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Justiça aos compositores musicais

"Eu ainda alcancei o tempo, lá pelo começo dos anos 1940, em que as rádios anunciavam mais ou menos assim: "Acabaram de ouvir a composição ‘Nada Além’ na voz de Carlos Galhardo.". E se fazia a justiça a quem mais merecia: o autor da música ou aos autores, melodia e letra, quando era o caso". Leia o artigo de Arthur Carvalho

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ARTHUR CARVALHO

Publicado em 29/12/2021 às 7:21
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Eu ainda alcancei o tempo, lá pelo começo dos anos 1940, em que as rádios anunciavam mais ou menos assim: “Acabaram de ouvir a composição ‘Nada Além’ na voz de Carlos Galhardo.”. E se fazia a justiça a quem mais merecia: o autor da música ou aos autores, melodia e letra, quando era o caso.

Hoje, talvez, por economia de tempo, não se diz mais o nome do compositor. Outro dia, peguei um táxi. Estava tocando a música “Maria Bethânia”, e o motorista disse: “essa música de Nelson Gonçalves é muito bonita” - e tive de explicar para ele que a interpretação de Nelson é linda, mas a composição é de Capiba. E, apesar de absurdo, isso é comum hoje.

Há muito, queria abordar esse tema, mas fui protelando e terminei esquecendo. Agora, lendo a crônica “Marino Pinto, compositor”, publicada na Manchete, por Rubem Braga, em 31 de julho de 1954, veio a inspiração. Diz Rubem “O nome de Marino Pinto é muito menos conhecido que as letras que ele fez para melodias de outros, ou próprias”. Prossegue: “Todo mundo sabe, por exemplo, “o peixe é pro fundo das redes” e “segredo é pra quatro paredes” ou já ouviu Sílvio Caldas pedir a amada que “respeite ao menos meus cabelos brancos”, e muita gente não repara que essas músicas de Herivelto Martins são letras de Marino Pinto.”

Perfeito. Eu mesmo, que adoro música popular antiga, não me lembrava. É sabido que Noel Rosa, Ismael Silva, Wilson Batista, Geraldo Pereira e outros menos abastados vendiam suas parcerias a compositores de melhor situação financeira, como Francisco Alves, que apareceu nos discos de 78 rotações como autor de músicas que nunca compôs - mas isto é outra coisa. Estamos falando de compositores que não são mais mencionados em composições suas.

Eu não sabia que Marino Pinto tem mais de quatrocentas composições, algumas em dupla com Ataulfo Alves, Alberto Ribeiro, “Ai, ai Dolores”, com Murilo Caldas, o sensacional choro “Teleco-teco”, gravação de Gal Costa - que estourou na América Espanhola com Paulo Soledade -, o belíssimo “Um pequenino grão de areia”, de Dalva de Oliveira, e o eterno “Aos pés da Santa Cruz”, por Orlando Silva, parceria com Zé de Gilda.

Quem sabe ainda tem tempo para repararmos essa injustiça com os compositores da música popular brasileira. O ruim de tudo isso é que os jovens ficam sem saber os autores das mais importantes músicas da música popular brasileira. Um compositor injustiçado, dentre esses que fizeram sambas maravilhosos, por exemplo, é Roberto Martins, muito gravado pelos maiores cantores e cantoras.

Arthur Carvalho, Associação Brasileira de Imprensa - ABI

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