O longo caminho legal para a antecipação das eleições no Peru
Segundo a legislação peruana, reduzir mandatos populares, como o presidencial e o legislativo, requer a aprovação de uma reforma constitucional e, inclusive, de um referendo
Da AFP
A proposta de Dina Boluarte, recém-empossada presidente do Peru, de antecipar as eleições gerais para abril de 2024 para aplacar os protestos que exigem a sua renúncia terá que percorrer um caminho legal que pode demorar até 16 meses e atiçar as manifestações, alertaram analistas à AFP.
Segundo a legislação peruana, reduzir mandatos populares, como o presidencial e o legislativo, requer a aprovação de uma reforma constitucional e, inclusive, de um referendo, uma tarefa que se anuncia difícil para o frágil governo de Boluarte, que assumiu o poder na quarta-feira passada, após a destituição e prisão do ex-presidente Pedro Castillo, e que não tem bancada parlamentar.
"Ela não pode convocar eleições imediatas, porque, de acordo com a Constituição, elas devem ser realizadas em 2026", disse à AFP o ex-presidente do Tribunal Constitucional Ernesto Álvarez. "A reforma constitucional é obrigatória porque a regra é respeitar os prazos do mandato de cinco anos assinalado pela Constituição para o presidente e o Congresso", informou à AFP o jurista Roberto Pereira.
- Protestos deixam 4 mortos no Peru, apesar do anúncio de eleições antecipadas
- PROTESTOS PERU: manifestantes tomam aeroporto em Arequipa, segunda maior cidade do Peru
- Presidente do Peru cede a protestos e envia proposta para adiantar eleições
- Veja a razão do presidente do Peru, Pedro Castillo, ter sido destituído e PRESO
Os obstáculos, no entanto, podem ser reduzidos com o tempo, e há precedentes recentes. "Por essa razão, Dina propôs eleições em abril de 2024, para poder fazer as reformas", acrescentou o constitucionalista Alvarez.
A Constituição estabelece dois caminhos: aprovar reformas com a metade mais um dos votos dos 130 congressistas além de um referendo, ou o voto de dois terços do número legal de congressistas em duas legislaturas ordinárias, sem a necessidade de uma consulta.
Tudo depende, nesta conjuntura, da vontade política do Congresso, dominado pela direita e relutante em reduzir seu mandato, que termina em julho de 2026, quando estava previsto o fim do mandato de Castillo.
"É muito difícil realizar as eleições seguindo os prazos como estão na lei, poder fazer uma eleição antes de oito meses", disse à AFP Eduardo Dargent, cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica.
Dina Boluarte tem um caminho alternativo, caso a pressão social aumente e os protestos não parem: renunciar ao cargo, deixando a presidência para o líder do Congresso, que deverá convocar eleições em um prazo mínimo de seis meses.
"Não me surpreenderia se a realidade a obrigasse a reduzir ainda mais o seu mandato ou a deixar a presidência, e que seja o Congresso o que abrevie os prazos", disse Dargent.
Quando o Congresso destituiu Alberto Fujimori no ano 2000, "a única solução foi aprovar uma reforma constitucional que estabeleceu uma disposição transitória válida apenas para esse caso", assinalou Alvarez.