Cena Política

Filme de Gentili criticado por "apologia à pedofilia" era elogiado por bolsonarista na época em que o apresentador apoiava Bolsonaro

A tentativa da direita de apostar em pauta conservadora esbarra num problema. O brasileiro não é conservador, é hipócrita. Se a economia não melhorar, não renderá votos.

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Igor Maciel

Publicado em 15/03/2022 às 12:26 | Atualizado em 15/03/2022 às 15:15
Análise
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Existe uma aposta dos políticos da direita num "viés conservador" da população brasileira. Como o combate à corrupção perdeu muita força e hoje não é prioridade do eleitor, tenta-se um resgate dos discursos de 2018 sobre "pátria e família", baseado em polêmicas envolvendo filmes e abordagens da imprensa sobre crimes.

O mais recente "escândalo" é com um filme de comédia, acusado por bolsonaristas e por políticos evangélicos de fazer "apologia à pedofilia", por causa de uma cena em que o vilão da história, um professor, manda dois alunos se masturbarem.

É um caso curioso, já que o filme de Danilo Gentili foi lançado em 2017 e era elogiado por bolsonaristas publicamente. Na época, Gentili apoiava Jair Bolsonaro (PL) e ninguém viu problema na produção.

O pastor e deputado federal Marcos Feliciano (PL), por exemplo, chegou a dizer em 2017 que "há tempos não ria tanto".

Reprodução Twitter
Marcos Feliciano - Reprodução Twitter

Agora, quando o filme virou alvo de crítica dos bolsonaristas, explicou que "deve ter saído pra atender o telefone" na cena polêmica.

Erro de avaliação

Nos bastidores da direita, entende-se que há uma oportunidade apelando para esse "conservadorismo" brasileiro. Temas como aborto, redução da maioridade penal, pena de morte, além de questões de gênero, devem ser muito explorados. O lema que envolve "Deus, pátria e família" será ainda mais utilizado, como contraponto à esquerda.

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Mas, é preciso dizer, há um erro de avaliação sobre a tal "tendência conservadora" do brasileiro. O brasileiro não é conservador, muito pelo contrário. O brasileiro, e a polêmica do filme prova isso, é hipócrita.

Apontar que o discurso conservador venceu as eleições de 2018 é tão falacioso quanto dizer que Bolsonaro venceu por causa das redes sociais. São duas grandes mentiras, apoiadas em bases verdadeiras.

O eleitor brasileiro é prático, é objetivo, mas tem uma vergonha íntima de suas intenções, acha elas rasas demais e sempre estará aceitando alguma "sugestão" para justificá-las.

Nessas horas, vale a regra: se não houver outro jeito, apela aos "costumes".

Contra a "família"

No caso de 2018, o PT teve Lula preso e vários outros petistas processados, sendo presos e confessando crimes em delações. De repente, uma "onda moral" tomou conta do país. O brasileiro que furava fila, pedia nota fiscal acima do valor para fazer uma grana com a diária da empresa e fazia de tudo pra levar vantagem sobre os colegas, foi envolvido num ambiente em que era feio (e não esperto) fazer aquilo. Era preciso condenar.

Como se diferenciar? Apele aos "costumes":

Errar todo mundo erra, "mas eles querem deturpar a família e isso é inconcebível".

Investir por votos

No conservadorismo, não funciona. Mas, se apostar na hipocrisia, aí sim, a estratégia dos políticos, ditos "conservadores", tende a dar certo para conseguir algum sucesso eleitoral.

Tem só um detalhe: não dará votos se a economia não melhorar.

Exatamente por ser hipocrisia.

Como foi dito acima, o eleitor brasileiro, embora hipócrita, é prático e objetivo. Se não tiver dinheiro pra comprar arroz e feijão, ninguém vai lembrar nem que Lula já foi preso um dia, ou que a esquerda defende aborto.

Ganha quem convencer de que pode resolver o problema.

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