A impressão que tem o cidadão pernambucano que anda de ônibus e metrô todos os dias - e que depende deles para acessar as oportunidades de trabalho e lazer, vale ressaltar - é de que o poder público está sentado, de pernas cruzadas, assistindo à greve dos motoristas de ônibus da Região Metropolitana do Recife.
Sem nada fazer para resolver o problema. É sobre essa ausência que o texto a seguir fala.
Greve, é importante dizer, que começou a ficar violenta e caminha para ser uma das mais demoradas da história do transporte público do Grande Recife - e até de todo o Estado - podendo chegar a seis dias de movimento.
Isso porque os rodoviários decidiram prolongar a manifestação até o julgamento do dissídio coletivo da categoria pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (TRT-6), marcado para segunda-feira (31/7), às 9h.
Greve que parou o comércio, está prejudicando a prestação de variados serviços e tem tirado o sossego de muito, muito trabalhador.
Até porque, um dia de greve é fácil negociar com o empregador. Mas negociar dois, três, quatro, cinco ou seis, é uma tarefa complicada. E, sob pressão, o passageiro vai para a rua na esperança de conseguir um transporte para chegar ao destino. Essa é a verdade.
RESPONSABILIDADE DO ESTADO E DAS PREFEITURAS
O poder público que estaria sentado, com as pernas cruzadas, seria o governo de Pernambuco e as prefeituras da Região Metropolitana do Recife que são atendidas diretamente pelo sistema de ônibus que está em greve. Um sistema que fatura R$ 1 bilhão por ano, dos quais apenas R$ 250 mihões (em média) são subsídios do governo do Estado. O restante é custeado pelo passageiro, sozinho.
RAQUEL LYRA se pronuncia sobre RUMO DA GREVE DOS RODOVIÁRIOS
O governo de Pernambuco tem responsabilidade direta e sabe disso. É o gestor do transporte metropolitano, é quem dita as regras do Sistema de Transporte de Passageiros da RMR (STPP).
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E, embora o Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano (CTM) responda qual a frota de ônibus está em circulação dia após dia da greve, ninguém do órgão se pronunciou sobre o movimento e o impacto para a população. Entrevistas, inclusive, foram negadas.
PREFEITURAS AINDA FINGEM QUE O PROBLEMA NÃO É COM ELAS
Entre as prefeituras, a que deveria estar mais envolvida é a do Recife, por onde passam 80% das 360 linhas e para onde quer ir a maioria dos 1,8 milhão de passageiros do sistema.
Por isso, a responsabilidade sobre o problema é legal e a cobrança por uma maior participação na resolução dele é legítima. Mas nenhum posicionamento formal foi feito pelo prefeito João Campos (PSB), por exemplo, que sempre conversa com seus eleitores pelas redes sociais.
O mesmo vale para o prefeito de Olinda, Professor Lupércio, que também integra o CTM. Nem tudo se resume a um convênio de delegação, como o feito com o governo do Estado.
CONSÓRCIO GRANDE RECIFE FOI CRIADO PARA DIVIDIR RESPONSABILIDADES
É preciso relembrar que o Consórcio Grande Recife foi criado, há cerca de dez anos, para aproximar as prefeituras da RMR do transporte público que atende seus habitantes.
ALDO LIMA, PRESIDENTE DO SINDICATO DOS RODOVIÁRIOS, É PRESO NESTA SEXTA-FEIRA (28)
O tempo passou e apenas o Recife e Olinda aderiram ao consórcio. A capital, porque sem ela o CTM não existiria, e Olinda depois, após muitas negociações.
MUDA A GESTÃO, NÃO MUDA A POSTURA
É necessário destacar que a ausência de gesto do poder público diante das greves de rodoviários independe de gestão. PSB, PSDB e até os extintos PMDB e PFL nunca se envolveram nas negociações trabalhistas quando estiveram à frente do governo estadual.
Mas havia um pouco mais de gesto. Declarações, posicionamentos públicos e acompanhamento das mediações diante da Justiça do Trabalho. E a vida, assim como a política, é feita de gestos.
POPULAÇÃO SOFRE COM A GREVE E QUER SOLUÇÃO. APENAS
Essa ausência de posicionamento se baseia no argumento de que a greve dos rodoviários é uma questão ‘de empregador e empregado’, na qual o poder público não deve se envolver.
Principalmente para não ser o responsável por cobrir o reajuste que certamente deverá ser determinado pela Justiça do Trabalho - seja ele de 3% como querem os empresários, ou de 10% como pedem os motoristas.
Discurso, inclusive, que foi repetido pela governadora Raquel Lyra ao se pronunciar pela primeira vez na sexta–feira (28), terceiro dia de greve.
Nosso governo respeita o direito à greve e a luta dos trabalhadores. Já estamos apurando as circunstâncias da ação policial que deteve o presidente do Sindicato dos Rodoviários, Aldo Lima. Acredito no diálogo como o melhor caminho para negociação. Sempre.
— Raquel Lyra (@raquellyra) July 28, 2023
“A negociação acontece entre as empresas de ônibus e os rodoviários. A questão já está judicializada e a Justiça do Trabalho deve decidir nos próximos dias sobre o assunto. É legítimo o direito de greve e o governo respeita esse direito. Mas, é natural que, no processo de negociação, a gente (Estado) esteja aguardando a decisão da Justiça”, disse a governadora.
Mas a população não aceita mais esse discurso político de divisão quando existe ônus e de união quando há bônus. Ela espera resultados para os problemas. Simples assim.
FRENTE DE LUTA PELO TRANSPORTE FAZ CRÍTICAS
“Denunciamos que o sucateamento do transporte público não é de agora e para além da devida responsabilização das empresas de ônibus, o atual governo Raquel Lyra está completamente omisso como se não devesse ser protagonista de mediações e condutor de melhorias no sistema”, critica Pedro Josephi, membro do Conselho Superior de Transporte Metropolitano e coordenador da Frente de Luta pelo Transporte Público.
“Problemas estruturais, como os irracionais terminais integrados, a insuficiente integração temporal, a extinção deliberada dos BRT’s, a indefinição sobre a licitação das linhas de ônibus que seguem sem qualquer definição pelo governo estadual, além das superlotações diárias e desconforto, merecem uma postura diferente”, segue.
“A Lei dos ar condicionados, grande conquista da sociedade civil organizada, até agora não teve regulamentação. Não houve implementação da tarifa única. Há distorções no sistema que permitem uma atividade sem risco para as empresas sendo tudo suportado pelos pernambucanos”, alerta.