Saída da Ford mostra que Brasil não apostou na inovação e só privilegiou vendas internas
Brasil tem modelo curioso com subsídio sempre dados para que montadoras tenham preços menores no mercado interno
Por Fernando Castilho da Coluna JC Negócios do Jornal do Commercio
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Carlos Moraes, afirmou que o setor não quer subsídios, quer competitividade. E disse que a entidade está há anos mostrando medidas que precisam ser feitas para melhorar a competitividade no Brasil.
É verdade, mas a gente não pode esquecer que o setor vem, há anos, pressionando por subsídios para produzir aqui para vender mais aqui e que é preciso ter em mente que há mais de 40 anos que a indústria automobilística pede e obtém subsídios no Brasil.
Quem pede e não tem é a indústria nacional, as pequenas e médias empresas e o comércio. Não dá para comparar o que o resto do setor industrial brasileiro recebeu de incentivo para sua produção com os da indústria automobilística aqui no Brasil.
E sejamos honestos. Essa conversa de inovação, competitividade global e maior tecnologia embarcada só veio depois que o consumidor passou a se informar e a cobrar o que as mesmas empresas oferecem lá fora, nos mesmo modelos, que são também feitos aqui.
Desde 1980 que o governo dá subsídio ao setor automotivo. Muita gente lembra de Fernando Collor mandando "uma real" para o setor, dizendo que eles produziam "carroças". O pessoal da Anfavea na época se indignou, mas era verdade. E em 1990 o Brasil estava muito defasado. Não importava, não sabia o que acontecia lá fora e achava que os carros da Ford, Volkswagen, GM e Fiat eram o top de linha.
O que pouca gente lembra é que, em 1992, depois do impeachment de Color, o governo Itamar Franco reduziu impostos com incentivos ao crédito interno, iniciando uma política que ainda vai durar anos com o projeto Rota 2030. E sempre é bom lembrar, Itamar elegeu o Fusca como o veículo "ultra moderno e tecnológico" a ser incentivado. A Volkswagen atendeu, mas não trouxe nada de novo.
O Brasil tem um modelo curioso. Aqui o foco do subsídio sempre foi para que o setor tenha preços menores no Brasil. Diferentemente de outros países que se abriram para a indústria vender no mercado externo - o que exigiria competitividade - e acabaria beneficiando o mercado interno que poderia comprá-lo.
No segundo governo Lula, o Brasil criou o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), em 2009. Depois, com Dilma Rousseff, fez o Inovar Auto. E, em 2018, o Rota 2030, cuja linha estratégica é a do Inovar Auto, com o discurso de incentivar P&D à toda cadeia automotiva.
Para quem não lembra, 2009 foi o ano que o Brasil mais cresceu com o Governo Lula turbinando o crédito com dinheiro que não tinha, via BNDES e ampliando prazos de pagamento. Mas incentivo a inovação que é bom, nada.
As desonerações de IPI dados pelo governo, entre 2010 e 2014, custaram R$ 15,5 bilhões. O setor automotivo foi responsável por 53,4%, R$ 8,3 bilhões.
A Anfavea diz que, desde abril de 2019, pede reforma tributária, mostrando comparativos que indicam que o custo de produzir no Brasil é, por exemplo, 18% maior que no México, melhoria do ambiente econômico e atacando o “manicômio tributário” do Brasil.
Isso é verdade. Mas a lógica estatal do subsídio no Brasil sempre foi dar o subsídio para o consumo. E como dá o benefício o governo pega do outro lado cobrando imposto.
De certa forma, a Anfavea tem razão e talvez fosse melhor zerar de fato o imposto para exportação e não dar subsídio no mercado interno. Mas tem a questão de que subsídio se dá fiado (no longo prazo) e imposto se cobra à vista.
O Programa de Sustentação do Investimento (PSI) - entre 2009 e 2015-, com o BNDES cobrando taxas de 2,5% a.a. quando a Selic variou entre 10,50% e 7,25%, a. a., custou, até o final de 2016, R$ 10,2 bilhões.
O PSI, na indústria automobilista virou um programa de crédito direto ao consumidor no caso o setor de transporte. Desse valor, R$ 1,4 bilhão em subsídios para o BNDES.
Mas depois de 40 anos, o Brasil continua dando subsídio para o mercado interno. E isso não resultou em competitividade. É verdade que um País com um mercado potencial de 3 milhões veículos/ano desperta atenção.
Nesta quinta-feira, o jornal O Estado de S. Paulo, revelou que os aportes, registrados nas estatísticas de contas externas do Banco Central, asseguraram nesses anos a expansão das linhas de montagem e também ajudaram a cobrir os alegados prejuízos com a operação no País.
Outra coisa. O Estadão afirma que dados do Ministério da Economia apontam que os incentivos tributários para os fabricantes de automóveis atingiram R$ 43,7 bilhões entre 2010 e 2020. Até 2017, os incentivos contabilizados – R$ 25,24 bilhões – correspondem à base efetiva apurada. Nos três anos seguintes (2018, 2019 e 2020), os dados são projeções.
Mas não se pode esquecer que, antes da crise de 2015/2016 nos governos de Lula e Dilma, o Brasil estava na moda. Em 2012, o Brasil era visto como o futuro quarto mercado global consumindo até 6 milhões de carros por ano.
Isso fez nascer uma onda de instalação de fabricas no Brasil. E aí é importante insistir no mercado interno. O que a indústria fabricasse aqui vendia. Isso não se sustenta numa crise de mercado. Quando se combinou os efeitos da crise de 2015/2016, covid-19 e a falta de ação do governo Bolsonaro, o mercado embicou e ai sem mercado interno as fabricas vão embora.
As montadoras sempre fizeram carros aqui para vender aqui e se não vendem não faz sentido ficar aqui. O que nos leva a uma pergunta perturbadora: Afinal, para que estamos dando subsídio se nossas plantas não nos permitem exportar, com expressividade, veículos cujo diferencial seja tecnologia?