Palácio e Assembleia mais próximos após turbulências de 2023 e eleição da mesa
A linguagem mudou, o relacionamento entres as partes também, as nuvens foram recompostas e só quem não percebeu isso acabou se complicando
Uma das frases mais citadas no Brasil quando se trata de analisar os meandros da política é do ex-governador de Minas Gerais Magalhães Pinto: “Politica é como nuvem. Você olha, ela está de um jeito. Olha de novo, e ela já mudou”, dizia ele, que era conhecido como excelente orador no tempo em que as pessoas ainda paravam para ouvir com atenção em comícios ou “ao pé do rádio” o que se conhecia - usando a linguagem da época - os grandes tribunos (oradores).
Magalhães ensinava que quem analisasse a política como o retrato de um determinado momento estava correndo risco de cometer um grande erro. Na verdade, aquele que observasse o quadro político pernambucano no primeiro ano de mandato da governadora Raquel Lyra, de constantes embates entre o Palácio do Campo das Princesas e uma Assembleia Legislativa disposta ao tudo ou nada para fazer valer sua autoproclamada “independência” – situação que abalou profundamente a popularidade da governadora –, custaria a acreditar no que aconteceu na última segunda-feira, dia 02.
Raquel deu a mão à palmatória
Refeita dos primeiros tropeços, quando tentou interferir na casa sem êxito, a governadora pode observar do outro lado da ponte, o rio voltar para seu curso normal. Uma ruidosa disputa pela 1ª secretaria entre os deputados Gustavo Gouveia e Francismar Pontes, com este saindo vencedor em um movimento suprapartidário comandado pelo PP, acabou impedindo que o presidente Álvaro Porto, muito respeitado pelos colegas mas sem a força eleitoral que exibia em 2023, elegesse Gouveia como seu companheiro de chapa.
Álvaro chegou a conversar com todos os colegas para aparar as arestas com o 1º secretário e até sentou ao lado de alguns deputados, do primeiro para o segundo turno, mas não obteve êxito. Foi reeleito presidente com 12 votos a menos do seu primeiro mandato e não levou junto o companheiro, ao contrário do que vinha acontecendo sempre que os deputados eram chamados para decidir alguma coisa na casa legislativa.
Dois bicudos não se beijam
Foi assim que o presidente escolheu quem desejou para as duas vagas do Tribunal de Contas e impôs-se frente ao Executivo de tal forma que, mesmo tendo sido eleito deputado pelo PSDB, o mesmo partido da governadora, declarou-se de oposição a seu governo, situação que nenhum governador pernambucano tinha enfrentado até agora.
Aos olhos da política o relacionamento do Palácio com a Assembleia azedou, como se comentou muito em 2023, por vários motivos mas um teria sido especial: o fato da governadora e do presidente do Poder Legislativo possuírem temperamentos fortes o suficiente para não aceitarem recuar diante de pouca coisa.
Álvaro lembra Jesus Cristo
Mas, assim como Raquel, que acusou o golpe inicial e voltou às boas com o próprio presidente – os dois chegaram a quase romper publicamente –, viu-se em Álvaro, após o resultado da eleição, um líder cordato ao conceder entrevista reconhecendo-se falível –“ nem Jesus agradou a todos” – pregar a união da casa e incentivar o trabalho em favor de Pernambuco.
Chegou a lembrar do relacionamento institucional com a governadora, ressaltando que durante o seu mandato nunca os deputados deixaram de aprovar os projetos do Executivo enviados para apreciação legislativa.
A linguagem mudou, o relacionamento também, as nuvens foram recompostas e só quem não percebeu isso acabou se complicando.
O próprio Gustavo Gouveia, um ano antes, quando foi antecipada a eleição da mesa-diretora, que acabou derrubada pelo Supremo, fora reeleito para o mesmo cargo, sem qualquer dificuldade.
O que o prejudicou foi a eleição municipal deste ano quando é acusado pelos colegas de ter invadido espaços de outros deputados para garantir que o irmão Marcelo Gouveia, presidente da Amupe, adquirisse força para se candidatar a deputado federal em 2026.
Reconhecimento tardio
“Gustavo parece não ter percebido que a situação mudou e quando tentou consertar já era tarde” – afirmou um deputado que trabalhou intensamente pela eleição de Francismar.
Nos corredores da Alepe se comenta que o próprio presidente teve 12 votos a menos que em 2023, quando foi eleito pela primeira vez, porque estava defendendo uma causa perdida.
Mas, serenados ânimos, como lembraram alguns deputados no final da disputa, os ventos tendem a soprar por caminhos menos tortuosos: “nisso tudo quem ganha é a democracia e Pernambuco” – afirmou um deles, lembrando que “não é bom para ninguém poder demais nas mãos de um só ou mesmo de alguns. Essa é a principal lição que tiramos hoje de todo esse embate e quem não aprender vai acabar se prejudicando mais na frente pois a brisa de hoje pode se transformar em vendaval amanhã”.