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No fundo, semipresidencialismo é apenas outra roupagem para parlamentarismo

"Duas vezes o povo já externou sua vontade. A primeira, em 06/10/1963, com o Parlamentarismo tendo míseros 16,88% dos votos. E as elites voltaram a tentar na Constituição de 1988; ao determinar (art. 2º das DT) que o eleitor definisse forma (República ou Monarquia) e sistema (Parlamentarismo ou Presidencialismo) de governo. Em 21/04/1993, deu-se o segundo Plebiscito. Com o Parlamentarismo tendo, então, só 24,6% dos votos". Leia a opinião de José Paulo Cavalcanti Filho

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José Paulo Cavalcanti Filho

Publicado em 30/07/2021 às 6:16
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PORTUGAL, 1974. A Revolução dos Cravos, contra o Estado Novo de Salazar, era iminente. O sinal para o levante militar foi dado, na Rádio Renascença, com Grândola, Vila Morena, conhecida canção de protesto de Zeca Afonso. Tocada, sem parar, durante horas. E na manhã seguinte, já 25 de abril, Portugal era um país liberto. Com o povo festejando, nas ruas. A letra diz "Grândola, vila morena/ Terra da fraternidade/ O povo é quem mais ordena". Como deve ser, na Democracia.

BRASIL. Duas vezes o povo já externou sua vontade. A primeira, em 06/10/1963, com o Parlamentarismo tendo míseros 16,88% dos votos. E as elites voltaram a tentar na Constituição de 1988; ao determinar (art. 2º das DT) que o eleitor definisse forma (República ou Monarquia) e sistema (Parlamentarismo ou Presidencialismo) de governo. Em 21/04/1993, deu-se o segundo Plebiscito. Com o Parlamentarismo tendo, então, só 24,6% dos votos. Já está decidido, senhores. Sem que o Congresso possa mais alterar nada. É Cláusula Pétrea. A menos que o Supremo, hoje sem respeitar nenhum limite, diga o contrário. O truque é rebatizar a trama trocando o nome para "Semipresidencialismo". No fundo, apenas outra roupagem para o mesmo Parlamentarismo. Como se Maria, só por se registrar como José, passasse a ser homem.

Pior é que os argumentos, usados agora, são os mesmos. E de quinta categoria. Fico apenas nos 2 mais recorrentes. Um é que impede um déspota, no poder. Sem considerar que os governantes mais sanguinários do século XX não foram Presidentes, mas Primeiros Ministros: Hitler, Mussolini, Salazar, Kadafi. O outro é que o Primeiro Ministro seria mais facilmente substituível. Esquecendo que o Congresso, de onde viria esse Primeiro Ministro, é o mesmo que acaba de colocar 10 bilhões à disposição dos partidos, no próximo ano. Ninguém confia. Talvez algum dia, hoje não. Sem contar que quase metade dos deputados e senadores responde a processos por corrupção. Entre eles o presidente (mulher e 3 irmãos presos) e o relator (réu 8 vezes, no Supremo) dessa CPI da Covid. O jornalista Igor Maciel (deste JC) resumiu bem: "O golpe está aí. Primeiro você ajuda a eleger comprometidos com você. Depois, implanta um sistema no qual são eles que decidem quem terá o poder". Não está certo. Vale a pena lembrar a Revolução dos Cravos, senhores, "O povo é quem mais ordena". Isso.

José Paulo Cavalcanti Filho, advogado.

  *Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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