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Como o isolamento social está modificando os hábitos de consumo dos pernambucanos

Pesquisa inédita no Estado mostra que os pernambucanos estão se adequando a viver com menos e a valorizar produtos e serviços que fazem diferença no dia a dia

Edilson Vieira
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Edilson Vieira
Publicado em 12/06/2020 às 21:41
FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Segundo a organização, o segmento de supermercados possui, em Pernambuco, de acordo com dados de 2020, 19.745 contribuintes ativos - FOTO: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Depois de mais de 80 dias de confinamento, o que mudou nos hábitos de consumo do pernambucano? E o que os fabricantes, comerciantes e prestadores de serviço podem aprender com isso para garantir a sobrevivência e o sucesso de seus negócios no futuro? Diversas empresas globais como Google, Kantar e KPMG começaram a estudar o comportamento de compra nas grandes cidades durante a pandemia de covid-19. Em Pernambuco, a Anima, empresa local de inteligência de marca, fez uma pesquisa através de Whatsapp com homens e mulheres residentes no Estado para investigar o que o pernambucano está consumindo e o quais serão os hábitos de consumo que irão permanecer após o fim do isolamento social.

Fernando Lima, diretor da Anima, explica que, a partir da análise dos resultados é possível traçar as tendências de consumo, oferecendo a oportunidades das marcas avançarem em suas estratégias de vendas. “O consumidor está tendo muito tempo para repensar como compra e porquê compra. E ele vai preferir continuar comprando aquilo que fez algum sentido pra ele. Que vai ajudá-lo a viver melhor e fazer diferença no seu dia-a-dia”, resumiu Fernando. Foram ouvidas 300 pessoas, 70% delas residentes na Região Metropolitana do Recife, onde está o maior índice de consumo. A grande maioria dos pesquisados (70%) são mulheres e 30% homens com idade a partir de 20 anos e renda entre R$2.090 e acima de R$10.450.

Alguns caminhos apontados pela pesquisa mostram uma demanda crescente da digitalização na relação empresa-consumidor, consolidando o digital como meio para compras, lazer e trabalho. A tecnologia passa a ser ainda mais relevante. Outro item observado foi aumento no consumo de produtos de limpeza da casa por conta dos cuidados redobrados com a higiene. O fato de as pessoas estarem cozinhando mais em casa por conta do fechamento dos restaurantes, é outra tendência que pode se consolidar como hábito pós pandemia, mesmo porque a crise financeira e os cuidados com a saúde devem continuar por um bom tempo.
Ainda segundo a pesquisa feita pela Anima, quase 60% das pessoas, apesar de conformadas em relação ao isolamento, estão valorizando mais as relações pessoais. Chama a atenção que para 1/3 dos entrevistados a situação parece confortável, desde que possam fazer uso da tecnologia. E apenas 7% dos entrevistados admitiram forte desejo de viver intensamente pós pandemia com gastos voltados para diversão e cuidado com a aparência.

Talita Senna, executiva da área comercial, é um dessas pessoas que, por conta da quarentena precisou fazer uma imersão em processos que antes delegava. “Tive que liberar a empregada de casa, então eu assumi esse papel, além do trabalho em home office e ainda acompanhar as tarefas escolares dos meus filhos. Meu consumo está muito restrito as necessidades básicas de limpeza e alimentação e tudo o que for mais funcional”, definiu. Talita conta que percebeu ser possível realizar as tarefas da casa de maneira mais eficiente utilizando coisas que já existem no mercado. O escovão giratório substituiu o velho pano de chão e produtos de limpeza podem ter usos múltiplos. Talita, ao botar a mão na massa, descobriu que um desinfetante também serve para retirar o mofo das paredes. Ela acha que a indústria poderia aproveitar o que as pessoas estão falando sobre seus produtos. “Cheguei a postar minhas descobertas nas redes sociais, marcando os fabricantes e lojas”, diz Talita.

Para Fernando Lima, da Anima, as empresas não estão aproveitando o aprendizado que esse momento atípico está proporcionando. “O consumo de água sanitária, por exemplo, disparou. Mas o que tem de novo ou diferente no produto que atraia o consumidor para determinada marca? Algumas estão reforçando nas que o produto elimina 99,9% das bactérias. Já é alguma coisa, mas ainda é pouco”. Fernando acha que o mercado poderia estar investindo mais em artigos diferenciados. “Por exemplo, produtos de limpeza para casas com animais de estimação ou que tenham bebês. São segmentos que já tem demandas e que vão bombar”, diz o estrategista.

COZINHA E INTERNET

Cozinhar em casa e comer mais saudável são outras tendências apontada pela pesquisa. A grande maioria (84,3%) pretende continuar fazendo refeições caseiras, junto com a família. O que só aumenta o desafio do empresário, dono de restaurante, a manter o faturamento depois da reabertura. A solução, mais uma vez, passa pela criatividade, diz Fernando Lima. “Existe um novo movimento neste setor que é o de juntar os insumos e mandar para o cliente cozinhar em casa. O restaurante faz uma parte e o cliente finaliza o prato. Alguns bares no Recife já estão fazendo isso. É interessante porque leva a experiência do restaurante para a residência do cliente e o dono do negócio não deixa de vender”, avalia Fernando que complementa: “a reinvenção passa por adequação. Não precisa começar do zero. Se todo mundo pensar assim o empresário vai conseguir encontrar um filão novo”.

Segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm), o Brasil ganhou quatro milhões de novos consumidores digitais por conta do isolamento social. Ao todo, são 100 milhões, juntando os antigos e novos compradores on-line. Quando a pandemia acabar, parte desses quatro milhões de compradores novatos vai dizer adeus para o computador e voltar a comprar presencialmente, na loja. Mas outra parte vai continuar fiel as compras online porque teve uma boa experiência.

É o caso do publicitário Ricardo Rique. Adepto frequente de serviços digitais de grandes empresas, como ifood e Uber, Rique conheceu uma nova gama de empreendedores digitais durante o isolamento social. “Percebi que os pequenos comerciantes estão organizando seus deliveries, até por necessidade, e estão conseguindo atender muito bem”. Rique está comprando queijos de um tradicional comerciante do Mercado de Casa Amarela que, afirma, conseguiu transferir para o delivery o bom atendimento que sempre teve presencialmente. “Se eu quero um queijo de coalho menos salgado, ele manda. Se eu quero um queijo para assar que não se desmanche, ele tem”. Ricardo Rique conta que começou a criar a cultura de pesquisar novos serviços de entrega. “Foi um momento de descobertas. Do cara da feirinha de orgânicos, ao que entrega cerveja gelada em casa, rápido, e por um preço bom. Se esse pessoal continuar entregando depois da pandemia, eu não me vejo mais saindo de casa para fazer essas compras”, assegurou o publicitário.
O diretor da Anima, responsável pela pesquisa de consumo entre os pernambucanos, explica que o comerciante pós pandemia tem que estar no digital. Ou não vai ser lembrado pelas pessoas.

Mas não basta fazer um site de e-commerce ou organizar um delivery por aplicativo ou rede social, diz Fernando Lima. “O empresário que está entrando nesse mundo do e-commerce agora precisa criar vínculos on-line. Isso muda tudo. É preciso gerar boa experiência para os clientes. E tem que ser uma experiência sensorial. Se possível, ter a vozinha da vendedora. Fazer e-commerce, se incorporar a qualquer market place é comoditie. O resto, é gerar experiencia de compra e também de relacionamento”, ensina.

Consumo em tempos de pandemia

59,3% das pessoas dizem que vão valorizar mais as relações pessoais
33% afirmaram ser possível viver bem mantendo algumas relações a distância, usando o celular ou computador para encontrar as pessoas
22,7% vão prestar mais atenção a própria saúde e ao bem-estar 21,7% aprenderam que podem passar mais tempo em casa cuidando da família e do lar
7% querem voltar a comprar o que desejam, se divertindo e cuidando da aparência, depois que a pandemia passar
69% manterão os hábitos de compra como eram antes da epidemia.
24,7% pretendem comprar mais pela internet
6,3% pretendem comprar mais em lojas físicas.

LIMPEZA

79,3% dão mais valor a produtos de limpeza básicos, como água sanitária e sabão em barra
20,6% esperam que surjam novos produtos
10,3% estão dispostos a pagar um pouco mais por esses produtos

HIGIENE PESSOAL

82,3% pretendem comprar mais álcool em gel
34,7% vão preferir sabonete líquido comum ou bactericida
29% vão ficar com o sabonete comum
52% preferem marcas que já conhecem e confiam
47,3% dão preferência aos produtos eficientes

ALIMENTAÇÃO

84,3% vão comer mais em casa, cozinhando com a família
9% comer mais em restaurantes com amigos e família
4,7% vão preferir pedidos em delivery
2% vão consumir alimentos prontos ou congelados
Fonte: Anima Inteligência de Marcas

Arquivo pessoal/divulgação
Publicitário Ricardo Rique diz que aprendeu muito durante a quarentena. "Descobri serviços de entrega de pequenos comerciantes que funcionam muito bem", diz - FOTO:Arquivo pessoal/divulgação
Pio Figueiroa/Divulgação
Fernando Lima, diretor da Anima Inteligência de Marcas, diz que o consumidor vai preferir as marcas que apoiaram o combate ao coronavírus e tiveram papel relevante na solução dos problemas diários - FOTO:Pio Figueiroa/Divulgação
YACY RIBEIRO/JC IMAGEM
Para a executiva da área comercial, Talita Senna, isolamento social revelou nova rotina e novas opções de consumo. "As empresas deveriam aprender com a nossa experiência", afirmou - FOTO:YACY RIBEIRO/JC IMAGEM

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