eu não poderia estar certo e todos errados”. Isso, no entanto, não impediu que se tornasse o maior vencedor de eleições majoritárias da História Política de Pernambuco: duas vezes prefeito do Recife, duas vezes governador e duas vezes senador da República.
Jarbas exerceu o papel de Governo e também de Oposição com coragem e determinação, palavras que gosta de citar e que se aplicam a ele com perfeição.
Jarbas também é o gestor inovador, que sabe, como poucos, montar uma equipe governamental; dar a ela liberdade e autonomia para trabalhar, certo de que os frutos a serem colhidos tinham o seu olhar de aprovação e incentivo. Iniciativas e inovações que hoje fazem parte da realidade do Recife e de Pernambuco quando se fala de requalificação do Centro da Capital, Porto Digital, Patrimônio Vivo, Escola em Tempo Integral, Fenearte e aspectos imateriais como o resgaste da autoestima de recifenses e pernambucanos. Quem não se lembra das versões em ritmos populares do emblemático Hino de Pernambuco?
Jarbas, como prefeito, cuidou do Recife como cuidava da sua casa: dando atenção aos pequenos detalhes, meticuloso, acompanhando as obras de perto e ouvindo a população por meio do primeiro orçamento participativo do Brasil, o “Programa Prefeitura nos Bairros”. Suas obras nas localidades mais carentes do Recife ainda hoje, quase quarenta anos depois, têm o reconhecimento dos moradores. Ruas que foram “tiradas da lama”, como ele também gosta de lembrar.
Jarbas, como governador, buscou assegurar a infraestrutura necessária para que Pernambuco pudesse crescer, se desenvolver e criar oportunidades para todos. Com água, energia, estradas, gás natural, portos e aeroportos. Investimentos que possibilitaram a atração de grandes empreendimentos, como o Estaleiro Atlântico Sul, a Refinaria Abreu e Lima, a Hemobrás, o polo petroquímico. Talvez a duplicação da BR-232 até São Caitano seja a iniciativa mais conhecida, por melhorar a ligação da área metropolitana com as outras regiões do Estado e por permitir a expansão econômica em todos as cidades cortadas por essa “via do desenvolvimento”, como Jarbas chama a 232. Por meio do “Programa Governo nos Municípios”, manteve a ouvida popular, pioneira décadas antes no Recife.
Jarbas, senador da República, por duas vezes, resgatou o mandato que a legislação casuística da ditadura tirou dele em 1978. Mais uma vez no Parlamento, foi uma voz ouvida por todos toda vez que subia à Tribuna do Senado Federal.
Senador Jarbas Vasconcelos se aposenta após mais de 50 anos na política
E quis o destino que esse fosse o último mandato popular a ser exercido por Jarbas. Trata-se de certa forma, um retorno às suas origens como deputado estadual, eleito em 1970. Ele se aposenta do mandato popular concedido por pernambucanas e pernambucanos com o respeito ao povo que sempre o marcou. Quis também o destino que essa decisão ocorresse na Semana da Pátria, à qual Jarbas sempre serviu com paixão e coragem ao longo de 53 anos de vida pública. Vida longa, Jarbas.
*Ennio Benning é jornalista e autor de “Jarbas Vasconcelos – Uma Biografia”