REFORMULAÇÃO

Com alto índice de inadimplência, governo federal discute o novo Fies Social; especialistas avaliam as propostas

O ministro da Educação, Camilo Santana, explica que a ideia do Fies Social é cobrir até 100% do valor dos cursos

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Mirella Araújo

Publicado em 25/08/2023 às 17:26 | Atualizado em 25/08/2023 às 18:08
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O Ministério da Educação (MEC) vai reformular o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), para que o programa volte ao seu “papel social”, segundo defendeu o ministro Camilo Santana.

O novo Fies Social, como tem sido chamado, estaria associado a outros ministérios como o da Fazenda, com objetivo de facilitar a negociação de dívidas e a renegociação dos débitos em aberto, de estudantes que não conseguiram mais pagar o financiamento.

Camilo Santana explicou ainda que a ideia seria que o Fies Social possa cobrir até 100% do valor dos cursos, o que não ocorre atualmente. Essa discussão sobre o caráter social do programa de empréstimo e as ferramentas para enfrentar a alta inadimplência e, por consequência, o abandono dos cursos, foi levantada pelo ministro da Educação no final de julho.

Desde então o MEC tem discutido junto com o governo federal, por meio da Casa Civil, as regras do novo Fies será ele será apresentado por Projeto de Lei (PL) ou Medida Provisória (MP).

Alguns especialistas têm chamado atenção para o fato de que a cobertura de 100% do valor dos cursos de ensino superior não resolveria o principal desafio do setor educacional privado hoje: a inadimplência.

Outro ponto que tem sido abordado é com relação aos aportes que as Instituições de Ensino Superior privadas (IES), em função da inexistência do limite de teto de aporte a partir do sexto ano do Fundo Garantidor.

Neste cenário, especialistas avaliam que a melhor saída seria o estabelecimento de um teto no limite de 25% para os aportes das instituições privadas no âmbito do programa.

Dentro dessa sistemática iniciada em 2017 com a Lei nº 13.530, de 2017, o percentual de comprometimento das instituições no âmbito do Fies varia de acordo com o ano que o estudante do programa está cursando: 13% no primeiro ano; entre 10% e 25% do segundo ao quinto ano da entidade no FG-FIES; e, para o sexto e sétimo ano, a entidade deve se comprometer em um percentual não inferior a 10%. Não há, porém, um teto para esse comprometimento.

“No primeiro ciclo do Fundo Garantidor, o Fies tinha um teto do aporte que as IES poderiam se comprometer para manter o aluno. A partir de 2023 esse teto deixou de existir, e hoje tem instituições que estão assumindo quase a metade dos encargos para manter o estudante e podendo assim decidir abandonar o programa”, explica o advogado especialista em Direito Educacional e sócio da Covac Advogados, José Roberto Covac.

Para ele, a retomada de um teto é essencial para reequilibrar a situação. “O Fies Social certamente é importante para retomar o foco da política nos estudantes mais necessitados, mas somente com um teto as instituições terão segurança jurídica e financeira para continuar no programa e a política pública poderá cumprir sua função de ampliar o acesso à educação superior”, segue o advogado.

O FG-FIES surgiu como forma de garantir os créditos dos financiamentos em meio à diminuição dos alunos participantes do FIES e o aumento da inadimplência que vem sendo observado nos últimos anos.

Segundo Covac “Além da inexistência do teto do aporte a partir do sexto ano, as instituições reclamam da ineficiência da cobrança dos alunos inadimplentes, o que gera aporte maior das instituições e os relatórios de inadimplência não são claros”, diz o advogado.

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O advogado especialista em Direito Educacional, José Roberto Covac, afirma que é necessário a retomada de um teto para os aportes das IES - Divulgação

Debate no Congresso

A reformulação do programa de financiamento estudantil também tem sido pauta de debates na Câmara dos Deputados. Existe uma preocupação atrelada ao fato de que o Brasil não vai atingir a meta de 33% dos jovens matriculados no ensino superior. Essa é uma das metas que consta no Plano Nacional de Educação (PNE), que finaliza em junho de 2024.

Atualmente, menos de 18% da população entre 18 e 24 anos, estão matriculados em algum curso do ensino superior. Especialistas na área da educação, afirmam que sem um programa de financiamento sustentável, esse percentual tornaria ainda mais difícil alcançar a meta do PNE.

Está em tramitação na Câmara, o PL Nº 2961/22, de autoria do deputado federal Átila Lira (PP-PI), que também propõe a reformulação do Fies. Pela proposta, estudantes com renda de até 1,5 salário mínimo por mês teriam direito à bolsa integral. Alunos com renda familiar per capita de até três mínimos pagariam somente 50% do valor financiado.

O parlamentar afirmou que no governo da presidente Dilma Rousseff, o Fies chegou a atender 700 mil alunos em um ano. Mas, com a modificação que sofreu em 2017, no governo de Michel Temer, o financiamento estudantil ficou mais caro, e o número de beneficiários caiu até chegar a menos de 36 mil matrículas atualmente, disse o deputado. As informações são da Agência Câmara de Notícias.

Fortalecimento do ensino superior


Em abril deste ano, também foi apresentada uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com objetivo de facilitar o pagamento do Fies, para reduzir a inadimplência do programa, que chega a mais de 50% do total, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Um dos pontos da proposta prevê que o pagamento do Fies poderia ser feito quando o participante do programa tivesse um vínculo empregatício, e não apenas após concluir o curso, como funciona hoje. A PEC do Fies foi apresentada pelas deputadas federais Tabata Amaral, Camila Jara, os deputados federais Amom Mandel, Duarte Junior e Pedro Campos.

A professora doutora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ana Lúcia Borba de Arruda, destaca que é reconhecida a validade e importância do fortalecimento do ensino superior do setor das instituições privadas, mas que não se pode perder de vista a relevância de fortalecer o setor público, federal e estadual no Brasil. Neste caso, o ensino superior precisa ser tratado dentro de um campo mais amplo.

“Observe-se de pronto que o campo da educação superior é amplo, não negando a importância do Fies como forma de possibilitar o ingresso do estudante ao nível superior. Logo, é preciso compreender que as proposições de mudanças nas regras e regulamentações do Fies precisam vir também associadas a geração de postos de trabalho, pois reconhecemos que a inclusão educacional e social passa também pela contribuição do cidadão para o desenvolvimento econômico e social do país”, avaliou a professora permanente da UFPE, Ana Lúcia.

O que também precisa estar nessa discussão, segundo a professora, vai muito além da concessão de um empréstimo para financiar o ensino superior.  “A PEC do Fies, em sendo aprovada, e aqui ressalvo que precisamos de maiores elementos de análise dos formuladores da proposta, ela poderá beneficiar estudantes que almejam permanecer e concluir a educação superior. Precisamos ter clareza, entretanto, que democratizar o acesso ao ensino superior não é apenas promover o ingresso, o acesso, mas fazer com que o estudante permaneça e conclua os seus estudos”, afirmou.

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Para a professora da UFPE, Ana Lúcia de Arruda, é necessário discutir a permanência dos estudantes até a conclusão do curso e ampliar o fortalecimento do ensino superior para as instituições públicas também - Divulgação

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