Ucrânia rejeita ultimato da Rússia para entregar Mariupol
Quase 350 mil pessoas estão bloqueadas sem água ou energia elétrica na cidade portuária de Mariupol, bombardeada pelas tropas russas há quase um mês
A Ucrânia rejeitou, nesta segunda-feira (21), o ultimato russo para entregar a cidade portuária cercada de Mariupol, enquanto na capital Kiev um bombardeio matou pelo menos oito pessoas em um centro comercial.
Quase 350 mil pessoas estão bloqueadas sem água ou energia elétrica na cidade portuária de Mariupol, bombardeada pelas tropas russas há quase um mês, no que o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, chamou de "enorme crime de guerra".
Em outros pontos da Ucrânia, as bombas russas atingiram vários alvos durante a noite, incluindo uma fábrica de produtos químicos no norte do país, que provocou um "vazamento de amônia" e disparou um alarme.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, pediu que a Europa aumente consideravelmente a pressão sobre Moscou para interromper a invasão, que começou em 24 de fevereiro, e afirmou que o continente deve interromper qualquer tipo de comércio com a Rússia.
"Nenhum euro para os ocupantes, fechem todas as portas, não enviem seus produtos, rejeitem os recursos energéticos", pediu o presidente ucraniano. "Sem comércio com vocês, sem suas empresas e seus bancos, a Rússia não terá mais dinheiro para esta guerra", acrescentou em um vídeo.
As autoridades ucranianas também destacaram que prosseguem com a resistência contra os russos em Mariupol, que enfrenta uma situação humanitária crítica.
Os defensores da cidade portuária "desempenham um papel enorme na destruição dos planos do inimigo e na melhora de nossa defesa", afirmou o ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksiy Reznikov.
"Hoje, Mariupol está salvando Kiev, Dnipro e Odessa. Todo o mundo precisa entender", acrescentou.
O comando militar do Kremlin havia anunciado um ultimato às autoridades de Mariupol até as 5H00 de 21 de março para que respondessem a oito páginas de demandas, que segundo os ucranianos eram o equivalente a uma rendição.
A vice-primeira-ministra ucraniana, Iryna Vereshchuk, rejeitou o ultimato russo e afirmou que Moscou deveria, em troca, permitir que os moradores bloqueados deixassem a cidade.
"Não se pode falar de entregar armas. Já informamos a parte russa", declarou ao jornal Ukrainska Pravda.
Mariupol é um objetivo fundamental na guerra do presidente russo Vladimir Putin na Ucrânia porque constitui uma ponte terrestre entre as forças russas na península da Crimeia, ao sudoeste, e o território controlado pela Rússia, ao norte e leste.
As bombas russas atingiram novamente nesta segunda-feira diversos alvos, incluindo um centro comercial em Kiev, um ataque que matou pelo menos oito pessoas, segundo o Ministério Público.
Os corpos estavam diante do centro comercial Retroville, ao noroeste da capital. Bombeiros e soldados procuravam outras vítimas entre os escombros. O local foi atingido por uma bomba potente que destruiu os veículos estacionados e deixou uma cratera de vários metros de comprimento diante do prédio de 10 andares.
O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, anunciou um novo toque de recolher a partir desta segunda-feira à noite e que prosseguirá até a manhã de quarta-feira.
No norte do país, as autoridades ucranianas pediram aos moradores da cidade de Novoselytsya que procurem refúgio após um "vazamento" de amônia em uma fábrica de produtos químicos da região, em meio a intensos combates com as forças russas na região.
Longe da frente de batalha, os ministros das Relações Exteriores da União Europeia se reúnem em Bruxelas nesta segunda-feira para examinar novas sanções contra a Rússia. Alguns integrantes do bloco pressionam por um embargo sobre o petróleo e gás russos, mas a Alemanha rejeita a possibilidade, alertando que poderia provocar instabilidade social.
O Kremlin se uniu às advertências contra o embargo e afirmou que o mesmo "afetaria todo o mundo"
"Um embargo assim teria uma influência muito grave no mercado mundial de petróleo, uma influência negativa no mercado de energia da Europa. Mas os americanos não perderão nada, é evidente, eles se sentirão muito melhores do que os europeus", afirmou o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov.
Os preços da energia e a segurança do abastecimento também serão abordados em uma reunião da UE na quinta-feira em Bruxelas, com a presença do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
O presidente americano também participará em uma reunião da Otan e em um encontro do G7 em Bruxelas, antes de viajar à Polônia na sexta-feira para uma conversa com o presidente Andrzej Duda, durante a qual deve debater uma resposta conjunta à crise humanitária que levou dois milhões de ucranianos ao território ucraniano.
Zelensky voltou a sugerir no domingo conversas diretas entre ele e Vladimir Putin.
Em uma mensagem ao Parlamento israelense, ele agradeceu ao primeiro-ministro Naftali Bennett por seus esforços para mediar as negociações, que segundo Zelensky poderiam acontecer em Jerusalém.
Autoridades na Turquia, onde representantes russos e ucranianos já negociaram, afirmaram que os dois lados estão perto de chegar a um acordo para acabar com os combates.
Mas Zelensky parece impor algumas condições. "Não é possível simplesmente exigir que a Ucrânia reconheça alguns territórios como repúblicas independentes", declarou ao canal CNN.
As condições humanitárias são cada vez piores nas regiões de língua russa do sul e leste da Ucrânia, assim como no norte, perto de Kiev.
Quase 10 milhões de ucranianos fugiram de suas casas - um terço deles para o exterior -, segundo a ONU.
Mariupol sofre a crise humanitária mais grave do conflito e no domingo Zelensky acusou a Rússia de bombardear uma escola da cidade onde centenas de pessoas estavam refugiadas, o que ele chamou de "ato de terror".
Na quarta-feira passada, um teatro da cidade no qual mais de mil pessoas estavam refugiadas, segundo as autoridades locais, foi atingido por bombas e centenas de moradores continuam desaparecidos entre os escombros.
As autoridades de Mariupol afirmam que as forças de ocupação transferiram à força quase mil residentes para a Rússia e retiraram seus passaportes ucranianos, um possível crime de guerra.
Um grupo de crianças bloqueado em uma clínica de Mariupol durante semanas está entre os que foram levados ao território controlado pela Rússia, afirmaram à AFP uma cuidadora e um parente de um funcionário do centro médico.
Os 19 menores, com idades entre 4 e 17 anos e em sua maioria órfãos, passaram dias em porões gelados, escondidos dos bombardeios em condições terríveis.