Cadê os leitos de UTI? Essa se tornou uma pergunta que muitos têm feito nesta fase em que a epidemia de covid-19 desponta com uma curva acelerada em Pernambuco. Após quase 40 dias do anúncio da abertura de 400 novas vagas de unidade de terapia intensiva (UTI) e 600 de leitos de retaguarda (aqueles que podem servir como uma enfermaria e necessários para pacientes em menor gravidade e para aqueles que têm alta da UTI) em todo o Estado, foram colocadas em operação 327 dessas vagas para assistência intensiva a pacientes com suspeita ou confirmação da infecção pelo novo coronavírus.
Até a sexta-feira (24), 91% desses leitos permaneciam ocupados - uma queda de oito pontos percentuais, em comparação com a última segunda-feira (20), quando o Estado operava com 319 vagas de UTIs. Além do acréscimo de oito leitos, ao longo da semana, há pacientes que foram a óbito e outros tiveram alta, o que pode justificar a queda na taxa de ocupação nos últimos cinco dias. Ainda assim, todo índice acima de ocupação a partir de 80% denota uma zona de criticidade na assistência hospitalar e exige capacidade de resposta das autoridades. O maior entrave nesse cenário é que, pela complexidade do cuidado exigido por um paciente grave e acometido por uma doença ainda cheia de enigmas, um leito de UTI não é montado de uma hora para outra. Para ele existir, não são necessários apenas respiradores, “um item que mais nos falta” - usando aqui as palavras ditas pelo secretário de Saúde de Pernambuco, André Longo, em coletiva de imprensa na terça-feira (21).
Uma explicação do médico Marçal Durval Siqueira Paiva Júnior, presidente da Sociedade de Terapia Intensiva de Pernambuco, traz uma luz que nos ajudar a explicar por que, depois de quase dois meses das notificações em Pernambuco e na atual franca aceleração da curva epidêmica de covid-19, ainda falta abrir uma parte das prometidas vagas de terapia intensiva. “O mais sério é que assistimos a um colapso de recursos humanos”, comenta Marçal sobre a falta de profissionais capacitados e experientes, especialmente médicos, para atuar na assistência hospitalar intensiva, uma área que exige do profissional cuidado intenso, vigia com assiduidade dos sinais vitais do paciente e agilidade para corrigir problemas que levam o paciente a ter a vida em risco. “Ainda há muitos, já preparados, que estão adoecendo. O que acontece? Vários têm dobrado plantão (pelo desfalque), outros vão trabalhar e não sabem se serão rendidos. Tudo isso tem dificultado a abertura de novos leitos”, acredita Marçal.
O mais sério é que assistimos a um colapso de recursos humanosMarçal Durval Siqueira Paiva Júnior, presidente da Sociedade de Terapia Intensiva de Pernambuco
Esse depoimento nos leva a perceber o quanto o problema é mais complexo do que adquirir ventiladores mecânicos. O Recife, por sinal, tem hoje mais respiradores recém-adquiridos (122 ao todo) do que leitos de UTI (70 vagas já foram abertas), em operação nos hospitais de campanha da rede municipal e no Hospital da Mulher do Recife, no Curado, Zona Oeste da cidade. “Para criar UTIs, além dos equipamentos, precisa-se de estrutura física que dê a mínima condição para funcionamento da assistência intensiva, incluindo estrutura de gases. O mais difícil, contudo, é ter material humano (por plantão de 12 horas): um médico para cada dez leitos, uma enfermeira para um total de oito a dez pacientes, um fisioterapeuta respiratório para a mesma proporção e um técnico de enfermagem para até dois pacientes”, diz Marçal.
Atualmente o Estado tem em torno de 25 mil servidores da saúde, além dos profissionais lotados na rede municipal e os que atuam exclusivamente nas unidades privadas. No último dia 22, diante da necessidade desses profissionais para o enfrentamento à covid-19, André Longo anunciou a convocação de servidores para iniciar o processo de substituição de outros profissionais que adoeceram e, por isso, afastaram-se do front. Ao todo, foram chamados mais de mil médicos diaristas e 702 trabalhadores de outras áreas da saúde. “Estamos disponíveis para oferecer treinamento e supervisão aos que precisarem neste momento”, salienta Marçal.
Do total de vagas de UTI já abertas para covid-19, em Pernambuco, segundo atualização deste sábado (25) da Secretaria Estadual de Saúde (SES), 35 leitos estão no antigo hospital Alfa, em Boa Viagem, Zona Sul do Recife; 20 na Maternidade Brites de Albuquerque, em Olinda; 30 no Hospital Dom Helder Camara, no Cabo de Santo Agostinho, Grande Recife. A meta do governo do Estado é concluir, até o fim deste mês, a abertura dos novos leitos de UTI para covid-19 e, dessa maneira, alcançar a marca dos 400 prometidos para salvar vidas.
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O mais sério é que assistimos a um colapso de recursos humanos
Marçal Durval Siqueira Paiva Júnior, presidente da Sociedade de Terapia Intensiva de Pernambuco
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