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Democracia jurisdicional

"Hoje os tribunais superiores atuam como um terceiro grau jurisdicional e isso é uma excrecência, e provoca a lentidão das causas e favorece quem não tem razão". Leia a opinião do advogado Ivan Pinto da Rocha

Ivan Pinto da Rocha
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Ivan Pinto da Rocha
Publicado em 30/01/2021 às 2:00
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Prédio do STF em Brasília - FOTO: ABR
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Há bastante tempo, observa-se, com espanto, uma grande concentração das questões jurídicas perante as cortes superiores, sempre abarrotadas de recursos vindo de todos os cantos do país, as quais, ultimamente, desprezam a base da jurisprudência nacional, impondo interpretações distintas quase a cada instante, sobre o mesmo tema julgado, causando insegurança jurídica inimaginável.

Registre-se que 98% dos apelos às instâncias superiores não são providos e que decisões tomadas em petit comité, por simples maioria, graças a artifícios inseridos pelo CPC 2015, são dotadas de eficácia erga omnes, engessando as instâncias ordinárias e afetando, sobremaneira, o princípio do livre convencimento.

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, sempre defendeu o fim do processo na segunda instância, mesmo antes do caso polêmico do ex-presidente Lula, não com o intuito de prender ninguém mais rápido, mas para dar uma resposta efetiva a milhões de pessoas que têm conflitos de interesse sob tutela do Poder Judiciário.

Deve-se ir além do que entende o experiente magistrado, pois os tribunais superiores, exceto o Supremo, via Adin ou demanda congênere, não deveriam pautar as decisões das instâncias ordinárias, nem servir a interesses políticos de outros poderes, mas apenas e estritamente atuarem para uniformizar a jurisprudência no território nacional, dirimindo divergências entre julgados e evitando decisões incoerentes.

A violação literal de normas jurídicas já é hipótese de ação rescisória, na forma do digesto processual civil (art. 966, inciso V do NCPC), o que reforça a prescindibilidade recursal após satisfeito o duplo grau jurisdicional. A atribuição de eficácia erga omnes por decisões prolatadas por maioria simples e sem base em casos análogos já julgados pelas instâncias inferiores também é uma impropriedade muito perigosa.

Hoje os tribunais superiores atuam como um terceiro grau jurisdicional e isso é uma excrecência, e provoca a lentidão das causas e favorece quem não tem razão. Os juízes, mesmo vitalícios, passam, mas os tribunais, como instituições, ficam! E por esta seara se precisa de uma reforma legislativa para mudar o rumo dessa história e fazer valer o que se denomina de democracia jurisdicional.

Ivan Pinto da Rocha, advogado

 

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