'Estamos cansados de sermos desrespeitados', diz policial vítima de racismo
Em um vídeo enviado à TV Jornal, o servidor público disse que está cansado de ser desrespeitado durante o processo de trabalho
"Negro safado. Negro safado. Negro safado". O enfermeiro e policial militar Alderlan da Silva Costa ouviu três vezes a ofensa até prender uma mulher, de 49 anos, por crime de injúria racial e desacato ao servidor público nesse domingo (26), durante a campanha de vacinação contra a covid-19 no Shopping Recife. Em um vídeo enviado à TV Jornal, o servidor público disse que está cansado de ser desrespeitado durante o processo de trabalho.
Em entrevista, ele relata que o trabalho aumentou na pandemia e o desrespeito também. "Trabalhávamos muito antes, depois da pandemia o trabalho triplicou, quadriplicou. Estamos tentando dar conta do recado, e estamos dando conta do recado. Nós somos profissionais que hoje trabalham de forma desesperada para conseguir ou prevenir que as pessoas adoeçam com a vacinação da covid-19. Estamos cansados de sermos desrespeitados, de receber injúrias, palavras de baixo calão durante o nosso processo de trabalho", disse Alderlan.
"Simplesmente as pessoas não sabem que regras existem para serem cumpridas. E, nós, profissionais da saúde que envolvem a enfermagem, fisioterapia, medicina, trabalhamos com normas técnicas e com regras. Não podemos fugir às normas, porque a gente responde eticamente por isso, porque existe um conselho que respalda", apontou o enfermeiro, sobre a conduta que os profissionais levam na aplicação das vacinas.
Como aconteceu o caso de racismo?
A senhora queria vacinar a filha adolescente, de 14 anos, com a quarta dose, mas ainda não há autorização do Ministério da Saúde ou das secretarias estaduais para a segunda dose de reforço nesse público.
"A usuária entrou por volta de 17h40 ou 18h, chegou exigindo que sua filha tivesse a quarta dose da covid-19, uma adolescente de 14 anos. Que gente já tinha as três doses, com esquema completo autorizado pelo Ministério da Saúde. E ela exigia que fizéssemos a quarta dose na adolescente, a todo momento foi explicado que não tínhamos autorização ministerial ou de secretaria nenhuma para a quarta dose. E a todo momento, a usuária não aceitava", contou o enfermeiro.
Alderlan conta que ela começou a gritar com os servidores, que já tinham explicado a ela que a aplicação das doses não poderia ser feita. "Quando a confusão começou, que o shopping começou a aglomerar, eu estava na parte de supervisão de vacinas realizando troca de lotes de vacina e me dirigi à ação para verificar. Essa senhora já estava completamente alterada. O esposo também tomou as dores dela, ameaçando bater nos servidores que estavam na frente", explicou.
"Foi quando cheguei, pedi para ela baixar o tom de voz para entender. O servidor na frente já tinha explicado e ela não quis entender. E para finalizar ela me chamou de "negro safado". Me deu um delay e perguntei ao servidor ao lado: 'tem certeza que estou ouvindo isso?' E ela repetiu mais duas vezes: 'negro safado', 'negro safado'", relatou.
Quem pode dar voz de prisão em casos de injúria racial?
Alderlan Costa ainda alertou que a própria população pode dar voz de prisão em casos de presença de crime, como desacato e injúria racial. "Eu dei voz de prisão, não só por ser policial militar ou ser servidor público em exercício, mas por ser cidadão. E que todo cidadão, constitucionalmente, tem o poder de emanar voz de prisão com quem esteja cometendo um crime ou que acione um órgão público para que assim o faça caso não queira efetuar essa prisão".
"Me identifiquei como profissional de segurança naquele momento, citei os artigos pelos quais ela estava sendo presa, que é o Artigo 140, que fala da injúria racial no Código Pena. E o Artigo 331 do Código Penal, que fala de desacato ao poder público", conta, afirmando que a levou até uma sala para a sua integridade física, porque na hora gerou uma comoção no local. Palavras como "racista" eram proferidas pelas pessoas que circulavam nos corredores do shopping.
Em nota, a Polícia Civil informou que prendeu em flagrante delito, por meio da Delegacia de Boa Viagem, a mulher.
"A autora foi autuada por Injúria Qualificada Racial e Desacato após desferir palavras de cunho discriminatório contra a vítima e desacatar o policiamento local em um estabelecimento comercial no bairro de Boa Viagem, durante campanha no local para aplicação de vacina".