Antes de sair do Brasil, Ford produziu Jeep Chapéu de Couro e Rural Willys em Jaboatão dos Guararapes

Quem passa pela BR 101, na altura de Prazeres, Jaboatão dos Guararapes, no sentido ao Cabo, não imagina que no quilômetro 86 (hoje denominado Avenida Prestes Maia) existiu a primeira planta de automóveis do Nordeste, de onde saíram dois dos modelos mais icônicos da indústria brasileira na década de 60: O Jeep Willys - que aqui recebeu o nome de Chapéu de Couro - e a Rural Willys, certamente, a primeira SUV feita no país.

Curiosamente, poucos veículos que foram produzidos em Pernambuco, numa fábrica que até hoje utiliza os mesmos galpões originais, ganharam a marca Willys. Em sua maioria, eles ganharam a marca Ford sob o qual continuaram a ser produzidos até a década de 70 quando a linha foi interrompida.

O que pouca gente sabe é que fábrica de Jaboatão fêz parte de uma negociação liderada pelo próprio Henry Ford que decidiu apostar no Brasil adquirindo as operações da Willys Overland do Brasil como estratégia de ampliação de seus mercados. A fabrica de Pernambuco foi junto.

Na verdade, os veículos Willys nacionais eram os queridinhos dos brasileiros, a ponto de a Ford não se arriscar a trocar de nome, marca ou remodelar os veículos de imediato. 

Nos seus anúncios a companhia diz que apenas “trouxe algumas melhorias” que teriam sido feitas de qualquer modo, pela simples evolução da automobilística.

A fábrica de carros Willys chegou a Jaboatão em 1966. Em julho, na inauguração, já saiu o primeiro jipe produzido na primeira fábrica de automóveis do Nordeste, nomeado o jipe Chapéu de Couro. 

A antiga fábrica Willys Overland em Jaboatão é tão importante para a história da indústria no Nordeste que foi objeto de uma tese de Doutorado da professora Universidade Federal De Pernambuco, Karlene Sayanne Ferreira Araújo, que pesquisou os “discursos, embates e o cotidiano fabril (1966-1973)”.

O local escolhido para a construção foi as margens da BR-101, a rodovia federal que liga os estados do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul.

Mas já no ano seguinte, em 1967, a Willys Overland foi vendida para a Ford. Assim, os carros foram produzidos em Pernambuco até o final da década de 1970 com a marca da Ford e não mais da Willys.

Essa fábrica também nunca foi fechada. De carros passou a produzir chicotes elétricos para as linhas da Ford e até para os da Volkswagen quando as duas empresas se juntaram e formaram a Autolatina.

A história do jipe relata que o veículo foi criado para ser um carro de guerra. Com a missão de atender as necessidades dos soldados norte-americanos na Segunda Guerra Mundial, o jipe militar deveria enfrentar qualquer tipo de terreno, além de atuar como batedor, restabelecer comunicações e ainda transportar armamentos, comandantes, soldados e feridos.

O primeiro jipe sem equipamentos militares começou a ser vendido em 1945, com o nome de CJ-2A. Por sua vez, a Rural Willys era um carro utilitário, grande, espaçoso e pensado para a família. Ambos fabricados inicialmente nos Estados Unidos.

A Willys de Jaboatão entregou, no dia da inauguração, o primeiro carro produzido na nova fábrica. Numa estratégia de marketing ele foi batizado de Chapéu de Couro. E esse veículo que foi doado para obras de caridade de Dom Helder Câmara, Arcebispo de Olinda e Recife.

Mas a produção do Chapéu de Couro e da Rural Willys com a marca original durou exatamente 410 dias. Entre 14 de julho de 1966 e 29 de julho de 1967 quando a Ford assumiu as operações da companhia no Brasil.

Em 1969, a produção da Willys e Ford correspondia a 24,2% de todo mercado automobilístico brasileiro. As vendas da empresa (Ford –Willys) tinham crescido exponencialmente no último ano. Só a Rural Willys havia alcançado um aumento de 19,3% de suas vendas no país.

A Willys-Overland do Brasil foi criada como subsidiária da Willys Overland América, em 1952, em São Bernardo do Campo, São Paulo. A produção da Willys Overland terminou em 1967, quando após uma crise econômica que pôs em xeque suas atividades, foi absorvida pela subsidiária brasileira da Ford, que assumiu o controle das ações da Willys e constituiu a Ford-Willys do Brasil S.A.

Com o encerramento da produção, a fábrica com 1200 funcionários, passou a fazer chicotes para a linha Pampa, linha F séries caminhonetas/caminhões, Del Rey, Corcel, Escort e Trator.

A partir de 1984, com o surgimento da Ford/Volkswagen formando a Autolatina, ela passou a produzir também para a Volkswagen com dois turnos de produção. A fábrica foi então vendida para o grupo argentino grupo argentino Pescarmona mudando de nome para TCA.

A fábrica de Jaboatão, em Pernambuco, continuou operando normalmente ligada à Delphi produzindo chicotes elétricos para um grupo que tinha duas fábricas, localizadas em São José dos Pinhais, no Paraná e Itabirito, Minas Gerais.

Em 2010, quando se iniciaram as negociações para a nova planta da FCA em Pernambuco, o Grupo Fiat comprou silenciosamente a unidade e deixou a operação seguir sem nenhuma intervenção.

A razão era bem simples. A fábrica tinha um pacote interessante de incentivos fiscais do Estado. Finalmente, no fim do ano 2011, o Grupo Fiat entregou as chaves da fábrica de chicotes TCA, em Jaboatão dos Guararapes (PE), à sua empresa fabricante de autopeças e sistemas automotivos, a Magneti Marelli.

De certa forma, pode-se dizer que a fábrica do antigo Chapéu de Couro e da Rural Willys foi a primeira sistemista a entrar no negócio de arquitetura de distribuição elétrica automotiva, pois nenhuma outra unidade da companhia no mundo produz chicotes.

Na pratica, a fábrica da TCA foi usada para que a FCA aproveitasse a janela aberta pelo Governo Lula para a instalação de novas plantas e que condicionava a concessão de incentivos fiscais a empresas que já operassem no Nordeste.

Curiosamente essa legislação já valia para as fabricas da Ford na Região Nordeste em Camaçari (BA) e Horizonte (CE) e a abertura de um prazo de 90 dias permitiu que a FCA se habilitasse já que controla a fábrica de chicotes onde foi fabricado os veículos da Willys.