UFRB

Bolsonaro nomeia petista para reitor de universidade federal na Bahia

O nomeado chegou a ser vereador pelo PT de Amargosa (BA) entre 2005 e 2008

Do jornal Correio para a Rede Nordeste
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Publicado em 08/08/2019 às 9:47
Foto: Luis Fortes/MEC
O nomeado chegou a ser vereador pelo PT de Amargosa (BA) entre 2005 e 2008 - FOTO: Foto: Luis Fortes/MEC
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O presidente Jair Bolsonaro (PSL) escolheu um professor filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), ao qual o presidente já se referiu como quadrilha, para ser o novo reitor da Universidade Federal do Recôncavo (UFRB). Fábio Josué dos Santos, 43 anos, foi o menos votado entre os que compunham a lista tríplice para a ocupação do cargo enviada ao Ministério da Educação (MEC) e recebeu com surpresa a nomeação. Ele tomou posse na segunda-feira (5), em Brasília.

Fábio, que foi vereador pelo PT de Amargosa (BA) entre 2005 e 2008, conta que não sabe se o presidente conhece sua filiação. "Sim, sou filiado ao PT, agora se ele sabia ou não, eu realmente não sei", disse. O professor já iniciou as 'apresentações' à comunidade acadêmica na condição de reitor - título que, em suas próprias palavras, esperava ser recebido pela então vice-reitora Georgina Gonçalves, líder da votação, com 17 votos.

Ao jornal Correio, o novo reitor, que integra o quadro docente da universidade há 11 anos, comentou que não sabe por que foi escolhido - o presidente tem autonomia, amparado pela legislação, para escolher qualquer um entre os três nomes. A decisão não considerou a maioria dos membros do Conselho Superior da instituição (Consuni), circunstância inédita na instituição. Em consulta interna, apenas três votos foram atribuídos a Fábio. À frente dele havia, ainda, a professora Tatiana Velloso, com cinco votos. 

"É a primeira vez que o cargo é ocupado pelo terceiro nome da lista tríplice. Mas a legislação diz que o presidente tem livre escolha e não precisa se justificar. Fiquei surpreso quando recebi a notícia, sabia que havia uma expectativa da comunidade acadêmica pela professora Georgina, que teve a maioria dos votos", relata, ao explicar que o Consuni é composto por 26 pessoas, entre reitor, vice-reitor, diretores de centros, pró-reitores, presidentes de câmaras, além de representantes de estudantes e servidores.

Único homem a compor a lista de indicados, enviada ao MEC no mês de março, Fábio foi questionado sobre a possibilidade da escolha do presidente estar relacionada a uma questão de gênero. De modo direto, o reitor respondeu que não tem "uma ideia específica do que motivou a decisão" de Bolsonaro, a quem reiterou a garantia de constitucionalidade.

Como não encontrou com o presidente na cerimônia de posse, realizada pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, Fábio não teve a oportunidade de conhecer as motivações da escolha. 

'Imoralidade e autoritarismo'

Uma carta aberta assinada por dez professores da instituição, direcionada aos servidores da universidade, incluindo o novo reitor, na madrugada desta quarta-feira, se refere à escolha do presidente como "uma agressão autoritária e preconceituosa à autonomia universitária". O documento, disparado para os e-mails de todos os servidores da UFRB, no entanto, classifica o reitor eleito como "um colega de alta estima e de honrada trajetória acadêmica, profissional e intelectual". 

À reportagem, um dos autores da carta aberta, o professor de Sociologia e Ciências Sociais, Bruno Durães, explicou que a intenção do documento é "externar a agressão sofrida pelo Consuni, que não teve a opinião da maioria respeitada" pelo residente da República.

"O Conselho Superior sofreu um ataque, porque seria a primeira colocada, Georgina, a pessoa que deveria assumir a reitoria, mas não foi. Por qual razão ele escolheu o último? Gênero? Racismo? ", indaga, ao reiterar que a professora liderou as indicações na consulta realizada entre os membros da academia. 

Em nota pública, A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior (Andifes), sob a representação do presidente, o reitor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), João Carlos Salles, também defendeu que os mais votados é que devem assumir os cargos máximos nas reitorias das universidades.

Georgina assumiu o posto maior da universidade entre os dias 15 e 30 de julho, após o fim do mandato do ex-reitor, Silvio Luiz Soglia. Caso fosse nomeada, a professora seria a primeira mulher negra no cargo de reitora da universidade, fundada há 13 anos, com sede no município de Cruz das Almas. Em um dos primeiros trechos do documento, os docentes comentam sobre o impedimento de "uma mulher negra ser nomeada para uma função para a qual foi eleita pela Comunidade Universitária, de forma democrática e legítima". 

"Esse impedimento não atingiu, portanto, apenas a professora Georgina Gonçalves, mas sim toda a Universidade e todo o projeto de construção da UFRB, nos quase 15 anos de sua existência. É uma decisão eivada de imoralidade, violência simbólica e autoritarismo (...) Foi uma atitude intervencionista. Isso precisa ser denunciado e dito com todas as letras, mesmo sendo uma decisão marcada pela legalidade", continua o conteúdo, em referência à constitucionalidade da nomeação.  

Por fim, a carta reproduz texto público da própria Georgina, publicado no Facebook, que diz: "Não podemos ser ligeiros ou precipitados nessa análise, mas sim, investirmos todo nosso esforço de compreensão para entender o que aconteceu. Racismo? Homofobia? Misoginia? Nenhuma ingenuidade nos será perdoada”.

Ao Correio, Fábio afirmou não ter conhecimento do conteúdo e circulação do manifesto dos colegas. Informou que uma agenda de compromissos já foi iniciada e que, a partir do próximo dia 19, início do período letivo, vai visitar os centros que compõem a UFRB, distribuídos em seis municípios, com a intenção de "dialogar e ouvir as demandas de todas as unidades, na perspectiva de construir". 

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