Coluna JC Negócios

Saída da Ford mostra que Brasil não apostou na inovação e só privilegiou vendas internas

Brasil tem modelo curioso com subsídio sempre dados para que montadoras tenham preços menores no mercado interno

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Fernando Castilho

Publicado em 14/01/2021 às 10:10 | Atualizado em 14/01/2021 às 18:49
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Por Fernando Castilho da Coluna JC Negócios do Jornal do Commercio

O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Carlos Moraes, afirmou que o setor não quer subsídios, quer competitividade. E disse que a entidade está há anos mostrando medidas que precisam ser feitas para melhorar a competitividade no Brasil.

É verdade, mas a gente não pode esquecer que o setor vem, há anos, pressionando por subsídios para produzir aqui para vender mais aqui e que é preciso ter em mente que há mais de 40 anos que a indústria automobilística pede e obtém subsídios no Brasil.

Quem pede e não tem é a indústria nacional, as pequenas e médias empresas e o comércio. Não dá para comparar o que o resto do setor industrial brasileiro recebeu de incentivo para sua produção com os da indústria automobilística aqui no Brasil.

E sejamos honestos. Essa conversa de inovação, competitividade global e maior tecnologia embarcada só veio depois que o consumidor passou a se informar e a cobrar o que as mesmas empresas oferecem lá fora, nos mesmo modelos, que são também feitos aqui.

Desde 1980 que o governo dá subsídio ao setor automotivo. Muita gente lembra de Fernando Collor mandando "uma real" para o setor, dizendo que eles produziam "carroças". O pessoal da Anfavea na época se indignou, mas era verdade. E em 1990 o Brasil estava muito defasado. Não importava, não sabia o que acontecia lá fora e achava que os carros da Ford, Volkswagen, GM e Fiat eram o top de linha.

O que pouca gente lembra é que, em 1992, depois do impeachment de Color, o governo Itamar Franco reduziu impostos com incentivos ao crédito interno, iniciando uma política que ainda vai durar anos com o projeto Rota 2030. E sempre é bom lembrar, Itamar elegeu o Fusca como o veículo "ultra moderno e tecnológico" a ser incentivado. A Volkswagen atendeu, mas não trouxe nada de novo.

O Brasil tem um modelo curioso. Aqui o foco do subsídio sempre foi para que o setor tenha preços menores no Brasil. Diferentemente de outros países que se abriram para a indústria vender no mercado externo - o que exigiria competitividade - e acabaria beneficiando o mercado interno que poderia comprá-lo.

No segundo governo Lula, o Brasil criou o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), em 2009. Depois, com Dilma Rousseff, fez o Inovar Auto. E, em 2018, o Rota 2030, cuja linha estratégica é a do Inovar Auto, com o discurso de incentivar P&D à toda cadeia automotiva.

Para quem não lembra, 2009 foi o ano que o Brasil mais cresceu com o Governo Lula turbinando o crédito com dinheiro que não tinha, via BNDES e ampliando prazos de pagamento. Mas incentivo a inovação que é bom, nada.

As desonerações de IPI dados pelo governo, entre 2010 e 2014, custaram R$ 15,5 bilhões. O setor automotivo foi responsável por 53,4%, R$ 8,3 bilhões.

A Anfavea diz que, desde abril de 2019, pede reforma tributária, mostrando comparativos que indicam que o custo de produzir no Brasil é, por exemplo, 18% maior que no México, melhoria do ambiente econômico e atacando o “manicômio tributário” do Brasil.

Isso é verdade. Mas a lógica estatal do subsídio no Brasil sempre foi dar o subsídio para o consumo. E como dá o benefício o governo pega do outro lado cobrando imposto.

De certa forma, a Anfavea tem razão e talvez fosse melhor zerar de fato o imposto para exportação e não dar subsídio no mercado interno. Mas tem a questão de que subsídio se dá fiado (no longo prazo) e imposto se cobra à vista.

O Programa de Sustentação do Investimento (PSI) - entre 2009 e 2015-, com o BNDES cobrando taxas de 2,5% a.a. quando a Selic variou entre 10,50% e 7,25%, a. a., custou, até o final de 2016, R$ 10,2 bilhões.

O PSI, na indústria automobilista virou um programa de crédito direto ao consumidor no caso o setor de transporte. Desse valor, R$ 1,4 bilhão em subsídios para o BNDES.

Mas depois de 40 anos, o Brasil continua dando subsídio para o mercado interno. E isso não resultou em competitividade. É verdade que um País com um mercado potencial de 3 milhões veículos/ano desperta atenção.

Nesta quinta-feira, o jornal O Estado de S. Paulo, revelou que os aportes, registrados nas estatísticas de contas externas do Banco Central, asseguraram nesses anos a expansão das linhas de montagem e também ajudaram a cobrir os alegados prejuízos com a operação no País.

Outra coisa. O Estadão afirma que dados do Ministério da Economia apontam que os incentivos tributários para os fabricantes de automóveis atingiram R$ 43,7 bilhões entre 2010 e 2020. Até 2017, os incentivos contabilizados – R$ 25,24 bilhões – correspondem à base efetiva apurada. Nos três anos seguintes (2018, 2019 e 2020), os dados são projeções.

Mas não se pode esquecer que, antes da crise de 2015/2016 nos governos de Lula e Dilma, o Brasil estava na moda. Em 2012, o Brasil era visto como o futuro quarto mercado global consumindo até 6 milhões de carros por ano.

Isso fez nascer uma onda de instalação de fabricas no Brasil. E aí é importante insistir no mercado interno. O que a indústria fabricasse aqui vendia. Isso não se sustenta numa crise de mercado. Quando se combinou os efeitos da crise de 2015/2016, covid-19 e a falta de ação do governo Bolsonaro, o mercado embicou e ai sem mercado interno as fabricas vão embora.

As montadoras sempre fizeram carros aqui para vender aqui e se não vendem não faz sentido ficar aqui. O que nos leva a uma pergunta perturbadora: Afinal, para que estamos dando subsídio se nossas plantas não nos permitem exportar, com expressividade, veículos cujo diferencial seja tecnologia?

 

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