Dificuldade em lidar com o pet na retomada das atividades? Veja dicas de especialistas
A quarentena aproximou tutores e pets, mas a retomada das atividades trouxe alguns desafios
Antes considerados animais com funções, como proteger a casa, os pets se tornaram verdadeiros integrantes das famílias. A partir dessa mudança de percepção, a qualidade de vida dos bichinhos passou a ser uma prioridade para os tutores. Uma realidade que se intensificou ainda mais durante a pandemia do novo coronavírus, quando tutores e os peludinhos passaram a conviver por mais tempo e pessoas que nunca criaram animais optaram por adotar ou adquirir um pet como companhia. Mas a retomada das atividades presenciais acabou trazendo uma série de desafios para quem tem um animalzinho em casa.
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Para o médico veterinário Tiago Vilela, o entendimento de que o cão ou gato é um membro da família fez com que a medicina evoluísse e a expectativa de vida dos animais aumentasse. "Essa preocupação em cuidar dos pets se intensificou muito com a pandemia. A proximidade que o home office provocou fez com que os tutores aumentassem os cuidados e passassem a prestar mais atenção em alterações de saúde dos pets", pontua o especialista. Segundo ele, a procura por uma companhia também fez com que muita gente procurasse um animalzinho de estimação. "Houve uma explosão de pessoas comprando e adotando animais. Eu nunca fiz tantas vacinas em filhotes como nesse período. Muitos desses tutores eram mães e pais de pets de primeira viagem", conta.
Se por um lado a convivência estreitou laços, por outro, também criou algumas dificuldades. A principal diz respeito à separação dos pais e mães de pet de seus bichinhos com a retomada das atividades econômicas e o trabalho presencial. "A ansiedade de separação pode impactar de maneira bem séria a saúde dos animais, causando distúrbios de comportamento. O animal pode querer chamar a atenção urinando ou defecando fora o local, destruindo objetos ou vocalizando (latindo) por longos períodos. Muitos tutores chegaram até a receber notificação de vizinhos por isso."
O médico lista alguns sinais de alerta para os tutores. "Além da questão da urina e das fezes no local errado, pode começar a haver diminuição da ingestão de alimentos, por exemplo. Outro sinal é o animal seguir o tutor em todos os lugares. Existe indícios orgânicos disso, também. A imunidade de animais que sofrem com a separação pode cair e ele apresentar quadros como diarreia, vômitos e infecção por bactérias ou parasitas", alerta.
A solução encontrada por diversos tutores têm sido serviços que ajudam o animal a gastar energia, socializar e se desenvolver, como as creches, que têm conquistado cada vez mais adeptos. "Foi uma demanda que cresceu muito após o período de quarentena e lockdown, porque as pessoas voltaram a trabalhar e não tinham com quem deixar o cachorro. Aqui passamos a oferecer o serviço e tratar o comportamento canino em si, com brincadeiras cognitivas. O intuito não é só cansar o cachorrinho para ele voltar mais tranquilo, mas voltar para casa mais esperto, mais sociável", explica Jacqueline Nery, uma das sócias do Hostel 4 Pets. Para ela, o trabalho traz uma série de benefícios nesse último aspecto. "Os cães passam a entender melhor a linguagem que o outro animal passa. Não é só saber brincar com o outro, mas entender os momentos para isso. É um trabalho que se propõe a aprimorar os instintos dos cachorros", explica.
A psicóloga Emanuela Andrade é anfitriã da Dog Hero, plataforma de hospedagem de animais, desde 2019 e também sentiu o aumento da procura pelo serviço de creche nos últimos meses. "Isso ajuda muito a melhorar o bem-estar dos animais. As pessoas hoje têm pets como filhos e por isso, às vezes, tendem a tratar como ser humano. Mas um cachorro precisa ser cachorro também e esses espaços acabam tendo uma importância muito grande nesse sentido", pontua.
A médica Carolina Montefusco, de 24 anos, procurou uma creche para que a filha de quatro patas Filó, de 8 meses, não ficasse sozinha e nem dependente da rotina dos tutores. "Eu nunca tive bichinho e pesquisei muito antes de ter. Li sobre a importância do enriquecimento ambiental para evitar o estresse e a dependência. Como ela era muito pequena, acabei postergando a procura, mas a veterinária dela sugeriu e eu comecei a levar para a creche", conta. Logo no primeiro dia, Filó voltou para casa já dormindo no trajeto. "Chegou muito mais tranquila, porque gastou energia de forma saudável. Eu acho que está surgindo uma nova cultura, novas formas de criar os animais. Existe hoje uma preocupação com a alimentação mais saudável e as necessidades dos bichinhos e isso é positivo", avalia.
Além das creches, o veterinário cita outro serviço que pode impactar positivamente a rotina dos pets: a contratação de dog walkers, ou passeadores. Alinne Arruda, sócia da Rabinho Feliz, que oferece o serviço, explica como funciona. "O passeador vai até a casa do tutor e passeia com o animal durante 40 minutos ou 1h e depois leva o bichinho de volta. Isso varia muito de acordo com o perfil do animal. Se é idoso, por exemplo, o tempo acaba diminuindo." Segundo ela, a mudança no comportamento e na saúde dos bichinhos é notável. "A gente passeava com uma cachorrinha diabética, que teve melhoria nas taxas após a atividade. É um bem-estar enorme para os pets e praticidade para os tutores que não podem passear com seus bichinhos."
Quem não puder pagar por um serviço como esses, pode adotar algumas medidas no dia a dia. "O que dá para fazer é tentar estabelecer rotinas. O grande problema da volta ao trabalho é que ela é brusca. Para quem puder se programar, o ideal é que se possa criar um distanciamento progressivo do animal, saindo de casas por períodos de 5 minutos, depois 10 e assim por diante. Outra dica é comprar brinquedos que possam distrair o animal. Alguns eles escondem petiscos, como uma forma de recompensar o animal. Assim, o cão entende que quando o dono se ausenta, ele acaba ganhando uma recompensa por isso", explica o veterinário. Para diminuir a ansiedade, o especialista também indica que os pais de pets deixem algum objeto, como uma roupa ou acessório, próximo ao bichinho. "É uma forma de fazer com que ele se sinta mais acolhido. É importante, no entanto, que o tutor dedique um tempo ao pet quando chegar em casa", conclui.
Entrevista
Em entrevista ao JC, o médico veterinário Tiago Vilela falou sobre o aumento do número de animais de estimação nos lares durante a quarentena e como os tutores podem lidar com a retomada das atividades.
Jornal do Commercio - Os animais passaram a fazer parte das famílias. No dia a dia da prática clínica, dá para perceber uma preocupação maior com o bem-estar dos pets?
Tiago Vilela - Tanto eu quanto vários colegas sentimos isso. À medida que isso foi acontecendo, a medicina veterinária evoluiu muito. A expectativa de vida dos animais também cresceu bastante na última década por esse motivo. Os tutores passaram a ter uma preocupação maior de cuidar dos seus pets e isso se intensificou durante a pandemia. A proximidade que o home office provocou fez com que os tutores aumentassem os cuidados e passassem a prestar mais atenção em alterações de saúde dos pets.
JC - Você notou o aumento do número de pets nos lares nesses últimos meses, com a chegada da pandemia e a necessidade do distanciamento social?
Tiago - Houve uma explosão de pessoas comprando e adotando animais. Eu nunca fiz tantas vacinas em filhotes como nesse período. Muitos desses tutores eram mães e pais de pets de primeira viagem, que não tinham a mínima ideia de como criar um cão, mas viram neles uma companhia, uma distração para este período tão difícil, que afeta todo mundo. Os pets tem essa capacidade de ajudar a preencher um vazio, uma falta, e trazer felicidade. Acho que um lado negativo é desse aumento desenfreado é que muita gente escolheu ter um pet sem se informar direito sobre todos os cuidados e custos que envolvem. E estamos falando de 15 anos de cuidados.
JC - Muita gente adotou ou comprou um pet e pôde ficar em casa com ele durante esse período. Mas agora, com a retomada das atividades e a necessidade de sair para trabalhar, alguns tutores têm enfrentado dificuldades com os animais. Como isso pode impactar a saúde e o bem-estar dos bichinhos?
Tiago - A ansiedade de separação pode impactar de maneira bem séria a saúde dos animais, causando distúrbios de comportamento. O animal pode querer chamar a atenção urinando ou defecando fora o local, destruindo objetos ou vocalizando (latindo) por longos períodos. Muitos tutores chegaram até a receber notificação de vizinhos por isso.
JC - E serviços como creches, hoteizinhos ou dog walkers podem ajudar nesse sentido?
Tiago - Sem sombra de dúvidas. A oferta e a procura por esse tipo de serviço aumentou muito. Geralmente os cães vão 3 ou no máximo 4 dias na semana a esses locais. Existe esse limite para evitar a hiperestimulação. Mas estabelecer essa rotina ajuda muito a diminuir a ansiedade dos animais. Para os tutores que não tem a possibilidade de deixar o animal em um local assim, os dog walkers (passeadores) podem ser uma opção. Às vezes na rotina, o tutor não consegue oferecer ao animal um gasto energético. Todo animal tem necessidade de andar e se exercitar e se ela não é satisfeita, isso pode acarretar em uma série de doenças. Nesse período, notei nos meus pacientes um aumento muito grande de peso, por exemplo.
JC - E quem não pode ter acesso a esses serviços, como pode fazer em casa para se adaptar a essa realidade?
Tiago - O que dá para fazer é tentar estabelecer rotinas. O grande problema da volta ao trabalho é que ela é brusca. Para quem puder se programar, o ideal é que se possa criar um distanciamento progressivo do animal, saindo de casas por períodos de 5 minutos, depois 10 e assim por diante. Outra dica é comprar brinquedos que possam distrair o animal. Alguns eles escondem petiscos, como uma forma de recompensar o animal. Assim, o cão entende que quando o dono se ausenta, ele acaba ganhando uma recompensa por isso. O tutor também pode deixar algum objeto dele, como uma camisa, um boné, algo que tenha o cheiro dele. É uma forma de fazer com que ele se sinta mais acolhido. É importante, no entanto, que o tutor dedique um tempo ao pet quando chegar em casa.