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A vida é personagem principal na segunda temporada de 'Entendeu ou Precisar Desenhar?'

Produção franco-canadense retorna ao catálogo da Netflix com enredo mais denso e personagens mais maduras

Nathália Pereira
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Nathália Pereira
Publicado em 01/12/2020 às 7:00 | Atualizado em 18/01/2021 às 15:17
NETFLIX/DIVULGAÇÃO
Relação entre as três protagonistas é posta em jogo após a reação impensada de uma delas a um crime - FOTO: NETFLIX/DIVULGAÇÃO

Com a participação da Netflix na distribuição mundial, a segunda temporada de Entendeu ou Precisa Desenhar? entregou ainda mais do que o final da primeira gama de episódios prometia e com um mês de antecedência, já que a previsão era de que chegasse ao Brasil apenas em dezembro. A série franco-canadense, idealizada por Florence Longpré e exibida originalmente pelo canal Téle-Québec, voltou no início de novembro ao streaming, depois de oferecer nos dez primeiros capítulos a apresentação da dramédia sustentada pela forte relação entre três melhores amigas: Ada, vivida pela própria Florence; Mélissa Bédard, no papel de Fabiola; e Carolanne, personagem de Ève Landry.

Nesta segunda etapa - também com dez partes -, o ponto de partida novamente é a câmera centrada em Ada, submetida a mais uma sessão de justificativas para outra de suas explosões emocionais. O que difere agora do enquadramento primordial, e torna tudo muito mais grave, é que dessa vez a jovem responde por um crime sério, amarga a solidão do abandono de Fabi e Caro e todos os dias descobre que a prisão para onde foi encaminhada sempre desembolsa um jeito de se tornar mais inóspita.

À medida que Ada tenta literalmente sobreviver ao dia a dia na detenção, as outras duas amigas se dedicam às rotinas que chegaram após os acontecimentos do final da última temporada. Fabi trocou de emprego e ganhou mais responsabilidades em relação à sobrinha após uma perda importante. O que surpreende, porém, é o rumo tomado por Carolanne, já que a prisão de Ada está diretamente ligada a ela e às diversas violências das quais é vítima - simbólicas, físicas, psicológicas. O ponto chave na manutenção da vida cruel que leva está mais presente do que nunca, no entanto.

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Dessas agressões sofridas pela personagem deriva ainda sua reaproximação da mãe, com quem divide certa docilidade, confissões e o entendimento de quem compartilha do mesmo tipo de algoz. O silêncio da matriarca e sua incapacidade de reconhecer a prisão psicológica para a qual foi socializada são diretamente refletidos na filha, que amarga as mesmas algemas da geração anterior. Juntas, elas engatinham na direção do que pode ser o caminho da salvação.

Aqui se percebe bem a manutenção da linha narrativa adotada anteriormente em Entendeu ou Precisa Desenhar?, que arrasta o espectador pelas mãos sem dó e quase a contragosto por um despejo dos temas mais cruéis, pela complexidade e sustentação estrutural, sem sequer passar perto de uma saída para aquilo. O elo que antes servia de respiro, a amizade das três protagonistas, está, a princípio, suspenso, mas os poços em que cada uma se mete à própria sorte parecem não encontrar fundo. Chegam a incomodar as sequências em que andam indiferentes, sem esboçar lembranças do que um dia foram.

A importância da relação que mantinham fica ainda mais escancarada com o uso dos flashbacks que ilustram a entrada das jovens mulheres na adolescência. A carência de suporte já existia desde então - com a sugestão de nunca ter sido diferente -, colaborando para a quase total ausência de referências sobre como tomar as rédeas da própria existência e para a naturalização das mazelas da periferia de Québec. O mundo de Fabi, Ada e Caro existe somente ali. Este fato, inclusive, é fio de uma das sequências mais cômicas da temporada, quando Ada, já de volta às ruas, discute com o namorado quando ele questiona sua inteligência e sugere que seja ignorante em relação ao que existe além dos quarteirões acinzentados do bairro em que sempre viveu.

Um dos trunfos da série é justamente passear com facilidade entre a comicidade que alcança o constrangimento e a desgraça crua. É preciso olhar atento para captar a sequência sugerida por uma cena. Não por ter um roteiro complexo, mas pela direção e cortes rápidos e ágeis em episódios com média de vinte minutos. Tudo acontece quando é preciso, mas, nessa segunda temporada, com mais densidade de contextualização - daí a escolha por batizar os três primeiros episódios com os nomes de suas protagonistas.

Por já se conhecer a espinha dorsal da personalidade de cada uma delas, é fácil torcer pelo que, para o espectador, é o caminho mais óbvio para que deem certo na tentativa de viverem com menos sobressaltos, mas racionalidade, assim como na vida real, nem sempre é o que as acompanha mais de perto. Disso é que se alimenta o curso final que, caso repita a fórmula anterior, abriu novo e bom gargalo para mais uma temporada.

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