"Como assim não pode?" - A vida louca do Bonde do Rolê

ROMERO RAFAEL
Publicado em 20/11/2014 às 19:00
Bonde-do-Role - Crédito-Juan Salvarredy Foto:


O Bonde do Rolê processa no seu triturador musical sons diversos. Trituram também, em pedacinhos tão minúsculos incapazes de ser vistos a olho nu, o convencional. Com humor e escracho, fazem farra despudorada - da música que tocam às performances de palco. Sobretudo as performances, que a banda - formada em Curitiba, em 2005 - colocou no videoclipe de Vida loka, escolhido Melhor Clipe no Prêmio Multishow. Rodrigo Gorky, que completa o grupo com Pedro D'Eryot e Laura Taylor, conversou com o Social1 sobre o trabalho e ser "vida louca".

Nota: importante que você, leitor, acrescente nas entrelinhas das respostas muitos risos do entrevistado, que pede aos fãs alegria e vinis.

Pedro D'Eryot, Laura Taylor e Rodrigo Gorky/Foto: Juan Salvarredy/Divulgação

O clipe de Vida loka foi escolhido como o melhor, no Prêmio Multishow. Prêmio é um reconhecimento. Que reconhecimento é esse?

Os dois maiores prêmios que a gente já ganhou foram um da APCA [Associação Paulista de Críticos de Arte], em 2007, como Melhor Show - a gente até ganhou do Caetano [Veloso] - e esse do Multishow, com um videoclipe basicamente mostrando a nossa vida ao vivo. Isso é um sinal de que é a melhor banda ao vivo no Brasil; de que não tem show melhor.

Li o seguinte tweet de um fã da banda: 'Por que eu amo @bondedorole? Que outra banda faz isso durante o show?', postado com foto de um fã com o microfone entre as nádegas. Esse é o diferencial de vocês?

A gente dá liberdade para as pessoas fazerem o que quiserem com a gente, e a gente também quer liberdade de fazer o que quiser com eles. É ver quem desce mais o nível: se a gente no palco ou se o público em cima da gente. Acho que isso é especial... Normalmente, você vai a um show e fala 'ah, que bonito!'... Os artistas dizem que é legal receber energia, mas quero ver aceitar essa energia e ir junto. Se o fã tentou pegar no pinto, pega no pinto dele também. Faz parte. A gente pensa: 'se a música está fazendo isso com ele, bora'.

Clique no frame para assistir ao clipe:

A que ponto mais distante chegou essa liberdade?

Talvez só não rolou sexo ao vivo - qualquer tipo de sexo, é importante dizer - mas o resto já. Sexo rolou quase uma vez: um garoto estava ao lado do palco quase pondo um pinto na boca, mas o segurança impediu... Como assim não pode? Olha, todas as baladas em que tocamos são para maiores de 18 anos. A gente gravou esse clipe, que é quase um convite. Você quer participar disso? Então, vai num show nosso. Todo mundo beija todo mundo, rola uma bagunça grande, mas fica num clima 'cine privé', vira o 'Cocktail' do Miele [programa apresentado por Luís Carlos Miele]. Rola peitinho, striptease, mas é uma coisa 'Emmanuelle' [em menção à série de filmes eróticos, famosa quando exibidos no Cine Pivé, nas noites de sábado da Band], não é 'Garganta profunda'... Não sei porque não trocaram a fita, mas não é a gente quem vai fazer isso.

Qual o termômetro?

O comportamento varia de lugar para lugar, se a festa tem bebida mais barata ou não, se é mais hétero ou gay... Mas, se não tem gente pelada, tem quem tire a camisa. Sempre tem alguém 'pagando peitinho'. A gente não força. Lógico que a gente sugere, mas a gente não manda. Tem um momento em que a gente pergunta: 'Vocês estão gostando? Agora tem que tirar a roupa, se não sai do palco'. Daí vão ficando as pessoas. Depois: 'Para essa música, tem que ficar sem calça'. Se não tira, sai do palco.

Qual a "disposição" do público do Recife?

É um público que fica até o fim da festa. Lembro de um show aí que foi difícil de a gente puxar gente porque o palco era pequeno. Mas nessa época a gente ainda não fazia shows desse jeito. Houve uma mudança de público muito grande. Antes era mais alternativo, roqueiro, a maioria hétero, que gostava do nosso senso de humor. Agora, a maioria é gay, mais antenada com música pop.

Como se deu a mudança?

A gente tinha voltado de turnê no exterior e foi fazer um show em Belo Horizonte. A gente pintou alfaias, nos vestimos coloridos e íamos cantar musiquinhas bonitas. Quando a gente viu, todo mundo estava querendo tirar um pedaço nosso. Então, a gente foi modelando o show para uma coisa mais pesada. A gente ficava: 'Gente, calma!'. Inclusive, fizemos questão de gravar parte do clipe em BH.

Você disse que o clipe é bem a vida de vocês...

No show, sim. Em casa, eu sou bicho manso. Bicha mansa. No show você bebe, acaba pegando a energia do povo. Depois do show a gente sempre está com o povo. Você não pode ser a Ivete [Sangalo] e fazer isso. Eu gostaria muito de ser ela, mas ela não iria conseguir. Ela dá a mão, mas o povo quer o braço, o tronco inteiro. Quando a gente dá a mão e a pessoa pega o braço, a gente pega os dois braços dela e aí vai descendo. Ela [Ivete] não pode fazer isso. O clipe é, digamos, os melhores momentos.

Quais as dificuldades de não ser convencional?

A gente enfrenta dificuldades que muita gente num plano mais tradicional, às vezes, não sofre. É muito mais fácil para conseguir apoio do Governo, patrocínio de uma marca... A Tommy Hilfiger [grife americana] vai lançar campanha com música nossa. Muita coisa acontece lá fora, onde o povo está pouco se lixando para o que a gente fala, faz... Já aqui tem muito dessa política: 'Ah, vocês não são politicamente corretos'. Mas sempre tem que ter alguém para mandar um f***-se.

E seus pais?

Sempre diigo: 'Mãe, é de brincadeira!'. Ela até ficou com meu prêmio. Meu pai diz que gosta, mas que a gente devia passar mais mensagens positivas. A gente faz isso. A gente diz 'seja livre, fale e faça o que você quiser, com responsabilidade'. Nossas mensagens são as mais positivas, só que de modos não convencionais de serem ditas.

Como vocês compõem: na diversão ou seriedade?

Há um pouco dos dois. A gente costuma sentar, beber e falar besteira. Depois do show também, já cansados e bêbados, a gente grava o que fala. Nada sai muito bom, mas é divertido. Depois a gente ouve. Daí tem um olhar clínico de bêbado e sóbrio. O que funcionar...

Foto: André Ligeiro/Divulgação

O grupo é uma das atrações da festa do coletivo Golarrolê, sábado (22), no Catamaran, no Recife.

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