Megalomanias

Checamos: Tapacurá pode estourar?

Fomos apurar esta que é uma das mais antigas estórias pernambucanas. Será possível que um evento de fortes chuvas seja capaz de estourar a barragem?

Débora Oliveira
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Débora Oliveira
Publicado em 01/12/2020 às 8:51 | Atualizado em 10/12/2020 às 15:14
Foto: Rodrigo Lôbo/ Acervo JC Imagem
O complexo de Tapacurá está é composto por três barragens: duas de terra e uma de concreto (principal), com capacidade máxima de 104 milhões de metros cúbicos - FOTO: Foto: Rodrigo Lôbo/ Acervo JC Imagem

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Matéria produzida pelo projeto Confere.ai em parceria com o Jornal do Commercio. - confere.ai

Em agosto, o boato de Tapacurá completou 45 anos. O termo “fake news” nem era pauta quando correu pelo Recife o aviso “A barragem estourou! Tapacurá estourou!”. As chuvas que inundaram a cidade em 1975 foram o cenário perfeito para enganar muitas pessoas. No ano passado, o JC contou algumas histórias de quem viveu o episódio. O cenário era de caos.

Em 2011, novas enchentes ressuscitaram o boato, no que ficou conhecido como o boato Tapacurá 2.0. Mas a barragem nunca estourou, e o Recife não deixou de ter cheias. Por isso, fomos apurar esta que é uma das mais antigas estórias pernambucanas. Será possível que um evento de fortes chuvas seja capaz de estourar a barragem?

Como checamos

O complexo de Tapacurá está localizado em São Lourenço da Mata e é composto por três barragens: duas de terra e uma de concreto (principal), com capacidade máxima de 104 milhões de metros cúbicos, segundo relatório da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa). Além disso, o equipamento compõe um sistema do qual fazem parte também a barragem Duas Unas e captações diretas no Rio Capibaribe.

Para entender como funciona seu sistema de segurança, entramos em contato com a Compesa. A companhia informou que Tapacurá possui um estrutura responsável pelo controle de vazão da água, chamada vertedouro ou sangradouro. Por meio dela, a liberação da água é feita de forma gradativa no leito do Capibaribe, caso a barragem exceda o seu limite de capacidade.

Também consultamos o professor e presidente da Academia Pernambucana de Engenharia, Mário Antonino, para entender como esse equipamento garante que a barragem não estoure em casos de enchentes. “A segurança de uma barragem depende, primeiro, de seu projeto de engenharia”, explica. “Toda ela necessita de um vertedouro, ou seja, um recorte abaixo da altura máxima da parede da barragem. Com ele, você permite que o excesso d'água corra sem danificar a parede, em caso de chuvas fortes.”

Digamos, por exemplo, que uma cheia torne o vertedouro insuficiente. Nesse caso, em Tapacurá há uma proteção adicional denominada “dique fusível”. “Esse dispositivo funciona como um fusível em uma rede elétrica: quando a carga é muito elevada, ele entra em curto-circuito, pipoca e aquela corrente não caminha mais. Com o dique fusível é semelhante, a partir de uma certa cota de pressão da água na parede da barragem, um ponto dela é rompido para que o excesso escoe mais rápido. É um tipo de segurança a mais”, explica o professor.

As variáveis

As condições do solo, o material e altura da parede de uma barragem também influenciam na sua capacidade de contenção da água. “Em uma barragem de concreto [como a principal de Tapacurá], os problemas são mais difíceis, mas podem existir. Se ela for mal construída e der lugar à presença de orifícios, a água vai levando os grãos, o diâmetro do furo aumenta e pode chegar um momento em que há o colapso. Por isso, cada barragem requer um estudo isolado quanto à base onde ela vai ser firmada e ao material utilizado, dependendo da quantidade de água a ser estocada. Tudo isso o engenheiro vai estudar.”

O boato de 1975

Foto: Arquivo do IML
Um dos mais clássicos boatos pernambucanos completou 45 anos em 2020 - Foto: Arquivo do IML

“Eu era um jovem engenheiro na época e tinha meu escritório na estrada dos remédios. Foi um pânico no Recife, naquela área. Era um boato muito sério. Ali perto do Sport estava tudo inundado, boiavam móveis, pianos velhos. E não foi estouro de Tapacurá, era cheia mesmo, por que o sistema não estava nem construído ainda”, narra o professor Mário.

O sistema Tapacurá só ficou completo em 1982. Após 1975, foi constatada a necessidade de outros barramentos para evitar as cheias do Capibaribe. Foram construídas as Barragens do Carpina e do Goitá. Foi quando Tapacurá passou a ter um papel secundário na contenção de enchentes.

“Para uma barragem do tamanho de Tapacurá estourar, é preciso um evento fora do normal. Eu conheci pessoalmente os colegas que atuaram no projeto dela. A estrutura foi construída com toda seriedade. Mas qualquer peça de engenharia pode sofrer um desgaste e algum problema novo pode surgir. Por isso, é essencial que ela tenha uma boa manutenção. Muitas obras públicas são deixadas ao relento como se o tempo consertasse”, explica Mário.

A Compesa informou que realiza inspeções anuais nas barragens que administra a fim de analisar as condições de segurança, operação e estado de conservação dos equipamentos.

Confere.ai

E com essa chegamos ao fim da nossa série sobre as megalomanias pernambucanas. Para evitar cair em desinformação e não compartilhar boatos e mentiras é preciso checar. Em poucos passos isso pode ser feito, utilizando o Confere.ai. Primeira ferramenta automática de checagem de notícias produzida no Nordeste, o Confere.ai é uma parceria do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação, da startup Verific.ai e de pesquisadores da Universidade Católica de Pernambuco. Ficou em dúvida com a informação que recebeu? Basta copiar o link ou texto que deseja checar, ir em www.confere.ai, colar e clicar em ‘Conferir’. O Confere.ai possui um medidor que irá informar o nível de características de uma desinformação presentes na notícia apresentada.

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