Quando a pandemia da covid-19 chegou, o Brasil foi obrigado a pensar sobre como a baixa cobertura de saneamento e acesso à água tratada seria um desafio a mais no combate ao novo coronavírus. Nos últimos anos os indicadores avançaram, mas o ritmo tem sido lento para dar conta da demanda. Com uma população de 209,5 milhões de habitantes, o País tem um número alarmante de 100 milhões de pessoas sem coleta de esgoto e de 35 milhões sem acesso a água tratada.
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Na quarta-feira (24), o Senado aprovou o novo marco regulatório para o saneamento básico no Brasil. O projeto busca universalizar o saneamento básico até 2033, com a entrada da iniciativa privada nas concessões municipais. A projeção é de investimentos entre R$ 500 bilhões e R$ 700 bilhões para a universalização, com a geração de 1 milhão de empregos. Diante desse volume de recursos, o marco está sendo considerado um remédio não só à saúde básica da população, mas também à economia no pós-pandemia. Pernambuco, que não foge à regra nacional de déficit nos serviços de água e esgoto, estima a necessidade de investimento de R$ 14 bilhões para garantir a universalização.
O projeto estava em tramitação no Congresso Nacional há quase dois meses, mas a emergência da retomada econômica fez com que o Senado votasse o tema em meio à pandemia. Agora é aguardar a sanção pelo presidente Jair Bolsonaro. As empresas privadas podem participar das licitações para disputar uma concessão de 30 anos, mas isso não excluiu a presença das companhias estaduais, que também poderão participar dos processos.
A presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), Manuela Marinho, comemora a nova regulação do setor, mas faz algumas ponderações. “Essa mudança já era esperada há bastante tempo, mas agora passará a ser uma realidade. De qualquer forma, o saneamento é um monopólio natural e o Estado vai continuar podendo participar. Duas questões que é preciso ficar atento é sobre a regulação da tarifa para que não aumente muito como aconteceu com a energia elétrica e a outra é ter um olhar social para os municípios, porque nem todos são superavitários.
Vamos acompanhar como virá o texto da sanção do presidente e o texto da regulação”, alerta.
Segundo dados da Compesa, da população total de 9,5 milhões de habitantes do Estado, apenas 26,4% dos moradores urbanos têm acesso a coleta e tratamento de esgoto. No caso do serviço de água tratada esse percentual sobe para 92,1%. Dos 184 municípios pernambucanos, a Compesa opera em 172, além do arquipélago de Fernando de Noronha. Apenas 11 não são atendidos pela Companhia e operam com sistemas próprios.
Manuela Marinho diz que o governo não tem nada contra as concessões até porque a Compesa mantém uma das maiores Parcerias Público-Privadas de Saneamento do País, junto com a BRK Ambiental no projeto Cidade Saneada. O projeto prevê investimentos totais da ordem de R$ 6,7 bilhões, beneficiando mais de 6 milhões de pessoas nos 15 municípios da Região Metropolitana do Recife. Até o momento, já foram investidos R$ 1,4 bilhão, já são tratados o volume de 2 mil litros por segundo de esgoto, com 40% de cobertura na RMR. A meta é chegar a 75% em 2030 e a 90% em 2037, segundo a empresa. “Nos próximos 2 anos vamos dar uma salto no abastecimento RMR. Temos 11 obras em andamento e esses resultados serão percebidos em breve”, afirma.
MERCADO
O diretor executivo da Abcon - associação das operadoras privadas de saneamento, Percy Soares Neto defende que o marco será um avanço importante para o setor. “O setor será melhor regulado por meio da ANA (Agência Nacional de Águas), terá mais competição e vai acabar com a reserva de mercado que existe hoje das companhias estaduais. Também é preciso deixar claro que ninguém é obrigado a fazer privatizações. Essa é uma ideia errada do marco. O prefeito vai poder escolher quem ele quer que forneça o serviço e aí pode ser uma empresa privada ou as companhias estaduais”, explica o executivo.
Já a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) acredita que o novo marco abre espaço à contestações jurídicas. “O marco traz uma medida muito dura, que é obrigar os municípios a aderir ao modelo sob pena de perder acesso a recursos públicos e federais. Isso é uma medida autoritária e que poderá ser contestada porque a responsabilidade do saneamento é dos municípios, observa o diretor da Abes, Alceu Guérios Bittencourt.
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