Funase do Cabo de Santo Agostinho, marcada por rebeliões e mortes, é desativada

Unidade que chegou a contar com quase 400 adolescentes e jovens, quase 3 vezes acima da capacidade, foi fechada de vez nesta quarta-feira (8)

Publicado em 08/01/2025 às 15:17 | Atualizado em 08/01/2025 às 15:19
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Após anos de cobrança do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) e até do Conselho Nacional de Justiça, o Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) do Cabo de Santo Agostinho, localizado no Grande Recife, foi totalmente desativado nesta quarta-feira (8). 

A unidade, que compõe a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase), tem histórico de superlotação, rebeliões e mortes chocantes - adolescentes foram decapitados em várias situações no início da década passada. 

A diretora-presidente da Funase, Raissa Braga, já havia anunciado a desativação do Case em entrevista ao JC em agosto do ano passado. Na ocasião, ela disse que o fechamento faz parte da reestruturação que está sendo desenhada para o sistema socioeducativo em Pernambuco. 

"Realizamos uma análise cuidadosa do entorno para identificar ações que pudessem fortalecer a socioeducação. Esse processo foi conduzido de forma planejada e com ações sistemáticas, o que resultou em uma concretização sem intercorrências que comprometessem a execução do plano ou resultassem em episódios de violência", declarou Raíssa, nesta quarta-feira. 

Atualmente, a Funase conta com nove unidades de internação, com público-alvo entre 12 a 21 anos incompletos. A população é de 287, mas a capacidade chega a 427, ou seja, não há mais superlotação. Os socioeducandos que ainda permaneciam na unidade do Cabo foram realocados para o Case Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes. 

No último ano, cerca de 60 permaneciam nessa unidade do Cabo que foi desativada - mesmo número da capacidade máxima. O centro já chegou a contar com quase 400 adolescentes e jovens. A superlotação, na época, resultou no descontrole do Estado para evitar atos de violência.

VIOLÊNCIA E DECAPITAÇÕES 

GUGA MATOS/ACERVO JC IMAGEM
Em janeiro de 2012, Batalhão de Choque foi acionado após três adolescentes serem mortos na Funase do Cabo. Um deles foi decapitado - GUGA MATOS/ACERVO JC IMAGEM

Em um dos episódios, na noite de 10 de janeiro de 2012, três adolescentes foram assassinados durante uma rebelião no Case do Cabo de Santo Agostinho. Dois deles tiveram os corpos carbonizados e outro foi morto por asfixia. Além disso, uma das vítimas foi decapitada. A cabeça foi jogada para fora do muro da unidade.

A unidade tinha capacidade para receber 166 socioeducandos, com idades entre 17 e 21 anos, mas abrigava 368. A governadora Raquel Lyra era a secretária estadual de Criança e Juventude na época - responsável pela Funase.

Denúncias de excessos de violência praticados por agentes socioeducativos e até de adolescentes dando ordens na unidade marcaram os anos seguintes.

"O fechamento do Case do Cabo de Santo Agostinho é um marco histórico. Representa o compromisso do governo do Estado em assegurar os direitos dos jovens socioeducandos, num alinhamento com a política socioeducativa nacional que privilegia meios alternativos de solução de conflitos e a diminuição do modelo voltado para internação", disse o gerente-geral do sistema socioeducativo da Secretaria da Criança e Juventude de Pernambuco, Carlos Diego Souza.

NOVA UNIDADE, MAS COM PROBLEMAS

A superlotação no Case do Cabo diminuiu consideravelmente após a inauguração de outras unidades de internação - inclusive o Case de Pirapama, que fica bem perto. Mas os relatos de maus-tratos e episódios de fugas em massa ainda permaneceram nas duas unidades nos últimos anos.

Em 9 de julho do ano passado, 16 socioeducandos da unidade de Pirapama fugiram por um dos portões. Vídeos mostraram que eles atravessaram a rua principal, entraram numa borracharia e tentaram seguir por um terreno atrás do estabelecimento.

Em nota, a assessoria da Funase afirmou que a desativação da unidade do Cabo é uma ação que faz parte de um plano estratégico iniciado em 2023, "que incluiu a reordenação dos processos internos que abrangeu a responsabilização dos envolvidos em irregularidades, a ampliação do efetivo com agentes socioeducativos capacitados, a reestruturação de vagas e, sobretudo, a implantação do Programa de Combate à Tortura e Tratamentos Degradantes". 

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