SEGURANÇA PÚBLICA

Escolha de Alessandro Carvalho para SDS é vista com apreensão por entidades de classe e de direitos humanos

Raquel Lyra anunciou, nesta sexta-feira (1º), o nome do delegado federal, que já comandou a pasta entre dezembro de 2013 e outubro de 2016

Imagem do autor
Cadastrado por

Raphael Guerra

Publicado em 01/09/2023 às 15:41 | Atualizado em 01/09/2023 às 16:00
X

A escolha do delegado federal Alessandro Carvalho para assumir a Secretaria de Defesa Social de Pernambuco (SDS-PE), anunciada pela governadora Raquel Lyra nesta sexta-feira (1º), não foi comemorada e foi vista com apreensão por entidades ligadas às forças de segurança e aos direitos humanos. 

Em geral, a principal crítica a Alessandro é de falta de diálogo enquanto comandou a pasta estadual entre dezembro de 2013 e outubro de 2016.

Representantes da Associação de Cabos e Soldados e do Sindicato dos Policiais Civis de Pernambuco (Sinpol-PE) reclamavam que não eram recebidos por ele e nem tinham reivindicações básicas atendidas. Nesse período, também foram instaurados processos administrativos contra líderes das entidades de classe, deixando o clima ainda mais tenso. 

Apesar de a diretoria do Sinpol-PE ter demonstrado surpresa e preocupação com a escolha da governadora, a entidade declarou, por meio de nota pública, que deseja que o novo secretário "faça um ótimo trabalho e que dê conta dos grandes desafios que enfrentará à frente da segurança pública".

"Ele (Alessandro Carvalho) conhece muito bem os problemas e os desafios da segurança pública de Pernambuco. Problemas que se agravaram desde que deixou de ser secretário até hoje e trazem consigo grande complexidade", pontuou o presidente da entidade, Rafael Cavalcanti.

"Nesse sentido, nos colocamos à disposição para o diálogo, adiantando que nada vai mudar se o governo do Estado não estiver disposto a investir em estrutura, planejamento, diálogo, efetivo e valorização profissional", afirmou.

Em agosto, entidades como o Sinpol-PE e a Associação de Cabos e Soldados comemoraram a criação de comissões permanentes de trabalho com a SDS para estabelecer um canal contínuo de diálogo e valorização das polícias Civil e Militar e do Corpo de Bombeiros.

Com a saída de Carla Patrícia, responsável pela criação das comissões, as associações esperam que não sejam criados obstáculos nesse diálogo.

"INDISPOSIÇÃO PARA O DIÁLOGO"

A socióloga e coordenadora executiva do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop), Edna Jatobá, também demonstrou preocupação com a escolha de Carvalho para voltar ao comando da pasta, em substituição a Carla Patrícia Cunha, que entregou o cargo na última quarta-feira (30).

"Pior que a saída da então secretária Carla Patrícia, que de alguma maneira conseguiu estabelecer algum diálogo com movimentos e organizações da sociedade civil, na contramão da postura do governo de Raquel Lyra, foi o anúncio de quem a substituiu. Alessandro Carvalho, que já foi secretário na época do Pacto pela Vida, demonstrou naquele período indisposição para o diálogo", afirmou Edna.

"Além disso, ele (Alessandro) chegou a dizer numa audiência pública que mais pessoas negras são mortas em Pernambuco porque havia mais pessoas negras na composição da população pernambucana. Essa fala faz transparecer o racismo estrutural em curso em nosso Estado", completou. 

QUEM É ALESSANDRO CARVALHO, NOVO TITULAR DA SDS?

Alessandro Carvalho já atuou em diversas funções na Polícia Federal em vários estados do Brasil. Foi chefe regional em Foz do Iguaçu, delegado regional executivo na Bahia e no Rio Grande do Norte, por exemplo.

Carvalho foi secretário executivo de Defesa Social de 2010 até dezembro de 2013, quando assumiu a titularidade da pasta em substituição a Wilson Damázio, que foi demitido por Eduardo Campos após declarações polêmicas em entrevista ao Jornal do Commercio

Enquanto esteve no comando da pasta, Alessandro enfrentou a última greve da Polícia Militar de Pernambuco, ocorrida em maio de 2014. Isso aconteceu pouco mais de um mês após Eduardo Campos deixar ao governo estadual para entrar na corrida presidencial e o vice dele, João Lyra Neto, assumir a vaga. 

O movimento grevista foi marcado por saques a estabelecimentos comerciais, depredações e suspensão de aulas e outros serviços. Em um único dia, a Polícia Civil deteve 234 pessoas suspeitas de furtos, roubos, dano qualificado, entre outros crimes. Tropas da Força Nacional e do Exército precisaram vir ao Estado para diminuir os atos de violência. 

VIOLÊNCIA EM ALTA E CRÍTICAS À FALTA DE DIÁLOGO DERRUBARAM ALESSANDRO CARVALHO EM 2016

Alessandro Carvalho seguiu à frente da SDS até outubro de 2016, quando foi substituído pelo delegado federal aposentado Angelo Fernandes Gioia (que ficou apenas oito meses no cargo).

Para entender os motivos da exoneração de Alessandro é preciso voltar a 2013, considerado o melhor da série histórica do Pacto pela Vida. Ao todo, 3.100 homicídios em Pernambuco foram somados pela polícia naquele ano. Resultado animador e que até hoje não voltou a ser atingido. 

Nos anos seguintes, os números cresceram muito, gerando críticas à gestão de Alessandro Carvalho e à condução do Pacto pela Vida sob o comando de Paulo Câmara, que assumiu o governo estadual em janeiro de 2015. 

As estatísticas são da própria SDS. Em 2014, a polícia registrou 3.434 assassinatos no Estado (334 a mais que no ano anterior). Já em 2015, o número subiu para 3.889. No ano seguinte, novo crescimento: 4.480. 

Nos crimes violentos contra o patrimônio (roubos), também deram um salto na gestão de Carvalho. Em 2014, a polícia registrou 65.276 queixas. No ano seguinte, 85.107. Em 2016, 115.503. 

Além das cobranças pela redução da violência, a relação entre Carvalho e representantes dos sindicatos e associações de profissionais da segurança pública estava bastante complicada.

As entidades de classe reclamavam da falta de diálogo com o gestor, e passaram a realizar movimentos como operação-padrão nas delegacias e entrega dos PJES (Programa de Jornada Extra de Segurança) - dificultando a construção de escalas de plantões. 

COMBATE À VIOLÊNCIA EM PERNAMBUCO

Alessandro Carvalho voltará ao comando da SDS em meio à construção da nova política de segurança de Pernambuco. Em 31 de julho, Raquel Lyra anunciou as principais diretrizes do Juntos pela Segurança, em substituição ao Pacto pela Vida. 

A política segue em construção pelo governo estadual, ouvindo a sociedade e realizando oficinas com especialistas. 

A promessa de Raquel Lyra é apresentar, até o final de setembro, as ações que serão implementadas para reduzir os números violência que seguem altos em Pernambuco.

Em julho, 309 pessoas foram vítimas de mortes violentas - um aumento de 26,6% em relação ao mesmo período do ano anterior, quando 244 ocorrências foram registrados.

Na Região Metropolitana do Recife, o aumento de crimes contra a vida foi bem acima da média do Estado. Ao todo, em julho, 143 pessoas foram mortas. Já no mesmo período do ano passado, foram 98. O crescimento chegou a 45,9%.

No acumulado dos sete primeiros meses do ano, Pernambuco somou 2.101 mortes. Três a menos do que no mesmo período de 2022.

Tags

Autor