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Entenda o que é a SAF, modelo de gestão em alta no futebol brasileiro e que Náutico, Santa Cruz e Sport podem aderir

Cruzeiro, Botafogo e Vasco foram os primeiros clubes no Brasil a aderirem à Sociedade Anônima de Futebol

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Filipe Farias

Publicado em 27/02/2022 às 9:57
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Nos últimos meses, um tema tem sido bastante recorrente nos noticiários esportivos, nos debates de mesas redondas de futebol e, até mesmo, entre os torcedores: a SAF. Mas o que significa essa sigla e por que essas três letras vêm agitando tanto os bastidores dos clubes brasileiros? Após as vendas de Cruzeiro, Botafogo e Vasco para investidores - empresários compraram ações dos clubes e se tornaram acionistas majoritários -, os questionamentos a cerca dessa modalidade de gestão são inúmeros. Afinal, mexe com algo que o mercado financeiro não pode pagar, que é a paixão do torcedor pelo seu clube de coração. Por isso, a reportagem do JC vai apresentar de forma clara do que se trata a SAF, seus objetivos, benefícios, possibilidades de negócios e até mesmo os riscos de aderir a esse modelo que chega com a promessa de mudar o cenário do futebol nacional. Além de elucidar o posicionamento de Náutico, Santa Cruz e Sport visando essa nova realidade.

Pois bem, a Sociedade Anônima de Futebol (SAF) é uma lei que foi sancionada em agosto de 2021, a Lei 14.193/2021, que, em resumo, permite que os clubes de futebol possam se transformar em empresas. Ou seja, adotar um tipo societário de sociedades anônimas (regida por leis específicas) e não mais as associações sem fins lucrativos.

Com os clubes brasileiros atravessando uma enorme crise financeira e com dívidas impagáveis (em sua maioria débitos com a Justiça do Trabalho e Impostos) que inviabilizam a administração da instituição, a SAF surge como ideia original de ser um mecanismo facilitador que possibilita a obtenção de receitas para as agremiações, já que a lei da Sociedade Anônima de Futebol permite que o clube divida o seu capital em ações, permitindo permitindo a negociação dessas ações para investidores interessados.

“O Cruzeiro, por exemplo, possui uma dívida de R$ 1 bilhão, mas isso é ‘fichinha’ no mercado financeiro. É possível trabalhar a marca do clube, atrair patrocinadores e jogadores, o que pode aumentar ainda mais o caixa dos clubes. O mercado de ações pode se tornar outra fonte de receita. São muitas as opções de lucro de um clube gerido no modelo SAF. Mas é importante ter ciência que virar um clube com a mentalidade de empresa não garante o sucesso comercial de um time, mas é um fator decisivo para que os clubes deixem para trás o histórico de dívidas", esclareceu Ricardo Souza, especialista em gestão empresarial e recuperação de empresas e CEO da BeYou Education.

No futebol pernambucano, os dirigentes de Náutico, Santa Cruz e Sport já iniciaram os estudos para entenderem melhor os mecanismos da SAF e, principalmente, tomarem ciência da real situação financeira dos clubes - passivos, ativos, especulação imobiliária dos bens , valor de marca da instituição, entre outras coisas. Todo o levantamento é importante para poder encontrar o investidor ideal e negociar da melhor maneira e de acordo com a realidade de cada um.

Primeiro a apresentar o interesse em se transformar em SAF, no Trio de Ferro, o Santa Cruz caminha a passos largos para virar uma sociedade anônima e se abrir para o mercado financeiro. "Lançamos o edital de convocação para a Assembleia Geral de Sócios, no próximo dia 27 de março, para deliberar ou não o modelo SAF. O Santa Cruz tem uma marca valiosa, com torcida enorme, presença regional muito forte, então, isso atrai investidores. Já estamos conversando com alguns e podemos ter bons avanços nos próximos meses", contou Lucas Valença, diretor jurídico do Santa Cruz.

O dirigente tricolor também ressaltou a importância da sociedade anônima para quitar o passivo do clube, que hoje ultrapassa os R$ 220 milhões. "De imediato a SAF permite ao clube utilizar mecanismos para a recuperação econômica, não convivendo com questões de penhoras, leilões, bloqueios judiciais, permitindo você estruturar e montar um plano de recuperação para equalizar a dívida, sem inviabilizar as atividades do clube", explicou Lucas Valença.

LEGISLAÇÃO

Isso é possível porque a Lei 14.193/2021 permite que a agremiação adote o modelo de SAF com regime centralizado de execução. O que isso quer dizer: o clube mantém a obrigação de pagar o passivo, já que a Sociedade Anônima do Futebol nasce sem dívida. Ou seja, a SAF segue trabalhando no mercado recebendo os investimentos e movimentando o fluxo de caixa, enquanto que a instituição mantém a responsabilidade de pagar a dívida. Mas, para isso ser possível, a sociedade anônima é obrigada a destinar 20% da receita e 50% dos dividendos para que as dívidas sejam equalizadas.

 

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PIONEIROS Mineiro Cruzeiro e cariocas Botafogo e Vasco foram os primeiros clubes no Brasil a aderirem à SAF - REPRODUÇÃO

O prazo para o clube pagar o seu passivo, segundo a lei da SAF, é de seis anos anos. Porém, ao final desse período, se comprovar que pagou 60% da dívida, esse prazo pode ser prorrogado por mais quatro anos, totalizando dez anos para equalizar as contas do clube.

No Timbu

A diretoria do Náutico também já deu o primeiro passo para uma mudança na forma de negócio. "O modelo se associação é arcaico. Por isso, o Náutico está se estruturando, primeiramente, do ponto de vista de empresa. E, pra isso, contratamos uma assessoria jurídica especializada em gestão de ativos e estruturação da SAF para levantar essas informações e de fazer esse estudo para levar ao mercado. Entendemos que precisamos acompanhar essa evolução financeira do mercado de futebol e, para isso, é preciso de uma estruturação jurídica para atrair e receber esses investimentos", colocou Luiz Felipe Figueiredo, vice-presidente do Náutico.

Segundo o dirigente alvirrubro, a gestão atual não imagina adotar uma SAF que envolva a venda dos ativos imobiliários: sede do clube, estádio dos Aflitos, Centro de Treinamento Wilson Campos e a garagem do remo. "O Náutico tem um patrimônio imobiliário espetacular. Não pensamos em vender, mas, de repente, arrendar e fazer parcerias com a iniciativa privada para receber recursos. Mas tudo isso é um processo embrionário. O que é importante é que com a SAF você tem condições de receber investimentos de forma organizada e precisamos nos adequar a um mercado que modificou completamente", relatou Luiz Felipe Figueiredo.

Na Ilha do Retiro

Apesar de ainda não ter contratado oficialmente uma empresa especializada para levantar as informações necessárias para transformar o clube em sociedade anônima, a direção do Sport vem trabalhando nos bastidores para viabilizar tal estudo. As conversas na Ilha do Retiro são constantes e a diretoria executiva e o Conselho Deliberativo estão alinhados visando o futuro do clube. "Para implementar uma SAF de sucesso é fundamental e inquestionável a governança, o compliance (agir com obediência e em conformidade com as leis) e a transparência. Entendemos que é uma mudança radical, implementar a SAF, principalmente se levarmos em consideração que é uma transição da administração de voluntariado, renunciando para que o investidor administre a maior paixão do torcedor que é o futebol. No Sport não vemos como viável aderir uma SAF que envolva todo o patrimônio. Tudo o que for de pedra e cal não será vendido, pois foi fruto de trabalho de geração e geração. Mas que a SAF assuma o departamento de futebol é mais viável. Tudo isso precisa ser estudado e levado para o conselho", adiantou Pedro Leonardo Lacerda, presidente do Conselho Deliberativo do Sport.

Mesmo ainda não avançando no aspecto de levantamento de informações a cerca dos números do clube, o presidente do conselho garante que já existe interessados na marca do Sport. "Quando iniciamos as conversas entre membros do executivo e do deliberativo, o presidente Yuri Romão me apresentou demonstrações de empresas do mercado internacional dispostas a conversar sobre investimentos no Sport. Não vou citar nomes, mas representantes de grandes empresas de fundo internacional. Entidades de altíssimo nível. Mas temos de ter cautela, criar esses instrumentos de governança, contratar uma empresa para dimensionar o valor da marca do Sport e do seu ativo patrimonial, para levar ao Conselho Deliberativo e decidir se vamos adiante com a SAF ou não", falou Pedro Leonardo Lacerda.

 

 

 

 

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