Ida de Raphaela Santos para escritório de Safadão pode fortalecer o brega no Nordeste?

Movimentação reforça a nova força digital do brega romântico e levanta questões sobre estratégias de produtoras cearenses no mercado musical

Publicado em 28/11/2024 às 14:05 | Atualizado em 28/11/2024 às 14:16
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A cantora Raphaela Santos, principal voz do brega pernambucano na atualidade, surpreendeu fãs, público e o mercado da música local ao anunciar que está de mudança para a Camarote Shows, escritório artístico de Wesley Safadão sediado em Fortaleza (CE).

Até então, Santos era uma artista da RME Produções, a mesma produtora de Priscila Senna, outro forte expoente do brega local, com quem mantinha um projeto chamado "Juntas e Misturadas". Um registro audiovisual grandioso da dupla, gravado em Caruaru, foi engavetado com a sua saída.

A própria Priscila Senna também já esteve no escritório de Xand Avião, a Vybbe, quando emplacou um sucesso com Zé Vaqueiro. A parceria se encerrou neste ano.

Esses movimentos levantam questões: por que produtoras cearenses têm investido em artistas de brega? Estaríamos diante de uma nova fase de maior visibilidade para o brega romântico no Nordeste?

Possibilidades

Especialistas apontam diferentes possibilidades para esse fenômeno. Uma delas é a tentativa das produtoras de expandirem seu alcance geográfico, investindo em talentos de ritmos além do forró estilizado, historicamente hegemônico no Ceará.

Outra hipótese, mais polêmica, sugere que esses escritórios busquem, em alguns casos, neutralizar o crescimento de novos fenômenos, mantendo-os sob controle em uma espécie de "reserva de mercado".

Independentemente das intenções, é inegável que o brega pernambucano vive um momento inédito de exposição graças à força das plataformas digitais.

Viralização

O publicitário João Vidal, que atuou como coordenador artístico na plataforma de streaming Sua Música, aponta para uma mudança no mercado da região após a pandemia.

"Houve um movimento grande de viralização de músicas que não eram do forró, mas como o forró sempre fez regravações desses outros ritmos, houve essa conexão. Historicamente, muitos sucessos do forró estilizado foram bregas, como ‘Ânsia’, da Calcinha Preta, que originalmente era da Banda Brega.Com", diz.

"Nos últimos anos, essa força na internet passou a ditar cada vez mais as atrações dos grandes eventos. Essas personagens de Pernambuco, como Raphaela ou Priscila, ficavam dentro de uma bolha, mas vêm gerando mais interesse a partir dessa força digital, incluindo até eventos promovidos por figuras como Carlinhos Maia”, continua.

Ela cita, por exemplo, que o arrocha nunca esteve tão forte no Ceará, em contraste com o que ocorria no passado. “O Natanzinho Lima é um artista do arrocha que vem rompendo barreiras e gravou um DVD aqui em Fortaleza. Isso abre precedente para explorar outros ritmos”, diz.

Cover

O professor Thiago Soares, autor de "Ninguém é Perfeito e a Vida é Assim: A Música Brega em Pernambuco" (2017), reforça uma entrada do brega romântico nas dinâmicas digitais de viralização.

Ele cita o caso de "Meio Termo", um cover de Luan Santana feito por Raphaela Santos, que viralizou antes de ser retirado do ar por questões de direitos autorais.

"O cover foi retirado do ar pela gravadora do sertanejo por estar crescendo muito. Essa polêmica talvez tenha reposicionado a Raphaela dentro desse mercado de músicas virais. O brega romântico entrou nessa seara de práticas digitais de viralização e ‘memetização’, algo que antes estava muito atrelado ao brega-funk apenas."

'Reserva de mercado'

O motivo da saída de Priscila Senna da Vybbe, de Xand, nunca chegou a ser externado para o público. Apesar disso, fãs costumam defender que a cantora não foi priorizada entre os demais artistas da produtora.

Uma fonte em reserva comenta que, às vezes, produtoras contratam artistas para os manter em sua zona de influência, não furem bolhas nem compitam com os seus próprios artistas, como uma espécie de "reserva de mercado".

"Isso ocorria no passado, mas talvez agora os escritórios cearenses estejam querendo ter vários tentáculos pelo Brasil, atendendo a um maior número de cidades", diz.

Arquivo Pessoal
Priscila Senna e Raphaela Santos, apostaram em looks prateados para a gravação do seu DVD - Arquivo Pessoal
@romilsonoficial/Divulgação
Cantora Raphaela Santos - @romilsonoficial/Divulgação
Divulgação
Priscila Senna Raphaela Santos, hoje, em Jaboatão - Divulgação

No caso de Priscila e Raphaela, o publicitário João Vidal aponta que é preciso considerar que esse mercado também é difícil para as mulheres. "É comum culparem a produtora ou o artista quando os objetivos não são alcançados, mas o sucesso de uma carreira depende de muitas variáveis", conta.

"As mulheres precisam lançar um hit, sustentar e sofrer pressões mercadológicas de vários lados. A Mari Fernandez talvez seja a maior mulher desse mercado do Nordeste hoje, mas, no geral, é difícil para elas."

Tradição

Apesar dos inúmeros desafios, Thiago Soares aponta para uma vantagem do brega: uma profunda ligação com a música romântica, que tem um enraizamento na cultura brasileira - estando presente em gêneros como o sertanejo.

"Em outro caso recente, a parceria de Liniker com Priscila Senna, notamos que o brega torna-se uma novidade acionando outros gêneros consagrados, como a cumbia e os ritmos latinos, com uma música tropical latina. Acho que isso é interessante e pode destacar mais o brega como música nacional. A parceria 'Pote de Ouro' me remete a 'La Fama', da Rosalía com o The Weeknd."

Enquanto o brega pernambucano se beneficia dessas novas exposições, permanece a expectativa sobre os próximos passos das artistas e como essa nova fase poderá impactar o cenário do brega romântico no Nordeste e além.

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