SEGURANÇA PÚBLICA

Mesmo com autorização do TJPE, Polícia Militar ainda não registra crimes de menor potencial ofensivo

Resolução foi publicada em 2020, mas governo de Pernambuco não aderiu à medida que poderia garantir mais agilidade e economia na formalização de delitos mais simples, como ameaça e perturbação de sossego

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Raphael Guerra

Publicado em 29/05/2024 às 7:00
Notícia

Quase quatro anos após o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) publicar uma resolução autorizando que juízes recepcionem os Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCOs) lavrados por policiais militares, rodoviários federais e ferroviários federais, a iniciativa não avançou. E por uma decisão da Secretaria de Defesa Social (SDS), que mantém o poder dos registros dos crimes de menor potencial ofensivo apenas nas mãos da Polícia Civil. 

O tema, de fato, gera polêmica e queda de braço entre as polícias Civil e Militar de todo o Brasil. Os militares apontam que a lavratura de TCOs seria fundamental para garantir a economia de recursos e agilidade ao andamento de crimes considerados mais simples - como ameaça e perturbação de sossego -, com penas de até dois anos. Mas os policiais civis argumentam que essa atribuição é exclusiva da Polícia Judiciária (ou seja, Civil) e que a adoção da medida poderia "esvaziar" parte de suas atribuições. 

Recentemente, questionamentos de uma possível inconstitucionalidade, inclusive, chegaram a ser levados pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal e pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Judiciária para avaliação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023, após um decreto presidencial autorizar que a Polícia Rodoviária Federal lavrasse TCO.

O argumento das entidades foi de que o TCO é um procedimento jurídico e investigativo que visa apurar circunstâncias, materialidade e autoria de infrações penais e, por isso, não poderia ser lavrado por policiais rodoviários federais. 

O ministro Luís Roberto Barroso, no entanto, julgou que o TCO não se tratava de procedimento investigativo, mas apenas de um termo de constatação e registro de um fato que é encaminhado à autoridade judicial. Por unanimidade, o plenário do STF votou junto ao relator. 

PERNAMBUCO

Em Pernambuco, parte da alta cúpula da Polícia Militar defende que o efetivo possa registrar os TCOs como forma de garantir a agilidade necessária - principalmente no interior do Estado, onde muitas vezes policiais precisam se deslocar mais de 100 quilômetros até encontrar um município com delegacia aberta no horário noturno ou fins de semana e feriados. Isso sem contar o tempo de espera para que o delegado plantonista receba os envolvidos no caso. 

Ou seja, há gasto de recursos, como combustível, e a cidade de origem do efetivo ainda fica desprotegida enquanto os policiais não retornam da delegacia. 

Questionada pela coluna Segurança, a assessoria da SDS disse que o tema não está sob avaliação no momento. "Em Pernambuco, a única operativa responsável por lavrar os Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCOs) é a Polícia Civil", disse a breve nota. 

Apesar da resolução do TJPE e das decisões recentes do STF, o presidente da Comissão de Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil - seccional Pernambuco (OAB-PE), José Luiz Galvão tem opinião divergente. 

"Entendo que a resolução do TJPE seja inconstitucional, porque, apesar de o TCO ser um procedimento simples, ele é investigativo. Então seria uma atribuição apenas da Polícia Judiciária, que é a Polícia Civil. O policial militar pode até fazer o acompanhamento dos envolvidos à delegacia, mas a lavratura do TCO precisa ficar com a Polícia Civil, que vai ouvir testemunhas e chegar a um entendimento", disse. 

Em nota, a assessoria do TJPE reforçou que a resolução nº 432, de 18 de junho de 2020, segue em vigor. "Os juízes de direito de Pernambuco continuam autorizados a recepcionar TCOs lavrados por policiais militares, rodoviários federais e ferroviários federais."

O tribunal destacou que, além da jurisprudência do STF, o procedimento ainda conta com posicionamento favorável do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), no sentido de que o Ministério Público pode firmar convênios e termos de cooperação, permitindo a lavratura de TCO por outras polícias, que não as judiciárias.

EM SÃO PAULO, ANÚNCIO DA ADOÇÃO DA MEDIDA GEROU CRISE 

No mês passado, o governo de São Paulo chegou a anunciar que os policiais militares iriam lavrar TCOs. Mas a medida não foi bem aceita pelo Conselho da Polícia Civil do Estado, que argumentou que isso enfraqueceria o trabalho dos policiais civis. 

Diante das críticas, a gestão estadual voltou atrás e anunciou a criação de um grupo de trabalho para avaliar a possível implementação. Os estudos estão sendo feitos com dois policiais civis, dois policiais militares e dois peritos da Polícia Técnico-científica. 

Enquanto há queda de braço em São Paulo, o governo de Alagoas comemorou recentemente os resultados da adoção da medida. Em um ano, 1 mil TCOs foram confeccionados por policiais militares. Além de avaliar que já houve uma economia de R$ 650 mil com o fim dos deslocamentos nos casos de crimes de menor potencial ofensivo, a gestão estadual disse que o uso de um sistema eletrônico para os registros trouxe mais agilidade ao trabalho da PM. 

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