Consórcio Nordeste, assumido por Paulo Câmara, custa R$ 10 milhões ao ano e entrega muito pouco de resultado
O ajuntamento de governadores, conhecido como Consórcio Nordeste, que se evidenciou após duas operações frustradas na pandemia, tem folha de pessoal com salários que chegam a quase R$ 20 mil.
Para falar do Consórcio Nordeste, é importante lembrar algumas noções básicas das aulas de química sobre substâncias ácidas e alcalinas. É que nem tudo o que se junta dentro de um mesmo recipiente produz um resultado bom. Às vezes não produz resultado nenhum.
Por exemplo, se você misturar água sanitária com álcool, vai produzir clorofórmio e ácido muriático. É algo que pode prejudicar o sistema nervoso os pulmões e os rins, entre outros órgãos, em contato com humanos. Já se você mistura vinagre com bicarbonato de sódio, vai produzir uma substância que não serve pra muita coisa, talvez apenas como desengordurante. Um composto é extremamente alcalino e o outro é muito ácido. Eles se anulam completamente.
O que tem a ver com o Consórcio Nordeste? Chegaremos lá.
Custa dinheiro
É importante saber que o grupo é formado por governadores de nove estados da região e não sai de graça, é caro. O orçamento do consórcio é de R$ 10 milhões por ano.
É feito um rateio e todos os membros pagam uma parte. Quem pode pagar mais, paga mais.
Pernambuco gastou com a manutenção do consórcio, em 2021, R$ 1,4 milhão.
Nesta terça-feira (18), o governador do estado, Paulo Câmara (PSB), assumiu a presidência. É o terceiro, no rodízio que já teve o chefe do Executivo da Bahia e depois o do Piauí. Como gestor principal, Câmara vai administrar o dinheiro que os estados colocam na estrutura e garantir o pagamento dos funcionários.
Hoje, são oito servidores que recebem seus salários pelo consórcio. Um deles ganha R$ 19,5 mil, brutos, todo mês. Outros cinco recebem R$ 17,5 mil e dois tem R$ 15,5 mil registrados, cada um, no contracheque.
Não é só isso, há gastos com viagens também. É preciso viajar muito. Em 2021, foram 60 viagens dos funcionários entre os estados do Nordeste e também para Brasília. Um dos períodos, registrados no portal da Transparência do Consórcio inclui uma viagem que começou em Salvador, passou por São Luiz, Fortaleza, Recife e voltou para a capital baiana. O fato de a sede ser itinerante atrapalha.
No ano passado se gastou com passagens aéreas e diárias algo próximo a R$ 160 mil. Fazer com que os governadores se reúnam também é uma dificuldade e isso obriga os funcionários a viajarem muito. Em 2021, só houve três reuniões ordinárias. Ao menos são as que estão registradas no site.
Em uma delas, o então gestor, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), propôs que a sede deixasse de ser itinerante e passasse a funcionar em Brasília. Foi acatado.
O curioso é que isso aconteceu na terceira e última reunião ordinária do ano passado, em 30 de novembro. Mas, o consórcio já tem um imóvel alugado na capital federal desde 2019. Na época, inclusive, o valor foi motivo de polêmica, principalmente na Bahia, porque o gestor era o governador de lá, Rui Costa (PT).
A sala, com 340 m², no Setor de Autarquias Sul de Brasília, foi alugada em novembro de 2019 por R$ 38 mil ao mês, num contrato de 60 meses, o que dá um valor maior que R$ 2,2 milhões. Muito alto.
Importante dizer que, em julho de 2021, o Consórcio negociou e conseguiu reduzir o valor do aluguel até novembro do ano passado. Ficou por R$ 32 mil. O que quase não impacta no valor final.
O caro e o barato
Todos esses custos, comparando com estruturas públicas gigantescas pelas quais o contribuinte brasileiro sua todos os dias para manter, pode parecer pouca coisa. Porém, dizer que é muito ou pouco dinheiro depende do resultado alcançado.
Um cachorro-quente por R$ 0,50 é barato. Um cachorro-quente, gelado, num pão mofado, pelos mesmos R$ 0,50, é ultrajante.
Quando foi apresentado, o Consórcio Nordeste prometia viabilizar compras em grande quantidade, trazendo economia para os estados membros. Logo após a fundação veio a pandemia, no início de 2020.
E aí, houve dois momentos em que a atuação dos governadores, reunidos, chamou a atenção.
Primeiro foi na tentativa de comprar respiradores. O equipamento estava em falta e se tornou muito caro. A demanda era muito forte. O ministério da Saúde tentou fazer as compras e não conseguiu. O Consórcio Nordeste entrou em ação. O resultado foi desastroso. Os respiradores nunca chegaram, os contratos foram cancelados. Houve suspeitas de fraude e o Tribunal de Contas de Pernambuco chegou a emitir um alerta para que Paulo Câmara, o mesmo que assumiu a dianteira agora, não fizesse compras pelo Consórcio, apontando risco de prejuízo de quase R$ 14 milhões.
Outro exemplo foi a compra da vacina Sputnik V. O imunizante chegou a ser negociado pelo consórcio e os governadores usaram a instituição para ancorar a briga contra o governo Bolsonaro, que não queria comprá-la. Quando a compra foi resolvida, a Anvisa não autorizou porque disse não confiar na segurança do produto para a saúde das pessoas. A agência foi acusada pelos gestores nordestinos de estar a serviço de Bolsonaro. As críticas à atuação dos técnicos foram tão pesadas que eles resolveram desafiar os governadores, fizeram uma liberação de uso, desde que os gestores se responsabilizassem por qualquer problema depois.
Nenhuma dose foi aplicada no Brasil, até agora.
E a Química?
Juntar é bom quando produz resultado. Porque em toda experiência de mistura existe um risco agregado. O custo, às vezes, não compensa, por menor que seja.
A mistura do bicarbonato com o vinagre, por exemplo, da qual falamos no início deste texto, é bem chamativa, rende muitos cliques em redes sociais mostrando as experiências. É legal fazer vídeos pra internet mostrando que dá pra usar essa solução numa limpeza, por exemplo.
Mas, ela é tão útil quanto comprar um desengordurante no mercado. Custa quase a mesma coisa. O problema é que misturar bicarbonato com vinagre, dependendo do tipo de recipiente utilizado, pode fazer o composto explodir.
E acaba saindo mais caro.
Confira abaixo um resumo dos dados sobre o Consórcio Nordeste: