PATATIVA DO ASSARÉ

20 anos sem Patativa do Assaré: leia cinco poemas do poeta popular

Patativa do Assaré foi um dos principais representantes da arte popular nordestina do século 20

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Emannuel Bento

Publicado em 08/07/2022 às 11:20 | Atualizado em 08/07/2022 às 11:20
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Há exatos 20 anos, em 8 de julho de 2022, morria o poeta cearense Patativa do Assaré. O artista popular faleceu aos 93 anos de parada cardíaca. Ele também foi cantor, compositor e repentista, sendo um dos principais representantes da arte popular nordestina do século 20.

Filho de agricultores, ele perdeu a visão de um dos olhos ainda criança e só frequentou a escola durante quatro meses.

Patativa do Assaré nasceu em 1909 na Serra de Santana, a 18km de distância da cidade de Assaré, no Sul do Ceará. Foi criado numa casa de taipa. Aos 16 anos, comprou uma viola e começou a cantar. Apesar da fama, ele nunca ganhou dinheiro com a poesia.

"Eu sou o poeta que digo: 'Sou poeta popular, sou simples, sou humilde e sempre onde eu vou rimar, o principal tema é Deus.' Deus fez a grande natureza com tudo quanto ela tem. Mas não passou escritura da terra para ninguém", escreveu Patativa em um dos seus versos.

Relembre cinco poemas de Patativa do Assaré:

Eu e o Sertão

Sertão, argúem te cantô,
Eu sempre tenho cantado
E ainda cantando tô,
Pruquê, meu torrão amado,
Munto te prezo, te quero
E vejo qui os teus mistéro
Ninguém sabe decifrá.
A tua beleza é tanta,
Qui o poeta canta, canta,
E inda fica o qui cantá.

O que mais dói

O que mais dói não é sofrer saudade
Do amor querido que se encontra ausente
Nem a lembrança que o coração sente
Dos belos sonhos da primeira idade.
Não é também a dura crueldade
Do falso amigo, quando engana a gente,
Nem os martírios de uma dor latente,
Quando a moléstia o nosso corpo invade.
O que mais dói e o peito nos oprime,
E nos revolta mais que o próprio crime,
Não é perder da posição um grau.
É ver os votos de um país inteiro,
Desde o praciano ao camponês roceiro,
Pra eleger um presidente mau.”

O Peixe

Tendo por berço o lago cristalino,
Folga o peixe, a nadar todo inocente,
Medo ou receio do porvir não sente,
Pois vive incauto do fatal destino.

Se na ponta de um fio longo e fino
A isca avista, ferra-a inconsciente,
Ficando o pobre peixe de repente,
Preso ao anzol do pescador ladino.

O camponês, também, do nosso Estado,
Ante a campanha eleitoral, coitado!
Daquele peixe tem a mesma sorte.

Antes do pleito, festa, riso e gosto,
Depois do pleito, imposto e mais imposto.
Pobre matuto do sertão do Norte!”

O Poeta da Roça

Sou fio das mata, cantô da mão grosa
Trabaio na roça, de inverno e de estio
A minha chupana é tapada de barro
Só fumo cigarro de paia de mio

Sou poeta das brenha, não faço o papé
De argum menestrê, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola
Cantando, pachola, à percura de amô

Não tenho sabença, pois nunca estudei
Apenas eu seio o meu nome assiná
Meu pai, coitadinho! vivia sem cobre
E o fio do pobre não pode estudá

Meu verso rastero, singelo e sem graça
Não entra na praça, no rico salão
Meu verso só entra no campo da roça e dos eito
E às vezes, recordando feliz mocidade
Canto uma sodade que mora em meu peito"

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