A alta no número de casos de
covid-19 no País é um fator de risco para a continuidade do processo de recuperação econômica, com potencial para afetar especialmente o setor de serviços. No entanto, a vacinação em massa da população, que terá efeito gradual sobre a atividade como um todo, pode influenciar o ritmo da retomada da economia brasileira, avalia o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) no boletim Visão Geral da Conjuntura, divulgado nesta segunda-feira, 21.
"A volta do crescimento do número de casos de Covid-19 representa um fator de risco para a continuidade do processo de recuperação econômica. De fato, é possível que a evolução da crise sanitária leve alguns Estados ou municípios a retomarem medidas de restrição a certas atividades econômicas e sociais, desacelerando a retomada em alguns segmentos, notadamente no setor de serviços. Além disso, mesmo na ausência de novas medidas legais de distanciamento social, é razoável esperar que parte da população diminua espontaneamente sua mobilidade, visando reduzir as chances de contágio", ressaltou o documento do Ipea.
O órgão pondera, porém, que os impactos adversos decorrentes de eventuais novas medidas de distanciamento social sobre o nível de atividade serão significativamente menores do que no momento inicial da pandemia. O Ipea ressalta que o choque negativo provocado pela crise sanitária num primeiro momento foi consequência do desconhecimento sobre a doença, da incerteza sobre as políticas governamentais de apoio às famílias e ao setor produtivo, e da falta de perspectivas sobre o desenvolvimento de uma vacina no curto prazo.
"Para 2021, a expectativa de avanço de medidas de imunização em massa da população, por meio de vacinação, pode influenciar o ritmo de recuperação da economia, impulsionando especialmente o setor de serviços", apontou o documento.
O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro crescerá 4,0% em 2021, se o ajuste fiscal for retomado após os gastos extraordinários com a pandemia, projeta o Ipea. A estimativa para o ano de 2020 é de um recuo de 4,3%. "O principal nó da economia brasileira continua sendo o desequilíbrio fiscal", frisou o Ipea.
O órgão aponta que o aumento de gastos para reduzir os efeitos da pandemia deve levar a um déficit primário de 12% do PIB em 2020, levando a dívida pública para cerca de 90% do PIB. "Isso significa que o esforço para reverter a trajetória de crescimento da dívida terá que ser maior do que antes, dados os efeitos permanentes da queda do PIB em 2020 sobre a arrecadação de impostos e o próprio aumento da relação dívida/PIB", alertou o Ipea.
O PIB do quarto trimestre deste ano deve crescer 2,1% em relação ao terceiro trimestre. A atividade econômica mais aquecida no segundo semestre de 2020 deve deixar um carregamento estatístico positivo de 2,7% para o PIB de 2021.
O Ipea ressalta que a recuperação é desigual entre setores, e que os serviços ainda operam significativamente abaixo do patamar pré-crise. O órgão também estima que a maior procura por trabalho em 2021 faça a taxa de desemprego no País alcançar patamares ainda mais elevados antes que comece a cair.
O órgão estima que o PIB industrial suba 5% em 2021, ante uma queda de 3,5% em 2020. O PIB de serviços deve crescer 3,8% em 2021, após recuo de 4,7% em 2020. Já o PIB Agropecuário aumentaria 1,5% em 2021, ante uma alta de 2,3% este ano.
O consumo das famílias deve crescer 3,5% em 2021, depois de uma queda de 6,1% em 2020, enquanto o consumo do governo aumentaria 3,3% no ano que vem, após o recuo de 4,7% neste ano.
A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida dos investimentos no PIB) deve avançar 5,3% em 2021, puxada pelo setor de construção civil, após uma queda de 5,0% em 2020. O Ipea espera que as exportações tenham expansão de 4,9% no próximo ano, enquanto as importações aumentem 5,1%.
As projeções consideram ainda que a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), termine 2020 em 4,4%, mas desacelere a 3,4% no fim de 2021.
A taxa básica de juros, a Selic, encerrará 2021 em 3,00%, enquanto a taxa de câmbio terminará o ano que vem em R$ 5,00.
"Um elemento complicador da situação macroeconômica foi a recente aceleração da inflação, refletindo problemas domésticos localizados, relacionados à oferta de produtos agrícolas específicos, como o arroz, e a forte desvalorização cambial, que impactou preços agrícolas, de insumos e de bens de consumo em geral, conforme captado pelos índices de preços no atacado. Dada a sua natureza, o choque tem caráter temporário, e ocupa o espaço que havia entre a inflação corrente e a meta do Banco Central. Por isso, espera-se que a política monetária continue em terreno expansionista, embora a perspectiva de sua normalização esteja um pouco mais próxima que há alguns meses", justificou o documento do Ipea.
O órgão reconhece que o cenário de curto prazo permanece carregado de incertezas. Uma perspectiva positiva vem da esperada recomposição dos estoques queimados nos últimos meses, que deve garantir uma continuidade dos atuais níveis de produção, a despeito da desaceleração na demanda doméstica por conta do fim do pagamento do auxílio emergencial.
"Entretanto, o agravamento da pandemia nos últimos meses, e o fato de que a vacinação em massa tende a produzir efeitos apenas gradualmente após seu início, pode levar a um novo período de distanciamento social, seja por imposição de novas restrições ou por decisão voluntária, como reação ao aumento do risco de contaminação. Além disso, a evolução da economia no futuro dependerá de forma crucial da percepção quanto ao comprometimento com a disciplina fiscal por parte do governo, do Congresso e da sociedade em geral", concluiu o Ipea.