TECNOLOGIA

NFT: Tendência conquista mercado das artes e aponta para o futuro da internet

Registros digitais já estão sendo vistos em galerias do metaverso, leiloados por artistas como Hermeto Pascoal e podem ganhar cada vez mais relevância com as transformações da web

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Cadastrado por

Emannuel Bento

Publicado em 04/02/2022 às 20:47 | Atualizado em 08/03/2022 às 16:55
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Em uma espécie de ritual, um coletivo de artistas dos Estados Unidos queimou, em julho de 2021, uma pintura de Pablo Picasso ("Fumeur V", de 1964) para o registro da obra em um "token não-fungível", ou simplesmente "NFT". O ato foi muito mais um golpe de marketing, é claro, pois não é necessário queimar nada para realizar o registro. Mas esse ocorrido serviu para evidenciar a dimensão que esse mercado ligado às criptomoedas vem ganhando no mundo das artes.

O termo "NFT" virou uma tendência durante a pandemia, logo quando chegou no mercado das artes visuais - incluindo aí obras de artistas, imagens, gifs e memes. No universo dos investimentos, um "token" representa um registro digital de um ativo financeiro por meio de criptografia. O NFT é um token é "não-fungível" por ser algo único, que não pode ser substituído. Assim, a tendência trata-se de uma chave criptográfica que certifica a originalidade ou autenticidade de algo.

Os compradores se tornam donos daquele conteúdo no universo do blockchain, um sistema onde todos os registros são computados com segurança. No último ano, explodiu um certo colecionismo em torno desses registros. Recentemente, Neymar chamou a atenção após comprar dois NFTs por R$ 6,2 milhões e Justin Bieber comprou outro da mesma coleção por R$ 6,9 milhões. São ilustrações da série "Bored Ape", que trazem um macaco em diferentes tonalidades e adereços.

Mas por que essas pessoas têm comprado os NFTs? Para além do colecionismo em um universo digital, existe uma grande expectativa de que esse investimento se valorize cada vez mais por conta das transformações da internet. Quem viu a internet dos anos 1980 não imaginava o que ela se tornou hoje, então no futuro esses registros podem ter as mais diversas finalidades. O céu é o limite.

REPRODUÇÃO
NFT "Bored Ape Yatch Club", comprado por Neymar, faz parte de uma coleção com 10 mil artes digitais únicas de "macacos entediados" - REPRODUÇÃO

"Isso é um passo extremamente importante porque o mercado da internet surgiu com um aspecto totalmente informal", explica Ricardo Souza, especialista em investimento e CEO da BeYou Education. "No começo, não tinha vantagem você postar alguma coisa, porque alguém poderia copiar e você não tinha como comprovar se não fosse ligado a uma editora ou gravadora. Por que o NFT é monstruoso? O mundo das criptomoedas não tem barreiras, é possível fazer transações internacionais, sem taxas de câmbio ou pagamento de registro de marca. Isso tudo ocorre numa plataforma."

Apesar das compras dos registros, ainda não é possível, por exemplo, saber quem tem usado o conteúdo na internet. Ricardo Souza acredita que o NFT é um primeiro passo para o crescimento de uma bolha. “Se essa cultura se tornar uma rede social, por exemplo, existirá um site onde as pessoas vão postar tudo o que têm. A obra de um artista plástico, uma música. Existe um valor nesses itens colecionáveis”, continua o especialista.

"A geração mais nova já entende essa dinâmica, basta ver como eles valorizam os avatares e os 'skins' de games como League of Legends. É uma lógica meio similar. Se o Neymar tem uma coleção de relógios, só quem é próximo dele sabe disso. Nesse novo mundo, as pessoas podem ver os ativos de NFTs que ele tem, como um museu digital do Neymar. As pessoas gostam dos holofotes, então gostam disso" exemplifica.

Arte no metaverso

Uma das possibilidades de utilização do NFT que já vem ocorrendo é a sua presença no metaverso, realidade virtual que pode ser acessada com algum objeto, como óculos de realidade virtual. Esse conceito ganhou popularidade após o anúncio de mudança do nome da empresa Facebook. Ao entrar no metaverso, o usuário poderia ver a NFT como uma obra de arte pregada numa parede, por exemplo.

GLENN HARVEY/THE NEW YORK TIMES
E lá vamos nós de novo: a realidade virtual, agora apelidada de "metaverso", é a grande promessa. O mesmo acontecerá com a casa inteligente. (Glenn Harvey/The New York Times) - GLENN HARVEY/THE NEW YORK TIMES

Isso já vem sendo feito por projetos como a Xepa.Gallery, plataforma em que o produtor cultural fluminense Gabriel Saito, 32, faz parte. Além de um portal para comercialização de obras em NFT, foi criado o Xepa World, um metaverso em que algumas obras podem ser encontradas. O metaverso pode ser acessado pelo computador ou por óculos de realidade virtual. Para quem já tiver certa intimidade com o conceito, é possível agendar a visita através do site xepa.gallery/visita-guiada.

O metaverso também pode ser acessado com óculos de realidade na galeria Objectos do Olhar, localizada Rua Augusta, 837, em São Paulo, em São Paulo. "No final do ano passado várias empresas importantes começaram a migrar pro metaverso, então o NFT vem ganhando cada vez mais destaque. Estamos numa comunicação muito grande de prospecção de novos artistas. No Brasil todo já existem artistas que trabalham nesse formato e estão criando carreira dentro do NFT."

A Xepa trabalha com artistas como Angela Od (Rio de janeiro), Beatriz Belo (Amapá), Check (São Paulo), Lumanzin (São Paulo) e Rafa Prood (Brasília).

NTF na música

Ativos na área musical também já estão sendo vendidos ou leiloados como NFT. Em junho de 2021, três festivais brasileiros se uniram para comercializar tokens que dão entrada livre em qualquer evento que seja realizados pelas marcas. Foram eles: o pernambucano Coquetel Molotov, Bananada (Goiânia) e DoSol (Natal). Essa iniciativa previu uma tendência também aderida pelo Coachella, famoso festival dos Estados Unidos.

A ação foi possibilitada pela Phonogram.me, especializada em NFT no âmbito musical e uma das poucas empresas brasileiras a possuir a sua própria plataforma para registros - a outra empresa é a do influenciador e youtuber Felipe Neto.

Além da ação dos festivais, a Phonogram.me lançou para leilão um NFT da Elza Soares, lenda do samba que faleceu em janeiro - ela ainda estava viva quando aceitou o projeto. Trata-se do registro de "Drão", uma canção rara que passou 30 anos perdida. O arrematante poderá ter 30% dos direitos conexos - que diz respeito a verbas de execução pública, entre outras. O mesmo está sendo feito com um NFT de "Pelados em Santos", do Mamonas Assassinas.

PHONOGRAM.ME
NFT de "Pelados em Santos", com direitos conexos do Dinho, à venda na plataforma Phonogram.me - PHONOGRAM.ME

Uma outra iniciativa envolve Hermeto Pascoal. O célebre instrumentista transformou partituras em NFTs. Os compradores podem usar essas partitutas em singles e álbuns, desde que citem o compositor.

"É um modelo de negócios onde não existe um limite do que pode ser registrado. É interessante pensar como esses ativos musicais podem se conectar com os ativos digitais", diz Janara Lopes, sócia da Phonogram.me. "Neymar está comprando imagens, mas é complicado para as pessoas entenderem qual o benefício desse negócio. Por isso, nós damos algumas exclusividades, como os direitos da Elza Soares e do Hermeto Pascoal."

A empreendedora antecipa algumas conversas com artistas como Tulipa Ruiz, que deve criar um banco de beats através do registro NFT. Também existem conversas com nomes grandes do sertanejo e do trap. "É possível criar diversos produtos, desde lançar uma faixa até liberá-la inteira para uso comercial. Surge uma nova forma de rentabilizar, dando a chance do artista independente ter uma negociação direta com compradores", finaliza.

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