Variante delta da covid-19 preocupa especialistas por causa do ritmo de vacinação no Brasil
Virologista explica que muito do que se sabe sobre a delta vem de países que estavam em uma situação epidemiológica controlada, com um percentual alto de pessoas vacinadas com as duas doses ou dose única, diferente do atual cenário brasileiro
A circulação da variante Delta da covid-19 tem preocupado especialistas. Vários estudos concluíram que a eficácia das vacinas diminui com a cepa, que é originária da Índia e altamente transmissível. Uma pesquisa feita pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos e publicada nessa terça-feira (24), por exemplo, mostra que a efetividade dos imunizantes fabricados pelos laboratórios Pfizer e Moderna caiu de 91% para 66% depois que Delta se tornou dominante. Isto reforça, ainda segundo os pesquisadores, a necessidade da ampliação da vacinação da população de forma mais célere.
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Milhares de trabalhadores em seis estados norte-americanos foram avaliados semanalmente e no começo dos sintomas de covid-19, o que permitiu aos pesquisadores estimar a eficácia contra infecções sintomáticas e assintomáticas. Ao observar a taxa de infecções entre pessoas vacinadas e não vacinadas e o período de tempo em que foram monitoradas, a efetividade da vacina foi estimada em 91% no período de estudo inicial, de 14 de dezembro de 2020 a 10 de abril de 2021. Mas, durante as semanas anteriores a 14 de agosto, quando a Delta se tornou dominante, a efetividade caiu para 66%.
Os autores do estudo alertaram para uma série de reservas nestes resultados, entre elas que a proteção das vacinas poderia estar diminuindo com o passar do tempo de qualquer forma e que a estimativa de 66% se baseou em um período de estudo relativamente curto, com poucas infecções. "Embora estas descobertas provisórias sugiram uma redução moderada na efetividade das vacinas para prevenir a infecção da covid-19, a redução sustentada de dois terços no risco de infecção ressalta a importância e os benefícios contínuos da vacina", explicaram.
O virologista Marcelo Paiva, do Departamento de Entomologia do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, unidade da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco, e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), conversou com o JC e explicou que, no Brasil, muito do que se sabe sobre a Delta vem de países que estavam em uma situação epidemiológica controlada, com um percentual alto de pessoas vacinadas com as duas doses ou dose única, diferente do atual cenário brasileiro. Por isso, o estrago do espalhamento desta nova cepa pode ser ainda mais intenso no território nacional.
"Quando houve a introdução em Israel ou nos Estados Unidos, foi exposto que, apesar da avançada vacinação, existia uma parcela significativa da população que não tinha se vacinado por completo. Por ela ser muito mais transmissível, mostrou essa situação muito às claras. Nesses países, existe uma quantidade bem maior de pessoas não vacinadas desenvolvendo casos graves do que de vacinadas", explicou o professor.
O epidemiologista Rafael Moreira, da Fiocruz, destacou que um fator muito preocupante da variante Delta são os sintomas, que podem ser confundidos com os de uma gripe comum. "Muitas pessoas podem considerar que é um resfriado, já que nem sempre causa perda de paladar ou de olfato, e não se isolar, não realizar o teste, não se preocupar com o distanciamento social e os demais cuidados, o que pode acabar favorecendo a disseminação pelo fato dela ser muito transmissível", disse.
Alerta da Fiocruz
Dados divulgados nesta quarta-feira (25) no Boletim do Observatório Covid-19, da Fiocruz, informam que o cenário de queda de hospitalizações e óbitos se mantém na pandemia, mas indicam que a variante Delta deve ser acompanhada com atenção. Para os pesquisadores da Fiocruz, o progresso na vacinação tem sido lento, com média de cerca de 1 milhão de doses por dia, enquanto a capacidade de distribuição e aplicação de doses do Sistema Único de Saúde (SUS) é de 2 milhões.
"Embora as vacinas venham claramente contribuindo para a redução de casos graves, internações e óbitos no País como um todo, o surgimento e crescimento da presença de novas variantes de preocupação, como a Delta, deve manter em alerta os serviços de vigilância em saúde, com amplo uso de testes, detecção de casos, isolamento e quarentena", diz o boletim, que reforça a necessidade de continuar com medidas como uso de máscara e distanciamento físico mesmo entre vacinados e especialmente no contato com pessoas com maior risco de agravamento da doença.
Segundo o levantamento, a incidência diária de novas mortes por covid-19 no país teve queda de 1,5% ao dia na última semana e chegou a 770 vítimas diárias, o menor patamar desde o início de 2021.
Já a tendência de casos confirmados da doença por dia subiu, após quatro semanas seguidas com redução média de 1% ao dia. Nos últimos sete dias, houve aumento diário de 0,6% no registro de novos casos confirmados, que oscilam no patamar de 30 mil novos diagnósticos por dia, o que os pesquisadores consideram preocupante.
"A oscilação no número de casos diários reflete, em certa medida, um ambiente que tem sido propício para a transmissão da doença, na retomada de muitas atividades, envolvendo a circulação de pessoas, o uso de transporte público, o trabalho e o lazer", afirmam os pesquisadores. "A circulação de novas variantes do vírus tem causado infecções, mas não necessariamente um aumento no número de casos graves na mesma proporção, devido à proteção já adquirida pelos diferentes grupos populacionais vacinados".
A assistente de marketing, Bruna Juliana, de 22 anos, que já foi imunizada com as duas doses da vacina da AstraZeneca, disse estar preocupada e com medo da variante prolongar ainda mais o período de restrições. "Eu já não aguento mais. Desde 2020 que a gente está nesta onda de covid-19, e agora, com a vacina, tomando a primeira e segunda dose. Quando você acha que está tudo melhorando, vem a nova variante", disse.