Por Fernando Castilho da Coluna JC Negócios
O estudo realizado pelo professor Walter Belik, em parceria com o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), com o apoio do Instituto Ibirapitanga e do Instituto Clima e Sociedade, revela que enquanto nas famílias mais ricas o gasto com comida representa apenas 5% da renda total, entre as mais pobres ela tem o peso de 26%. E mostra que quando aumenta a renda, diminui o consumo de arroz e feijão e sobe o da carne.
Uma das coisas mais impactantes é que o estudo revela uma perturbadora monotonia na dieta brasileira (de Norte a Sul), onde apenas 10 produtos concentram mais de 45% do consumo alimentar e que os pratos não refletem a diversidade do que poderia ser produzido e consumido.
A pesquisa investigou o sistema alimentar brasileiro e que mostra como economia, sociedade, cultura e geografia se fundem aos alimentos que o brasileiro põe no prato.
Nas famílias que ganham até 2 salários mínimos, o gasto médio mensal com alimentação por pessoa — dentro e fora de casa — é de R$ 120,86. Já nas famílias acima de 25 salários mínimos, para cada pessoa são gastos R$ 671,45 por mês.
O estudo diz que as famílias mais ricas gastam em média 627% a mais em alimentos do que as famílias mais pobres e têm renda 32,5 vezes maior, o que faz dessas famílias um dos públicos de maior interesse da indústria de alimentos.
O gasto total com alimentação no Brasil em 2017-18 foi de R$ 45,4 bilhões ao mês. E mais da metade desse valor (54%) foi despendida por famílias com renda de até 6 salários mínimos, o que corresponde a 71% da população.
Apenas 29% das famílias concentram 65% da renda e 46% da despesa com alimentação — demonstrando que a concentração de renda tem impacto significativo nos gastos com alimentação.
No Brasil, independentemente da região, os gastos com alimentação estão concentrados em poucos produtos. A monotonia alimentar é o oposto do que é considerada uma alimentação adequada e saudável.
Também revela que o aumento na renda de uma família pode reduzir o consumo de alguns tipos de alimentos. É o caso da farinha de mandioca, açúcar cristal, peixes frescos, óleo de soja e até mesmo do arroz e do feijão.
A pesquisa constata o consumo cada vez maior de produtos ultraprocessados, que em 16 anos subiram 46%, enquanto o consumo de alimentos in natura teve queda de 7%. E revela força do agronegócio na mesa nacional.
Quanto maior a renda, come-se mais fora de casa. A média dos gastos da população brasileira com alimentação fora de casa é de R$ 72 por pessoa ao mês. Isso representa quase 33% do gasto total com alimentação.
Entre as famílias mais ricas, metade dos gastos com alimentação vai para pagar a conta em restaurantes e lanchonetes. Já entre as famílias mais pobres, o gasto com refeições e lanches fora de casa equivale a 20% do gasto total com alimentação.
Os alimentos frescos vêm adquirindo maior importância estratégica nos mercados — por terem que ser comprados mais constantemente, alavancam as vendas em outras seções.
Em geral, são pobres nutricionalmente e ricos em calorias, açúcar, gorduras, sal e aditivos químicos, com sabor realçado e maior prazo de validade. Podem favorecer a ocorrência de deficiências nutricionais, obesidade, doenças do coração e diabetes.
A grande maioria dos ultraprocessados acaba sendo consumida ao longo do dia, substituindo o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados.
Não há no Brasil estimativa confiável sobre o volume de perdas e desperdícios com alimentos. Pode variar de mais de 50%, no caso de algumas frutas em certos sistemas de comercialização, para menos de 3%, no caso de grãos. De toda forma, é importante diferenciar as perdas do desperdício.
Produzimos uma quantidade enorme de carne bovina. Um boi por habitante: 99% da carne bovina consumida no Brasil vem dos enormes pastos brasileiros. Ainda assim, o Brasil é o maior exportador de carne do mundo. O mercado interno da carne bovina é cinco vezes maior que o externo e apenas 20% é exportado para outros países.
Finalmente, o estudo revela que insegurança alimentar grave entre as regiões do Brasil é grande. A prevalência de insegurança alimentar é menor em domicílios onde residem pessoas com mais de 65 anos. Isso demonstra a importância da aposentadoria urbana e rural, assim como do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para o orçamento familiar.
A prevalência de insegurança alimentar é maior em domicílios que possuem crianças e jovens. A insegurança alimentar atinge metade das crianças entre 0 e 4 anos e mais da metade (51%) das crianças e adolescentes brasileiras.
A participação dos recursos provenientes de programas de transferência de renda (como o Bolsa Família) no orçamento das famílias que têm insegurança alimentar grave é maior (25,7%) do que nas casas que estão em condição de segurança alimentar (19,3%).
No Sul do país 2,2% das famílias apresentam insegurança alimentar grave, enquanto no Nordeste o percentual é de 7,1%.
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