ORLA DE OLINDA

Bairro Novo: intervenções não atuam em avanço do mar e oferecem risco à população

Pesquisadores constataram que parte das intervenções de contenção do avanço do mar estão contribuindo com a erosão e correm risco de desmoronar

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Publicado em 04/04/2019 às 7:30
Foto: Bianca Sousa/ JC Imagem
Pesquisadores constataram que parte das intervenções de contenção do avanço do mar estão contribuindo com a erosão e correm risco de desmoronar - FOTO: Foto: Bianca Sousa/ JC Imagem
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Quem vive em Olinda, mais especificamente nas imediações do Bairro Novo, tem à disposição uma orla inteira para curtir. Seja de dia ou à noite, os espigões, que lembram cais, convidam quem passa pelo local para dar uma espiada no mar. No entanto, estas estruturas, que deveriam atuar como agentes reconstrutores da faixa da praia, há tempos deixaram de cumprir sua função e preocupam pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Apesar de bonita, com o avanço do mar, a praia deixou de ter faixa de areia e a profundidade da água inviabiliza o banho. A erosão também compromete os espigões, que, segundo os pesquisadores, podem ceder a qualquer momento.

Desde a ampliação do Porto do Recife, Olinda sofre com o constante avanço do mar. Nos anos 50, foram implementadas intervenções para tentar conter essas mudanças e reconstruir a faixa de areia. Mas, desde 2011, pesquisas realizadas pela UFPE constataram que parte dessas intervenções não só não realizam mais suas funções, como também oferecem riscos à população e à configuração da costa.

“A função do espigão é segurar a areia que é trazida pelas correntes marítimas e recompor a praia, só que a quantidade de sedimentos transportada por elas não é suficiente. Como recebem constante agressão do mar, as pedras que o compõem vão caindo e ele vai se deteriorando. Agora, ele está intensificando a erosão da praia e expulsando os sedimentos da plataforma continental, que é essa faixa do mar que está em contato direto com o continente”, explica o engenheiro civil e doutor em geociências Luis Augusto de Gois.

Como também influenciou nas correntes, os espigões tem feito com que parte da areia da praia seja transportada para uma área mais distante do mar, onde está se formando uma pequena ilha. Segundo Luis Augusto, por dia, Olinda chega a perder o equivalente a 11 caminhões de grãos de sedimentos. Na área central do Bairro Novo, por exemplo, já não há mais faixa de areia e o mar varia de 1,60 m até 3 m abaixo do nível médio do mar. Enquanto outras áreas, pode variar de 2,5 a 3 m acima do nível do mar.

Movimento caiu

Isso afeta diretamente a relação dos usuário com o espaço, que vem perdendo cada vez mais seu atrativo. Quem sente isso de perto é o vendedor de caldo de cana Luiz Sebastião da Fonseca, 68 anos. Ele frequenta a praia desde os anos 80 e em 2011 começou a vender a bebida em uma carrocinha na orla. “Há 20 anos isso aqui era lotado. Era melhor para banho, para o pessoal brincar… Não vem quase ninguém. De 2015 para cá é que caiu o movimento mesmo. Acho que as pessoas só vão voltar se colocarem mais areia para voltar a ter praia”, diz.

O coordenador administrativo Antônio Batista, de 59 anos, pesca nas horas de lazer e conhece bem a realidade da praia do Bairro Novo. Segundo ele, a praia perdeu quase que completamente seu aspecto de anos atrás. “Quando a gente lembra de como era essa área antigamente, percebe que hoje está totalmente diferente. A faixa de areia era extensa e abrigava muitos bares e barracas”, lembra.

Além das alterações ambientais, os pesquisadores também alertam para a possibilidade de desmoronamento dos espigões. “É um risco grande, porque não sabemos o que está ocorrendo dentro destas estruturas. Já vimos várias vezes elas cederem. Aparecem buracos onde cabia um carro. Um dia, pode ser que o desgaste seja maior e aconteça um acidente, já que é uma área de fluxo constante de pessoas”, explica.

Outra intervenção que segue ao longo da costa são os enrocamentos aderentes, que funcionam como um paredão de pedras que evita um avanço maior do mar. Estes, por sua vez, cumprem sua função e não oferecem riscos. Para o caso dos espigões - 31 ao longo da orla de Olinda - a recomendação dos pesquisadores seria a retirada. “Em 2005 fizemos a remoção de um deles e notamos que a praia se recompôs naturalmente, que é nosso intuito. Claro que esta não é uma solução fácil ou rápida, mas a retirada gradativa pode fazer com que a praia do Bairro Novo se recomponha com o aumento do nível do mar e a reconstrução da faixa de areia”, registra Luis Augusto.

Durante a visita da reportagem do Jornal do Commercio ao local, nessa quarta-feira (3), alguns reparos estavam sendo feitos no piso dos espigões. Segundo o secretário de Obras de Olinda, Roberto Rocha, a manutenção é feita sempre que a estrutura sofre impactos do mar. No entanto, ele descartou a possibilidade de desmoronamento e assegurou que parte deles está cumprindo a função de retenção de segmentos. “Aqueles espigões têm muitos anos e dois deles hoje apresentam uma grande retenção de areia. Como é uma estrutura que sofre muito impacto do mar, é normal que haja desgaste. Mas, a manutenção é feita sempre que necessário. Riscos de danos maiores só se acontecesse algum fenômeno excepcional no mar, como uma ressaca muito forte”, explica. De acordo com o secretário, em 2016 houve uma reorganização das pedras dos espigões. A medida deve se repetir até o final do ano.

Interferência humana

Olinda é a cidade pernambucana que mais tem sofrido com o avanço do mar e a única que usa os espigões como ferramenta de contenção. No caso do Bairro Novo, a causa é a ampliação do Porto do Recife mas outros aspectos, segundo Luis Augusto, também podem influenciar no recuo da linha da costa, como aconteceu em outras praias do Estado. “A interferência direta do homem no ambiente costeiro é a principal parcela. Isso envolve ocupações desordenadas, construção de barragens, exploração de areia para construção civil… Sem contar a interferência indireta, como no caso do aquecimento global”, frisa.

 

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