Orquestra Sanfônica Balaio do Nordeste representa preservação e renovação musical

Mariane Monteiro
Mariane Monteiro
Publicado em 24/06/2020 às 7:30
Orquestra Sanfônica Balaio Nordeste coloca o sanfoneiro como protagonista. Grupo nasceu em 2011, na Paraíba. Foto: Mingareli Comunicação
Orquestra Sanfônica Balaio Nordeste coloca o sanfoneiro como protagonista. Grupo nasceu em 2011, na Paraíba. Foto: Mingareli Comunicação

Prestes a completar 10 anos, grupo respeita patrimônio cultural da região, ao mesmo tempo em que forma novos sanfoneiros para manter a prática do instrumento

A sanfona está na memória afetiva de todo nordestino. O som singular do instrumento, imortalizado na cultura popular por meio da obra de artistas como Luiz Gonzaga e Dominguinhos, ecoa em músicas tradicionais que se confundem com a própria história do sertanejo e emociona com uma melodia que provoca sorrisos e lágrimas. Em 2011, com o intuito de valorizar o instrumento e formar novos sanfoneiros, nasceu na Paraíba a Orquestra Sanfônica Balaio Nordeste. Um grupo que coloca o sanfoneiro no centro do palco, misturando o cancioneiro nordestino ao refinamento dos estudos acadêmicos. 

“A ideia era justamente dar protagonismo à sanfona, que é um instrumento extremamente rico, completamente integrado à nossa cultura, mas que é, às vezes, preterido em relação a outros instrumentos clássicos e tradicionais vistos em orquestras europeias”, lembra o maestro pernambucano Lucílio Souza. Natural de Timbaúba e formado em regência no Recife, ele foi escalado como capitão do projeto que nascera na Associação Balaio Nordeste, organização paraibana com sede em João Pessoa, que promove e incentiva a cultura popular. 

Com o apoio da associação e o entusiasmo de Souza, a orquestra ganhou apoio vindo de vários lugares. “A gente reuniu vários sanfoneiros, músicos que aprenderam vendo outras pessoas tocar e acadêmicos que estudavam música na universidade. A nossa ideia sempre foi mostrar uma música bem feita, queríamos fazer apresentações em salas de concerto e, por isso, também buscamos dar aulas de música para os sanfoneiros que já sabiam tocar, mas que precisavam da técnica e da compreensão de partituras”, explicou. 

Com nove anos de existência, hoje, a orquestra acumula no currículo participações em shows no Brasil e no exterior. Em 2015, o grupo se apresentou pela primeira vez no festival francês de acordeom “Le Printemps des Bretelles”. “Gostaram tanto da nossa música que nos convidaram imediatamente para retornar no ano seguinte, como convidados de honra”, lembra Lucílio, emocionado. Em 2017, a orquestra se apresentou no festival FestiFolcor, no Peru. Os músicos também já tocaram no São João de Campina Grande, de João Pessoa, em festas juninas no interior da Bahia e de Alagoas, no festival cênico Janeiro de Grandes Espetáculos, no Recife, e no programa Encontro com Fátima Bernardes, da TV Globo. 

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A Orquestra já ganhou o mundo levando o som da sanfona, e outros instrumentos, em apresentações no exterior. Foto: Mingareli Comunicação

“Somos muito felizes em poder mostrar que a cultura nordestina tem um valor enorme, que a sanfona tem uma melodia linda. Também temos um papel relevante na formação de novos sanfoneiros, damos aulas gratuitas a crianças a partir dos oito anos de idade e, no próximo ano, vamos lançar a versão infanto-juvenil da orquestra”, antecipa o maestro. 

Com 15 músicos, a orquestra tem 10 sanfoneiros, dois flautistas, alguns percussionistas e um contrabaixista. “Todas as músicas e arranjos são pensados em torno da sanfona. Os demais instrumentos vêm para complementar o som do acordeom”, explica Lucílio. 

Sotaque francês 

Entre os músicos, uma mulher com coração no Brasil, mas sotaque francês. Marie Claire, de 59 anos, é pianista e formada em acordeom clássico na França. “Me apaixonei pelo Brasil e vim morar aqui há mais de 20 anos. Confesso que, quando morava na França, sentia vergonha do acordeom. Meu pai amava o instrumento e me obrigou a aprender. Quando cheguei aqui, me senti muito prestigiada. Aqui, vocês tratam o acordeom com muito respeito e isso é muito bonito. É um instrumento polivalente e eu me sinto muito feliz de poder participar da orquestra. Fico emocionada ao ver a felicidade dos brasileiros em torno deste instrumento”, conta. 

Aos 25 anos de idade, Geraldo Figueiredo é um jovem sanfoneiro que também ama fazer parte da orquestra. “Desde pequeno, tive um contato grande com o forró. Meus familiares sempre chamavam algum trio pé-de-serra para as festas. Depois, vi a sanfona com um colega e fiquei pensando: ‘Preciso aprender esse instrumento’. Fui apresentado à orquestra por um professor da faculdade e me encantei pelo grupo. A orquestra permite que o músico vá além, muda muito a visão do sanfoneiro. Escrever uma música para o acordeom é diferente. Você consegue expandir a mente do músico para algo totalmente diferente”, avalia Figueiredo, que tem entre suas músicas favoritas “Lamento Sertanejo”, de Dominguinhos e Gilberto Gil. No repertório da orquestra, não faltam outras canções como “Lembrança de um Beijo” (Acioly Neto), “É Proibido Cochilar” (Antônio Barros e Cecéu) e “Feira de Mangaio” (Sivuca).

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Silvério Pessoa (centro) já se apresentou com a orquestra e destaca a importância da preservação da cultura popular. Foto: Mingareli Comunicação

O cantor Silvério Pessoa, que já tocou com a orquestra (foto acima), analisa que o grupo contribui para a preservação da cultura popular. “A música nordestina necessita constantemente de continuidade, de renovação, de hereditariedade. A orquestra tem um DNA valiosíssimo, que é uma nova geração executando instrumentos tradicionais, principalmente o acordeom, além de ser uma instituição de multiplicação de sabores. A interpretação de clássicos de Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Sivuca, mas executados de uma forma contemporânea, é de um valor ultranecessário para a música brasileira atualmente”, avalia o pernambucano. 

A cantora Irah Caldeira também já se apresentou com o grupo. “Tive a alegria de participar da gravação do primeiro DVD da Orquestra Sanfônica Balaio Nordeste e fiquei maravilhada. O grupo é composto por músicos muito talentosos e criativos. Me chamou a atenção a forma com que eles interpretam o forró. Eles respeitam a história, a cultura e as nossas tradições de uma forma muito contemporânea”, pontua. 

O sonho do maestro Lucílio Souza é perpetuar a cultura da sanfona no Nordeste. “O que queremos é ter mais espaço. Na prática, contamos as emoções, alegrias, saudades e amores do povo nordestino e isso é muito valioso. Torço para que possamos formar cada vez mais sanfoneiros e que essa música possa ser ainda mais valorizada, frequentando mais e mais palcos Brasil afora”, conclui o maestro.

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