Ucrânia decreta estado de emergência e acelera preparativos para eventual ofensiva da Rússia
O Parlamento ucraniano aprovou nesta quarta-feira (23) a declaração do estado de emergência nacional
Atualizada às 18h14
O Parlamento da Ucrânia aprovou nesta quarta-feira (23) por ampla maioria a declaração do estado de emergência nacional, diante da ameaça de uma invasão russa.
A medida, proposta pelo presidente Volodimir Zelenski, foi votada horas depois de a Rússia iniciar a evacuação de seu pessoal diplomático em Kiev e de os Estados Unidos alertarem para o risco de uma ofensiva geral da Rússia contra a ex-república soviética.
A medida permitirá às autoridades regionais reforçarem as medidas de segurança, impondo por exemplo controles de identidade mais estritos. O estado de emergência tem início nesta quinta-feira (24) e vigência de 30 dias em todo o território, com exceção das regiões separatistas de Donetsk e Lugansk, no leste, reconhecidas na segunda-feira (21) como repúblicas independentes pelo presidente russo, Vladimir Putin.
Zelensky afirmou que "o futuro da segurança europeia" será decidido na Ucrânia, em um momento em que 150.000 soldados russos estão mobilizados em suas fronteiras, segundo informações dos Estados Unidos.
Putin insistiu, em um discurso no Dia dos Defensores da Pátria, que os interesses russos "não são negociáveis", mas mencionou a possibilidade de um "diálogo direto e honesto com o Ocidente".
Na terça-feira (22), Putin obteve a autorização parlamentar para enviar tropas à Ucrânia caso julgue necessário e voltou a exigir que o governo ucraniano desista de entrar na Otan e que a ex-república soviética, de 14 milhões de habitantes, se torne um país "desmilitarizado".
O presidente russo também reconheceu a soberania dos separatistas pró-russos sobre um território muito maior do que controlam atualmente, aumentando os receios de uma invasão em áreas agora controladas pelas forças ucranianas.
A Ucrânia respondeu nesta quarta-feira ordenando a mobilização de reservistas de 18 a 60 anos e pediu aos cidadãos ucranianos na Rússia - cerca de três milhões de pessoas, segundo algumas estimativas - para saírem desse país "imediatamente".
O Conselho de Segurança da Ucrânia pediu ao Parlamento para declarar estado de exceção "em um prazo de 48 horas", para "reforçar a proteção" da ordem pública e as infraestruturas estratégicas.
Sem movimento no terreno
Putin mantém suspense sobre suas intenções militares.
Após reconhecer, na segunda-feira, a independência das "repúblicas" separatistas de Donetsk e Lugansk, a câmara alta russa deu sinal verde à mobilização das forças russas na Ucrânia.
Essas decisões estabelecem as bases para uma intervenção em larga escala, mas até agora não há informações sobre movimentos significativos de tropas.
Na região russa de Rostov, a cerca de 50 quilômetros da fronteira, as forças russas estão concentradas em grande número, com caminhões militares, lança-foguetes e obuses, mas sem sinais de atividade particular, segundo repórteres da AFP.
Em Kiev, capital da Ucrânia, os habitantes não abandonaram sua rotina. Mas desde terça-feira, de hora em hora, os alto-falantes tocam o hino nacional ucraniano na enorme praça Maidan.
A população continua especulando sobre possíveis cenários, desde um novo status quo nos territórios separatistas até uma guerra total entre russos e ucranianos.
Muitos temem que a crise possa culminar no pior conflito na Europa desde 1945, quando terminou a Segunda Guerra Mundial.
A Rússia começou a evacuar sua equipe diplomática da Ucrânia e a bandeira russa não balança mais em sua embaixada em Kiev. Os Estados Unidos já haviam fechado a sua.
Primeiras sanções
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, afirmou que o mundo enfrenta "um momento de perigo" e denunciou as "violações da integridade territorial e da soberania" da Ucrânia.
A União Europeia convocou uma cúpula para quinta-feira, denunciando as "ações agressivas" da Rússia.
A ministra das Relações Exteriores britânica Liz Truss considerou que uma invasão na Ucrânia é "muito provável".
E o papa Francisco lamentou os "cenários cada vez mais preocupantes" sobre esse conflito.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou na terça-feira que as últimas decisões russas equivalem ao "início de uma invasão", mas acrescentou que "ainda há tempo para evitar o pior".
Washington e seus aliados ocidentais impuseram sanções em resposta ao reconhecimento dos separatistas contra quem Kiev luta há oito anos, um conflito que já deixou mais de 14.000 mortos.
A Alemanha congelou o gigantesco projeto de gasoduto Nord Stream II, que deve levar mais gás russo ao país, e Biden anunciou uma "primeira parcela" de sanções para impedir que Moscou consiga fundos ocidentais para pagar sua dívida.
A Rússia prometeu uma resposta "forte" e "dolorosa" às sanções americanas.
As medidas se mantêm modestas em comparação com as anunciadas em caso de invasão e Moscou conta com quase 640 bilhões de dólares em reservas cambiais e 183 bilhões em um fundo soberano para enfrentá-las.
"Um pouco de medo"
No front, a retomada dos combates entre o exército e os separatistas nos últimos dias continua nesta quarta-feira.
Um soldado ucraniano morreu em um bombardeio e outro ficou ferido, segundo o exército.
"Começaram a atirar com mais força", disse Dmitri Maksimenko, um minerador de Krasnogorivka, uma cidade próxima à linha de frente ucraniana.
Os separatistas de Lugansk anunciaram por sua vez a morte de um combatente e de um civil durante a noite.