CRÉDITO

Endividamento no consignado cresce; saiba como se proteger

Somente em 2019, o endividamento de servidores públicos, trabalhadores do setor privado e aposentados ou pensionistas do INSS com esse tipo de empréstimo cresceu 15%

Lucas Moraes
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Lucas Moraes
Publicado em 05/02/2020 às 18:35
Foto ilustrativa: Daniel Isaia/Agência Brasil
No Brasil, 80% dos trabalhadores do setor privado ganha até R$ 3 mil, enquanto no setor público a média é quase o dobro do privado - FOTO: Foto ilustrativa: Daniel Isaia/Agência Brasil
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À primeira vista, o empréstimo consignado é de encher os olhos. Para os bancos, inadimplência contida e menos risco de calotes; aos clientes, juros menores e, na teoria, até 30% do salário na conta ou um cartão de crédito disponível para gastar. Nesse cenário, onde parece que todo mundo ganha, há uma série de riscos e abusos que estão entrando na mira do Banco Central e do governo federal, sobretudo no caso dos beneficiários do INSS, que chegam a ser assediados antes mesmo de passar a receber o benefício.

Somente em 2019, o endividamento de servidores públicos, trabalhadores do setor privado e aposentados ou pensionistas do INSS com esse tipo de empréstimo cresceu 15%, saltando de R$ 333,2 bilhões para R$ 383,7 bilhões. Em resultados isolados, os servidores públicos tiveram a maior alta (17,8%), seguidos pelo trabalhadores do setor privado (17,4%) e os aposentados e pensionistas do INSS (10,7%).

Embora o percentual de endividamento tenha crescido menos entre os beneficiários do INSS, essa categoria é a mais assediada pelos bancos para contratação. “A modalidade é muita oferecida, com uma abordagem massiva, sobretudo com os aposentados. Tem se tentado criar mecanismo para diminuir isso. Na maioria dos casos, o que acaba acontecendo é que esse crédito beneficia quem está contratando, porque os idoso, bem intencionados contratam para ajudar filhos, amigos e parentes”, diz o personal financeiro, Leandro Trajano.

Como forma de atrair os clientes, os juros do consignado são mais baixos que os praticados em outras modalidades de recursos livres. Porém, mesmo assim, as taxas ainda estão longe das medianas de corte da taxa básica de juros. Para os servidores públicos, as taxas de juros ao ano fecharam em 18,2% em 2019. Os trabalhadores do setor privado pagaram taxas na casa dos 32%, enquanto os beneficiários do INSS, 22,2% - deixando a média geral em 20,5%. Em relação ao mês de dezembro de 2018, as taxas caíram, respectivamente, 4%; 4,4% e 3,1%.

A explicação para as taxas mais baixas vem justamente da forma de pagamento: o desconto em folha. Com mais garantia do recebimento, os bancos cobram menos pelo crédito e mantém uma taxa de inadimplência que vai de 1,9% (servidores) a 4% (trabalhadores setor privado) e 2,6% (beneficiários INSS).

“Empréstimo consignado pode ser perigoso no sentido de que aquilo é debitado direto no seu recebimento, deixando o cliente sem acesso àquela fatia que se comprometeu. Isso pode ser cruel, nos sentido de que quem pegou empréstimo de 60 meses só terá parte do salário de volta quando quitar. Num empréstimo pessoal, por exemplo, você vai ter acesso a juros mais altos, mas se viver uma situação extrema e precisar priorizar alguma outra questão, você tem como não pagar ou renegociar a dívida”, reforça Trajano.

(A matéria continua após a arte)

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No ano passado, um grupo de trabalho interministerial foi criado, com a participação dos ministérios da Justiça e da Economia, da Dataprev, do INSS e do BC, para discutir propostas para aperfeiçoar o crédito consignado. Uma auditoria foi contratada para descobrir de onde vazam os dados dos segurados do INSS que vão se aposentar, justamente para evitar o “ataque” a eles na busca pela contratação.

Outro caminho para dar mais transparência à oferta de crédito consignado e combater o assédio comercial e as más práticas está em vigor desde janeiro deste ano. Uma autorregulação específica sobre o assunto foi criada pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) em parceria com a Associação Brasileira de Bancos (ABBC). Trinta e um bancos aderiram às novas regras. Juntos, eles representam 98% da carteira de crédito consignado do País.

De acordo com o diretor de autorregulação da Febraban, Amaury Oliva, o objetivo da autorregulação do crédito consignado é “aumentar a proteção dos consumidores e aperfeiçoar a oferta de crédito consignado”. “É uma importante modalidade de crédito e ferramenta de inclusão financeira, com custos mais reduzidos em relação a outras linhas de crédito”, diz.

Como resultado, foi criado um sistema nos moldes do “Não Perturbe”, já usado por órgãos de defesa do consumidor, voltado para a oferta de crédito consignado. Somente entre os dias 2 e 26 de janeiro, 240.748 pessoas se cadastraram no site “Não Perturbe” em todo o País. Desses, 6,8 mil eram Pernambucanos, 3,11% do total. Uma vez realizado o cadastro do telefone fixo ou móvel no “Não Perturbe”, tanto os bancos quanto os correspondentes por eles contratados não poderão fazer qualquer oferta de operação de crédito consignado, 30 dias após a inclusão neste sistema.

Ao Estadão/Broadcast, o secretário Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça, Luciano Timm, disse que vai intensificar a fiscalização das regras de autorregulação acordadas com a Febraban. Segundo ele, a concessão irregular de empréstimo consignado a aposentados é um dos fatores que potencializa o superendividamento dos idosos no Brasil. Um acordo já foi assinado entre o Ministério da Justiça e o INSS para ampliar a fiscalização dos abusos.

PORTABILIDADE

Outra medida da nova autorregulação para coibir o assédio na oferta diz respeito à portabilidade de operações de crédito consignado. Agora, as instituições financeiras não remunerarão mais correspondentes pela portabilidade da operação de crédito consignado ou pelo refinanciamento dela antes de 360 dias, contados da data do negócio. Antes da entrada em vigor da Autorregulação, o correspondente era remunerado a cada operação portada, independentemente do prazo.

Para a Febraban e a ABBC, a medida é importante para evitar o rodízio desses contratos nas instituições financeiras, ação que muitas vezes levava à extensão dos acordos, trazendo consequências desfavoráveis ao cliente. O novo sistema também prevê que os bancos deverão enviar aos consumidores, em até 5 dias contados da data de liberação do crédito ao cliente, informação mínimas da operação como identificação da instituição financeira contratante; data e número do contrato; canais de relacionamento da instituição financeira; valor do empréstimo contratado pelo consumidor; e quantidade e valor de parcelas.

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