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Pernambuco vive infestação de mosca-dos-estábulos, que preocupa pecuaristas e pode prejudicar até animais domésticos

O vetor da mosca-dos-estábulos é a cama de galinha, usada como adubo por agricultores na produção de algumas culturas

Adriana Guarda
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Adriana Guarda
Publicado em 14/09/2022 às 7:15 | Atualizado em 14/09/2022 às 17:46
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Mosca-dos-estábulos se alimenta do sangue do gado e pode dar até 40 picadas no animal por minuto - FOTO: Cortesia
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Pecuaristas do Brejo Pernambucano - região entre a Zona da Mata e o Agreste - estimam em R$ 500 milhões por ano o prejuízo com a mosca-dos-estábulos. O inseto, aparentemente inofensivo, provoca a morte de bezerros, diminui a fertilidade das vacas e aumenta a incidência de abortos.

Com nome científico de Stomoxys calcitrans, a mosca se alimenta do sangue dos animais, provocando perda de peso no gado de corte e redução na produção de leite. Em regiões quentes e úmidas elas encontram as melhores condições para se reproduzir.

Em Pernambuco, nove municípios estão enfrentando infestação da mosca-dos-estábulos: Barra de Guabiraba, Bonito, Sairé, Camocim de São Félix, Cortês, Amaraji, Chã Grande, São Joaquim e Ribeirão.

O presidente da União Nordestina da Agropecuária (UNA), José Duarte, diz que o problema existe há pelo menos duas décadas, mas vem se intensificando nos últimos anos.

"O vetor da mosca é a cama de galinha, usada como adubo por agricultores na produção de inhame, cará, banana, tomate e outras culturas", afirma.

A cama aviária, conhecida como cama de frango ou cama de galinha, é um adubo orgânico de baixo custo, utilizado principalmente por pequenos produtores. É composto pelas fezes da galinha, restos de ração, penas e palha de arroz.

"O cheiro forte da cama de galinha é um atrativo para a mosca, sem falar os nutrientes, garantindo as condições ideais para a reprodução. Sem o ambiente adequado, a mosca coloca 400 ovos por postura, mas apenas de 5 a 10 vão eclodir. Já nas condições ideais, eclodem 200", compara o pecuarista e coordenador do braço ambiental da UNA, João Tavares.

Segundo Tavares, no ano passado a infestação da mosca-dos-estábulos durou seis meses. A praga foi detectada primeiro no distrito de Uruçu-Mirim, em Gravatá, e depois foi se espalhando.

"Nossa preocupação é o avanço da mosca para outros municípios, como Ribeirão e Palmares, além de começar a entrar na casa das pessoas, porque ela não ataca só o gado, mas todos os mamíferos, como cavalos, cachorros", alerta Tavares.

Parecida com uma mosca doméstica, mas com uma espécie de ferrão, ela dá até oito picadas por minuto nos animais, provocando ferimentos. Os animais balançam a cabeça e o rabo para espantar e se aglomeram para tentar espantar o inseto. Por enquanto não se encontrou remédio para resolver o problema. A Embrapa, o IPA e instituições acadêmicas buscam alternativas.

Uma das soluções usadas é uma armadilha, conhecida como uma espécie de cola-mosca. Descobriram que a mosca é atraída pela cor azul e usam mantas ou plásticos com substâncias para que elas fiquem coladas quando pousarem.

LEI SÓ NO PAPEL

Em julho deste ano, começou a vigorar a Lei nº 17.890, a partir de Projeto de Lei do Deputado Antônio Moraes (PP), que proíbe a utilização de cama de frango, entre julho e outubro, nos municípios que enfrentaram infestação pela mosca-dos-estábulos. A lei funcionaria como uma espécie de defeso no período de maior incidência da mosca.

Nos bastidores, a informação é que a lei não vem sendo respeitada e que a Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária do Estado de Pernambuco (Adagro) tem feito vista grossa em relação ao uso no período de proibição.

Em ano eleitoral, prefeitos e deputados estariam incentivando os produtores a manter o uso, dizendo que já foi aprovada uma nova lei que derruba o defeso. Na verdade, tramita na Alepe o Projeto de Lei 3606/2022, apresentado pelos deputados Eriberto Medeiros (PSB) e Waldemar Borges (PSB), que libera o uso da cama de galinha, mas estabelece novas regras para tanto.

Questionado sobre a lacuna na fiscalização, o presidente da Adagro, Paulo Roberto Lima, afirma que o trabalho vem sendo feito com base nas denúncias dos pecuaristas, mas que existe um trâmite burocrático da visita do fiscal até a determinação da multa.

A legislação em vigor prevê multa de R$ 1 mil a R$ 50 mil para quem descumprir o período de defeso.

"A região é muito grande e tem cerca de 1,2 mil produtores. Temos fiscais em Bonito, no Agreste, e estamos deslocando pessoal de Recife, Caruaru, Palmares e Garanhuns para atender a demanda. É um processo, porque o fiscal vai na propriedade e, se constatar a infração, o agricultor é autuado, aí tem um tempo de defesa e, no final, é que se estabelece a multa", justifica Lima.

ENVOLVIDOS

Na discussão sobre a infestação por inseto na pecuária, a mosca-dos-estábulos não é a vilã. A dificuldade está em equilibrar os interesses dos pequenos agricultores, dos pecuaristas e dos aviários (integradores e integrados).

A cama de frango é um subproduto da avicultura, comercializado pelos pequenos aviários (integrados) aos agricultores para complementar sua renda. Enquanto para os produtores é um adubo de baixo custo e indispensável à produção.

"A discussão sobre a cama de galinha precisa colocar todos esses atores na mesa. Inclusive o grande avicultor (integrador), que fornece cama de galinha, pinto de um dia e ração ao integrado. Ele precisa ser corresponsável por essa cama de frango, que vai seguir do seu integrado (pequeno que entra com o galpão, água e energia para produzir) e será vendida ao produtor. Precisa participar para que o manejo seja feito de forma correta", observa o pecuarista Celso Muniz Filho.

Produtor de gado de corte em Barra de Guabiraba, Muniz alerta que o Projeto de Lei em tramitação na Alepe praticamente reproduz a Portaria 031/2014, que já estabelecia exigências no transporte e manejo da cama de frango para evitar infestações.

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